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Lucas Morais

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Crítica radical

Das promessas à realidade nas eleições brasileiras: o que está em jogo?

Lucas Morais - Publicado: Quinta, 30 Setembro 2010 17:14

Lucas Morais

Finalmente chegamos à reta final das eleições parlamentares no Brasil. Muito se discute se haverá ou não segundo turno. Mas uma pergunta fundamental precisa de respostas: o que está realmente em jogo nestas eleições? De um ponto de vista dos trabalhadores, o que irá mudar nestas eleições? De um ponto de vista socialista, o Brasil está avançando?


Da ditadura militar à democracia liberal

O Brasil passou por um longo período de ditadura militar (1964-1985) orquestrado desde Washington, processo que ocorreu também no Chile, Argentina, Uruguai e outros países da América Latina. O cenário econômico que se desenvolveu no país, principalmente a partir da década de 1970, fez com que a classe trabalhadora industrial-urbana iniciasse mobilizações em massa para defender seus interesses, culminando nas Greves do ABC paulista, de onde surge a ilustre liderança de Luís Inácio Lula da Silva, à frente do Sindicato dos Metalúrgicos. Este sindicalista possuía uma grande habilidade de negociação entre capital e trabalho, característica que o levou a ser o principal porta-voz deste movimento das massas operárias que, sufocadas pela ditadura militar, iam às ruas para o "tudo ou nada", defender nas greves seus interesses que eram cotidianamente atacados pela inflação e pela super exploração patronal nas indústrias. Estas mobilizações não se restringiram somente ao estado de São Paulo, tendo repercussão em outras regiões do país, como o caso das ocupações de fábrica em Contagem em Minas Gerais. Este movimento, somado à resistência da esquerda e setores progressistas da sociedade brasileira, levou no desenrolar das lutas pelas eleições diretas da década de 1980 à fundação do Partido dos Trabalhadores, que propunha a construção de um socialismo democrático em contraponto aos regimes estalinistas do Leste Europeu e à falida socialdemocracia europeia. Paralelamente, por imposição das bases operárias, a Central Única dos Trabalhadores – CUT – também foi fundada e tornou-se a primeira central sindical independente do Governo Federal.

Nas eleições de 1989, dentre os vários candidatos à Presidência da República, Lula e Collor são eleitos pela sociedade brasileira para a disputa ao segundo turno. Em um debate fundamental, televisionado em rede nacional, que decidiria as eleições, a imprensa burguesa manobra contra Lula e consegue eleger Fernando Collor de Mello, um representante da extrema direita brasileira. Estas eleições iriam marcar um gravíssimo ponto de inflexão para a esquerda brasileira, pois esta derrota veio no mesmo momento em que a União Soviética iniciava sua queda. Era o "fim da história" de Fukuyama e seus entusiastas. A década de 1990 foi marcada pelo avanço do neoliberalismo no Brasil, iniciado por Collor e seguida por Itamar Franco e Fernando Henrique Cardoso (PSDB).

O Partido da Social-Democracia Brasileira de FHC, por sua vez, representava então uma tentativa de setores liberais de conformar um partido socialdemocrata de corte liberal. Entretanto, quando ascendeu ao Governo, o caráter neoliberal deste partido o marcou com as privatizações das empresas estatais de telecomunicações, mineração, aviação (Embraer), dentre outros. Vale lembrar, tais empresas estatais foram entregues a um valor que beirava a gratuidade, um processo verdadeiramente criminoso, de onde surge uma figura profundamente envolvida neste ataque ao patrimônio público nacional, José Serra, também do PSDB.

De outro lado, o PT parte para uma luta de oposição democrática e se submete a todas as eleições da década de 1990 com Lula à presidência, sendo sempre derrotado no segundo turno. O processo de burocratização do PT se aprofunda ainda mais neste momento, e mais concessões programáticas são feitas para que o partido fosse aceito no establishment da recente democracia liberal brasileira, profundamente marcada por corrupção. A cada eleição o programa trabalhista e de esquerda do PT ia cedendo lugar a um programa liberal nacional-desenvolvimentista, focando na distribuição de renda, combate à fome, reestruturação da infraestrutura, incentivo ao mercado interno, dentre outros.

Eis que, em 2002, com o país afundado em insolvência, inflação e dependente do FMI, Lula ganha de José Serra no segundo turno e marca um dos mais importantes momentos da história brasileira, terminando um longo momento em que o PT teve de abandonar suas bandeiras socialistas e trabalhistas que estão presentes até hoje em sua Carta de Princípios.

Governo Lula: 2002-2010

Diante do temor dos capitalistas diante do espectro de um Governo do Partido dos Trabalhadores no Brasil, Lula lança a chamada "Carta aos brasileiros", que melhor seria se chamada de "Carta aos capitalistas financeiros", onde o PT reafirma seu compromisso com as dívidas externas e tranquilizou os setores mais relevantes do capitalismo financeiro internacional. Assim, o Governo Lula inicia um governo instável, com duros ataques de todo o espectro da direita, esta que tinha (e ainda tem) como sua principal arma política os monopólios oligarcas da mídia privada, que foram fartamente utilizadas para atacar o Governo Lula em casos de corrupção como o Mensalão. Vale lembrar, o tal Mensalão perpassou todos os governos anteriores, sem que nunca a mídia privada tenha mencionado a existência, dando a entender que fora uma prática inaugurada pelo PT. Mas de crise em crise o Governo do PT foi sobrevivendo e, neste momento, inicia uma aproximação com setores do PMDB (centro-direita) e outros partidos menores para lograr maioria no Congresso e no Senado e poder ter governabilidade na aprovação dos projetos de leis governistas. O resultado disto não poderia ser outro, senão concessões e mais concessões à direita brasileira e o rebaixamento das bandeiras petistas, a começar pela reforma agrária que Lula havia se comprometido.

Entretanto, o fator mais vital para a sobrevivência do Governo Lula fora o cenário externo da economia capitalista mundial, que propiciou ao governo uma estabilidade econômica e a perspectiva de crescimento do Produto Interno Bruto. Neste governo, empresas como a Petrobras e a Vale do Rio Doce tiveram expansão e várias transnacionais vieram para o Brasil e consolidaram suas atividades. A economia finalmente dava a um governo brasileiro a possibilidade de ajuste fiscal, projeção de pagamento de dívidas, controle da inflação, dentre tantos outros fatores que colaboraram para uma estabilidade com crescimento. Esta estabilidade permitiu ao PT a implementação de programas sociais assistencialistas como o Bolsa Família e paralelamente investir uma maior parte do orçamento nacional em obras de infraestrutura, beneficiando o grande capital de empreiteiras de fundos de investimento e principalmente as transnacionais.

Como disse recentemente o professor Márcio Cruz sobre o programa Bolsa Família, "vinte milhões de pessoas que viviam na linha da pobreza (mais que a população do Chile) passaram a ser público alvo de programas sociais de distribuição de renda por parte do governo; ao mesmo tempo, houve a subida na pirâmide social de mais de 30 milhões de pessoas (quase a população da Argentina) por meio da elevação dos salários, crédito e oportunidades de emprego."

Pacto social de classes

O pacto social entre as classes trabalhadoras e capitalistas no Brasil está assentado sobre um acordo da burocracia petista com o capital financeiro, com os industriais brasileiros e as transnacionais. Lula com sua Carta aos brasileiros não fez mais que evidenciar um pacto de classe operado pela burocracia do Partido dos Trabalhadores diretamente com representantes do mercado financeiro, tendo como porta-vozes Henrique Meirelles, Palocci, José Dirceu, dentre outros. A burocracia do PT impôs à base do partido esta aliança para que fosse mantido a governabilidade do Estado democrático liberal burguês, do contrário, não haveria como aprovar os projetos de lei em parlamento. Neste rol, um processo de dissidência interna marcou o PT, culminando na fundação do Partido Socialismo e Liberdade – PSOL – e outras organizações que migraram para outros partidos. Mas duas tendências fortemente ligadas à burocracia lulista conseguiram manter a coesão interna do PT dentro de um eixo nacional-desenvolvimentista e de crescimento do mercado interno, justificando criar possíveis condições melhores para uma transformação social mais profunda adiante. Mera justificação política. A burocracia do PT sabe que não pode alterar radicalmente o destino do Orçamento da União (ver imagem abaixo), pois caso planeje fazer isto, terá de cortar o que Plínio de Arruda Sampaio chama "Bolsa Banqueiro".

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Diante disto, a esquerda socialista brasileira, que já vinha de uma conjuntura adversa com a queda do estalinismo do Leste Europeu, confirmou sua decepção de um ponto de vista revolucionário com o projeto que a burocracia petista reservava à esquerda brasileira.

Lula, entretanto, nunca se declarou um socialista revolucionário. Nada tem a dever à esquerda socialista do Brasil. Mas esta mesma esquerda continua hoje colhendo as consequências de um apoio cego ao projeto de Lula.

Olhando mais de perto o Orçamento Geral da União em 2009, observamos que exatos 35,57% da riqueza nacional é direcionada ao capital financeiro de bancos, fundos de investimento, etc., através de pagamentos de títulos de dívida externa. E, de outra parte, 25,91% é direcionado ao pagamento da Previdência social. Isto significa dizer que 61% do Orçamento nacional é direcionado fundamentalmente ao capitalismo financeiro, que estão também presente nos planos de previdência privados.

Brasil 40%

Tendo estes dados em mente, não é muito difícil entender porque persistem as desigualdades sociais, a pobreza, a ausência de educação e saúde públicas de qualidade para todos, ao mesmo tempo em que se incrementam a violência social, o narcotráfico e a corrupção.

Diante deste grave quadro social, no segundo pior país em distribuição de renda e o país com maior concentração de terras no mundo, em pleno século XXI, poucos são os candidatos das eleições que ultrapassam o "promessismo" e a venda de ilusões e chavões eleitorais.

Dilma Rousseff, que está comprometida em dar continuidade ao pacto social de classes promovido pela política da burocracia petista, tem compromissos profundamente acordados com o capitalismo financeiro. Não é à toa que Dilma Rousseff é elogiada por todas as grandes revistas dos capitalistas, como a Financial Times, The Economist, dentre vários outros. O pacto e continuidade representado pelos governos do PT asseguram uma rara estabilidade para os capitalistas financeiros que investem em território brasileiro. Diversos monopólios de bancos e indústrias tiveram condições de aumentar seus lucros em 400% em 8 anos, e há índices que apontam para mais. Este é o "segredo" da política de coalizão de classes promovido pelo PT, e Dilma é a continuidade deste projeto, que assegura um desenvolvimento que o secretário-geral do PCB, Ivan Pinheiro, chama corretamente de capitalismo à brasileira. Dilma não representará nenhuma mudança radical, nem para o capital e nem para o trabalho, por isto as burocracias sindicais se satisfazem, pois terão mais 4 anos para promover lutas salariais e lutar por direitos econômicos sem que sua base imponha uma radicalização de suas lutas. De outro lado, os capitalistas financeiros tem garantido e assegurado pelo Estado brasileiro a intensificação da exploração das riquezas naturais. Se tudo correr como parece, o futuro Governo Dilma não terá grandes problemas na continuidade, exceto por um fator determinante.

Crise capitalista global

A ordem social capitalista vive hoje uma profunda crise, não somente econômica, mas em cada aspecto da vida social. Nos Estados Unidos mais de 40 milhões de seres humanos estão abaixo da linha de pobreza. A crise econômica que iria necessariamente atingir os trabalhadores estadunidenses golpeou profundamente desde trabalhadores até extratos da classe média. A farra do capitalismo financeiro levou milhões de famílias à insolvência, levando-os a perder propriedades e dinheiro para o enriquecimento dos monopólios financeiros e imobiliários. O filme de Michael Moore, Capitalismo: uma história de amor, retrata limitadamente muito bem as atuais condições deste país. A classe trabalhadora estadunidense já sofria uma desvalorização de sua força de trabalho desde o início da década de 1970, ao mesmo tempo em que ocorria a transferência de transnacionais norte-americanas para países que ofereciam força de trabalho mais desvalorizada como a China, Indochina, etc. Somado a isto veio o excedente de capital dos monopólios que teve, nos governos neoliberais de Reagan adiante, facilidades para emprestar crédito aos trabalhadores sem barreiras jurídicas. O resultado da insolvência de milhões de famílias estadunidenses explodiu no final de 2008 e esta crise do capitalismo global está longe de ter passado.

De outro lado, a Europa vive um processo de crescente insolvência de seus Estados. A Grécia foi o primeiro a cair porque não conseguia pagar mais a "mesada" do capital financeiro. As dívidas da Grécia não são menores que as dívidas de Portugal. Entretanto Portugal hoje é fiável, portanto solvente. Entretanto esta condição irá alterar rapidamente nos próximos momentos que a história nos reservará. Os PIIGS, composto por Portugal, Irlanda, Itália, Grécia e Espanha, são países que estão se tornando insolventes, são efetivamente bombas relógios. E a insolvência não significa uma moratória, como o povo argentino impôs em 2001-2002 ao FMI. Significa que o Estado será utilizado em favor do capital para atacar o trabalho, ou seja, a classe trabalhadora em seu conjunto, com cortes de benefícios, redução salarial, redução de empregos, aumento de tributações e impostos, aumento da idade mínima para aposentadoria, enfim, virão ataques a todas e cada uma das conquistas históricas das lutas da classe trabalhadora.

A classe trabalhadora vive hoje um momento de defensiva contra os ataques dos capitalistas e seus Estados. A força da direita europeia é uma expressão muito cruel deste cenário, e ali os imigrantes são utilizados como bode expiatório. Faltam empregos para espanhóis, franceses, italianos, alemães, ingleses, etc, e na medida em que extratos médios – a pequena burguesia – vai empobrecendo, mais competição entre estes e os imigrantes que historicamente trabalham em postos de trabalho desvalorizados. E a direita utiliza exatamente desta condição para hostilizar a imigração, deslocando a responsabilidade dos capitalistas em seu conjunto para uma fração do proletariado nacional, a fração mais débil. Isto está ocorrendo em toda a Europa, de Leste a Oeste, na Hungria, Suécia, Inglaterra, e principalmente na Itália e França, onde sistematicamente ocorrem episódios mais intensos de xenofobia.

O Brasil e a crise do capital

Neste cenário econômico, em que a direita se fortalece na Europa e nos EUA, a América Latina é um barco em contramaré. Enquanto há um processo de conservadorização nas potências mundiais, a América Latina vive um processo emancipatório que envolve principalmente a Bolívia, Venezuela e Equador. Na Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai, presidentes de centro ou centro-esquerda foram eleitos em processos eleitorais em democracias liberais. Há em todos estes países uma política de aumento do investimento em saúde, educação e programas sociais que estão beneficiando milhões de famílias pobres deste continente, historicamente excluídos e reprimidos.

Neste cenário, o Brasil é de total importância. Um Governo do Partido dos Trabalhadores neste país significa uma política externa favorável às lutas sociais e um contrapeso aos ditames do imperialismo dos EUA, como ocorreu no golpe orquestrado em Washington contra o presidente deposto por armas em Honduras, Manuel Zelaya. O Brasil manteve-se firme em defesa do respeito à constituição hondurenha e do retorno de Zelaya à presidência. Bem como a diplomacia brasileira sob o governo do PT soube trabalhar alianças importantes que permitiram a ampliação das relações econômicas com países latino-americanos, africanos e orientais, com destaque para a China, que é hoje a maior importadora das mercadorias e riquezas brasileiras. Sem dúvida a pior decisão diplomática do Brasil foi encabeçar as tropas de repressão da ONU no Haiti. Isto é injustificável e as polícias do Brasil estão fazendo escola de repressão ao que denominam de "distúrbios sociais", que na realidade são rebeliões e protestos.

O Brasil é o único país existente em que uma concentração enorme de riquezas naturais não foram sistematicamente exploradas até a extinção, como ocorre com a terra, o petróleo e a água em outros países. Levando isto em conta, o Brasil é o "país da vez", será daqui em diante o país que o imperialismo das potências trabalhará arduamente para garantir a exploração de suas transnacionais, como já ocorre.

Se mesmo neste cenário economicamente favorável o Brasil sofrer com a crise do capitalismo global, um Governo Dilma seria gravemente abalado. Bastaria um descontrole na inflação para que a classe trabalhadora se lançasse às greves. Este cenário certamente favoreceria às alternativas políticas que as oposições construirão (ou não) de agora em diante.

Alternativas, "promessismo" e venda de ilusões em varejo

Exceto Dilma Rousseff, todos os demais candidatos se apresentam hoje como alternativa. De um lado, há a candidatura do Partido da Social Democracia Brasileira, articulado por Fernando Henrique Cardoso, e composto por representantes políticos dos interesses do setor mais entreguista (pró-imperialista) e neoliberal da burguesia brasileira, principalmente sua fração paulista. José Serra, candidato do PSDB, encarnando um espírito demagogo e um péssimo populismo, diz que caso seja eleito oferecerá aumento de 10% na previdência e aumentará o salário mínimo para R$600,00, além da ampliação do Bolsa Família. Entretanto, quando questionado sobre os modos de se efetivar concretamente estas propostas, o tucano esquiva-se como um sabonete. Do ponto de vista neoliberal, entreguista e conservador de José Serra, isto que ele propõe só faria sentido com cortes sociais, como ele defendeu abertamente quando da crise capitalista de 2008, enquanto Lula defendia o favorecimento de crédito às empresas em dificuldade de girar capital e isenção de impostos para o fortalecimento do consumo interno. Esta política econômica de Lula deu certo, e tudo aquilo que Serra defendeu fora feito na Europa, que hoje vivencia as condições acima mencionadas. O que Serra não pode dizer é "como efetivar", ou em outras palavras, "como realizar" as promessas que faz. E assim vai tentando vender seu peixe podre, utilizando fartamente da mídia privada para atacar a candidatura do PT sem discutir seu misterioso programa político, sua plataforma de governo.

De outra parte, há a candidatura do Partido Verde, partido composto por empresários, profissionais liberais, ONGs e uma fraca militância ecologista, apesar de aparentar o contrário. Os principais articuladores políticos desta agremiação são Fernando Gabeira e Sarney Filho. O candidato a vice-presidente do PV fraudou a arrecadação Receita Federal em mais de R$1,2 bilhão e é o proprietário da transnacional Natura. Em cada estado em que tem parlamentares, o PV vota com os conservadores do PSDB e do DEM. É com esta companhia que Marina Silva, ex-ministra do Meio Ambiente e ex-parlamentar do PT está comprometida. Além disso, a candidata é adepta da igreja Assembleia de Deus, e é contrária a políticas liberais como o aborto, pesquisas com células-tronco embrionárias e não defende o movimento LGBT. Marina Silva é casada com Fábio Vaz de Lima, que faz companhia a Jorge Murad no escândalo da Usimar, indiciados pelo Ministério Público, segundo informações do jornalista Palmério Dória, autor do livro Honoráveis Bandidos, que esmiúça a consolidação do clã Sarney na política e economia brasileira. Quando ministra, em setembro de 2007, Marina Silva promoveu o desmatamento do meio ambiente através da Lei de Gestão de Florestas Públicas, que passa o controle da riqueza do solo, a diversidade das plantas medicinais e os animais, para os capitalistas. A Floresta Nacional do Jamari, em Rondônia, foi oferecida aos empresários. Nem Collor teve coragem para tanto. E ainda assim, muitos ecologistas e partidários de uma suposta "terceira via" ("Nem Dilma, Nem Serra"), acreditam nas doces e falsas palavras de Marina Silva sobre o meio ambiente em seus debates eleitorais. Em contraste com o Orçamento Geral da União, Marina não alteraria os compromissos com a dívida externa e nem se comprometeria com investimentos substanciais na educação e saúde.

A proposta de Marina Silva é agregar setores de vários partidos em uma coalizão pró-capitalista. Certamente um Governo do PV não promoveria a expropriação do agronegócio e manteria a ridícula política de assentamento de terras promovida pelo Governo Lula que, por sinal, é menor que o número de assentamentos do Governo FHC.

Serra e Marina Silva representam um mesmo projeto, que é a manutenção do neoliberalismo nos moldes conservadores e antitrabalho, com alianças entre demotucanos e verdes, como já o fazem nacionalmente nos últimos anos. Ambos teriam uma política externa agressiva contra os países em processos sociais emancipatórios, como na Bolívia, Cuba e Venezuela principalmente. São duas candidaturas de um mesmo partido, o do capital e do imperialismo.

E neste rol, o Partido Socialismo e Liberdade – PSOL, logra por eleições partidárias internas lançar a candidatura de Plínio de Arruda Sampaio à Presidência da República. Esta candidatura marcou profundamente este processo eleitoral. O PSOL oferece um programa fundamentado na reforma agrária com expropriação de terras produtivas e improdutivas acima de 260 alqueires para fins da reforma agrária, reforma urbana e 10% ou mais para a educação e saúde. Como? Deixando de pagar o capital financeiro, as dívidas, declarando moratória contra as injustas dívidas externas. A candidatura de Plínio e as candidaturas da esquerda socialista formada pelo Partido Socialista dos Trabalhadores Unificados – PSTU –, Partido Comunista Brasileiro – PCB –, e Partido da Causa Operária – PCO –, são as únicas candidaturas comprometidas com as lutas dos trabalhadores e da juventude brasileira e que levantam suas bandeiras explicitando os modos a alcançar: o orçamento nacional deve ser destinado fundamentalmente para o conjunto da sociedade. Estatização das transnacionais, educação, saúde, instituição da reforma agrária e urbana e fortalecimento dos programas sociais.

Obviamente que a mídia privada enquadra tais partidos como "nanicos inviáveis" ou "radicalistas inconsequentes", mas na verdade são os únicos candidatos, assim como Dilma Rousseff, lúcidos e responsáveis quanto à finalidade de seus projetos.

Para o próximo período que se abre após as eleições presidenciais, a esquerda socialista, formada pelo PSOL-PSTU-PCO-PCB e movimentos e organizações sociais, terão um excelente momento para uma reconstrução e o estabelecimento de uma unidade programática. A reforma agrária, a moratória, a reforma urbana, a estatização do patrimônio público que foi privatizado nos governos anteriores, a universalização da educação e da saúde garantido pelo Estado, são bandeiras mínimas que podem aglutinar as forças da esquerda socialista para os próximos momentos. Uma crise econômica rapidamente pode transformar a tranquilidade política do pacto social de classes do PT e do capital em uma crise política, abalando profundamente este consenso até então vigente. A esquerda socialista deve ser porta-voz do futuro e estar à altura dos problemas que virão para os trabalhadores mais adiante.

O Brasil, a mídia privada e a democracia liberal burguesa

Um fato que se tornou público e notório por parte de qualquer segmento da sociedade brasileira é a parcialidade favorável da mídia privada às candidaturas da direita brasileira, seja aquela atrelada a Serra ou aquela atrelada à Marina Silva. A mídia privada, como a Veja, Globo, Folha de São Paulo, Estado de S. Paulo, que é controlada por 7 famílias, está aliada e aderiu à campanha de Serra. Isto já ocorreu outras vezes na história brasileira, entretanto quem perdeu mesmo nestas eleições foi a mídia privada que, no Brasil, em função da decadência ideológica e política dos partidos políticos da direita, assume o papel de partido e de coesão e hegemonia da ideologia burguesa e espetacular.

Serra já entrou nestas eleições sabendo perderia. Nunca passou dos 30%, e desde 2002, com seu desgoverno no Estado de São Paulo, acumulou uma série de escândalos, que vão desde a repressão violenta a professores e policiais civis, até alagamentos catastróficos na cidade de São Paulo, cratera no metrô paulista e, ainda por cima, tendo seu pretendente a candidato a vice-presidente, o ex-Governador do Distrito Federal, Roberto Arruda (DEM), preso por corrupção. Foi o primeiro Governador brasileiro a ser preso na história brasileira. Todo este conjunto de catástrofes políticas, somado à inconsequência política e a irresponsabilidade que marca este ser, Serra conseguiu um índice de rejeição de mais de 40% dos brasileiros. Mesmo com a política de isolamento mútuo estabelecido entre Serra e Fernando Henrique Cardoso – insólita figura que aspira entrar para a história como membro e, se possível, presidente da Academia Brasileira de Letras e para ser enterrado como um nobre intelectual – a campanha do PSDB não deslanchou e, se for para o segundo turno, será em função da estratégia da direita brasileira com a candidatura de Marina Silva, que é tirar votos de Dilma para forçar um segundo turno. Para este possível segundo turno, a mídia privada, hoje um braço político a serviço dos caciques do PSDB, prepara uma série de golpes para Dilma Rousseff, numa tentativa de atacar com escândalos de corrupção ou semelhantes a candidatura do PT e elevar o índice de rejeição da candidata. O espectro do segundo turno incomoda a esquerda alinhada ao PT, que espera uma vitória já assegurada no primeiro turno. Entretanto, os institutos de pesquisa não chegam a grande parte da população e, no Brasil, quanto mais se adentra no interior e no campo, mais se vê adesão à candidatura do PT. Há toda uma série de benefícios que atenderam municípios inteiros, como o Programa Luz Para Todos, que levou energia elétrica à quase totalidade dos municípios que não dispunham de rede elétrica. Programas sociais aliado à investimento em infraestrutura atrai muito mais voto do que dossiês, como quer Serra e a mídia privada.

Um capitalista brasileiro chamado Eike Batista, hoje o 8º mais rico do mundo segundo o índice da revista Forbes, está apoiando e financiando ambas as candidaturas, tanto de Dilma quanto de Serra. Para os capitalistas mais lúcidos, Dilma não representa nenhum perigo às propriedades privadas e muito menos à democracia liberal, enquanto Serra serviria como instrumento de repressão mais agressiva dos trabalhadores e para uma escalada antissocialista na América Latina. A imprensa internacional apoia Dilma porque tem pela frente a perspectiva de continuidade e manutenção do status quo, que beneficia tanto à exploração da classe trabalhadora do Brasil pelas transnacionais, quanto ao futuro Governo Dilma, que poderá manter e até ampliar seus programas sociais.

Uma democracia socialista

A democracia liberal tem uma inspiração individualista e personalista. Vota-se no candidato, e não em um projeto de sociedade ou em um programa político. Depois de eleito, o eleitor estará alienado do poder político e não tem mais controle de seu representante. O Estado nacional não é nada mais, como muito bem disse Friedrich Engels, o comitê central da classe capitalista. Independentemente das candidaturas, de Dilma, Serra, Marina, Plínio, etc, a estrutura que mantém a ordem social capitalista será mantida intacta. Somente um movimento das massas populares e principalmente do movimento dos trabalhadores é que um futuro para além dos 40% da riqueza nacional será possível. O que está em jogo nestas eleições é justamente que fração política estará à frente desta máquina e exército pró-capital. Da mesma forma que Plínio ou Zé Maria (PSTU) não teriam governabilidade no interior destas estruturas liberais e burguesas, os trabalhadores jamais alcançarão sua emancipação social lutando somente para eleger seus representantes.

Historicamente o movimento dos trabalhadores instituiu uma série de mecanismos políticos que permitem a autogestão tanto do processo produtivo de fábricas, fazendas, bairros, empresas, entre outros, como foi visto na Comuna de Paris em 1871, nos conselhos de fábrica e de camponeses na Rússia em 1917 e na Guerra Civil Espanhola em 1936-39, bem como nas revoluções sociais húngaras e tchecas. Todas estas experiências revelaram a potencialidade do controle dos trabalhadores dos meios de produção, com eleições em assembleias, revogação de mandatos em casos de descumprimentos programáticos (mandatos sobre controle da base), rotação de cargos, entre várias outras possibilidades organizativas.

Um "segredo" fundamental que Marx revelou em sua crítica à Economia Política é que os economistas clássicos da Inglaterra, como Adam Smith e David Ricardo, além de naturalizar o desenvolvimento do capitalismo e não analisá-lo historicamente, não identificavam aquele elemento do processo produtivo que produzia valor. A este processo, Marx categorizou como "mais-valia", que significa o valor realizado no trabalho que não é pago ao trabalhador, que engorda o lucro do capital. Sem a mais-valia, não há capital, pois não haverá lucro. Um operário normalmente realiza em dois dias ou menos o valor equivalente ao salário que irá receber. Todo o valor produzido para além destes dois dias, alimenta o lucro do capital. E alimentando o capital, alimenta-se o poder dos capitalistas. A questão é que se uma empresa ou uma fábrica é colocada sob controle dos trabalhadores, os próprios trabalhadores podem se apropriar da própria mais-valia e dividir de acordo com o trabalho e a capacidade de cada um. Sendo assim, todos os trabalhadores terão acesso a uma riqueza proporcional à que produziu, desalienando o trabalho que até então não era pago. Os capitalistas temem a ocupação e autogestão das fábricas do mesmo modo que os latifundiários e o agronegócio entra em histeria quando das ocupações de terras pelo Movimento dos Trabalhadores Sem Terra, o MST.

Pois bem, a este processo de transição a uma democracia socialista na vida produtiva e na totalidade da ordem social, Marx chamava de socialismo, e dizia que somente uma revolução social encabeçada pelos próprios trabalhadores poderia levar a tal emancipação.

O conjunto da esquerda socialista brasileira que ainda luta por uma transformação radical da sociedade deve trabalhar nos próximos anos para conscientizar os trabalhadores e a juventude de seus interesses de classes e suas necessárias emancipações da ordem social capitalista. O que está em jogo nestas eleições é a garantia de um governo socialdemocrata que permita o desenvolvimento e fortalecimento das lutas sociais e das organizações sociais. Paralelamente, está em jogo muito da riqueza nacional, e as forças socialistas, com Dilma ou sem Dilma, terão de saber enfrentar frontalmente o Governo, se necessário, na defesa dos interesses dos trabalhadores, juventude, dos desempregados, dos sem terra, dos favelados e sem teto, do movimento LGBT, entre tantos segmentos oprimidos pela simples existência da ordem capitalista. Do contrário, a esquerda socialista terá abandonado sua razão de existência, que é a luta pelo socialismo, e aos trabalhadores restará a frágil defensiva política.


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