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Jones Manoel

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Palavras Insurgentes

A Grécia pós-referendo: entre a conciliação e o enfrentamento

Jones Manoel - Publicado: Segunda, 06 Julho 2015 08:36

O mundo olha com atenção para a conjuntura grega. Com mais de 60% dos votos o "não", ou OXI em grego, venceu o "sim".


É bastante claro que o povo grego evitou uma derrota história. Se o "sim" ganhasse a barbárie da austeridade teria legitimidade social, o Syriza tinha prometido renunciar ao governo e provavelmente novas eleições colocaria no poder estatal uma coalização entre a social-democracia do PASOK e a direita xenofóbica. É uma vitória, mas com pouco para comemorar e que deve ser olhada de uma perspectiva crítica. Vejamos.
 
O Syriza antes de ganhar a eleição começou a rebaixar seu programa político. Tsipras - de forma parecida com Lula - quis mostrar para os monopólios que controlam a União Europeia (EU)  que seu governo é "confiável". Afirmou pouco antes da eleição isso: "o futuro governo chefiado pelo Syriza vai manter todos os compromissos que a Grécia assumiu anteriormente com a União Europeia em matéria orçamentária e para eliminar o déficit." [1]. Depois de ganhar a eleição o Syriza tentou de várias formas buscar uma conciliação com a União Européia (UE). A busca da conciliação foi tão grande que Tsipras aceitou privatizar o porto de Pireu (maior do país), reverter às medidas sociais que tinha defendido (como aumentar salários, pensões, recontratar funcionários públicos etc.) e passou a chamar a Troika (FMI, Banco Central Europeu e Comissão Europeia) de "Instituições". No último acordo, Syriza e Troika tinham 90% de concordância, mas a Troika decidiu não fechar mais um acordo para continuara austeridade por uma questão política [2]. Como os protestos anti-austeridade vem crescendo em toda Europa, com Londres colocando 250 mil pessoas na rua contra a política dominante, a UE decidiu que esse é o momento de acabar, esmagar, o Syriza para evitar que seu exemplo de mínimo questionamento se espalhe. A Troika exigiu rendição total e queria que o Syriza aplicasse uma austeridade mais violenta que seus antecessores. Nesse momento a direção do Syriza puxou o referendo.
 
Os dilemas do referendo
 
Quando puxou o referendo a direção do Syriza deixou claro que não tinha intenção de sair da UE e que o referendo não era uma negação de acordos futuros, mas tão somente a repulsa a rendição absoluta como queria a Troika. O ministro das finanças grego, Yanis Varoufakis, declarou que preferia "cortar o braço a assinar um acordo sem restruturação da dívida" (deixando claro o que queria para assinar o acordo) [3]. Tsipras no discurso no momento da convocação do referendo  chamou a Troika de "parceiros", reclamou apenas do nível de brutalidade da austeridade (e não da austeridade em si) e clamou por um acordo. No momento de aprovação do referendo no parlamento grego, o Partido Comunista do país (o KKE) apresentou uma proposta para incluir entre as alternativas do "sim" ou "não" a proposta da UE uma terceira via: "você concordar em sair da UE e não pagar a dívida grega?". Com os votos do Syriza, ANEL e os nazistas do Aurora Dourada a proposta do KKE foi derrotada [4].
 
Sob extrema pressão e com um clima tenso a população grega foi chamada a decidir se aceita ou não a continuidade da austeridade em nível brutal, mas não o seu fim. Nesse meio tempo, com medo da proporção que tomou o referendo, os Estados Unidos e a França tentaram forçar a Alemanha a negociar com o Syriza e cancelar o referendo, mas Merkel mostrou intransigente confiando na vitória do "sim" [5]. Se o "sim" ganhasse o povo grego referendaria a austeridade o Syriza perderia o poder estatal, mas com a vitória do "não" quais as consequências imediatas?
 
Grécia pós-referendo
 
O porta-voz oficial do Syriza disse que a vitória do "não" dá "força ao governo para se mover com rapidez e poder chegar a um acordo que normalize a situação do sistema bancário” [6]. Tsipras no discurso pós-vitória do "não" tomou uma atitude altamente conciliatória afirma que hoje ficou provado que é possível "conviver democracia e moeda única" e mandando um recado de paz à Troika: "Sabemos que não há soluções fáceis. Mas há soluções, soluções viáveis. Assim haja vontade de ambos os lados”, acrescentou o primeiro-ministro, apontando que graças ao referendo e ao relatório do FMI divulgado esta semana, “o tema da nossa dívida vai passar a estar na mesa de negociações” [7]. Esse tom conciliatório antes do referendo e mesmo no pós-vitória, inclusive, foi o que fez o Partido Comunista Grego (KKE) não apoiar a campanha pelo "não", pois para os comunistas a vitória do "não" como o Syriza estava trabalhando significa legitimar uma austeridade "mais humana".
 
O fato é que os EUA e a França pressionam a Alemanha para chegar a um acordo. Obama ao que parece pensa da seguinte forma: se conseguirmos firmar um acordo e continuarmos a austeridade vamos deslegitimar o Syriza a longo prazo, mas a Alemanha quer um esmagamento agora [8]. O fato é que a direção do Syriza continua não cogitando sob hipótese alguma sair da zona do euro - única forma de acabar realmente com a austeridade - e procurando um acordo "mais humano" com a Troika [9].
 
Evidentemente que a luta política não é resolvida apenas nos gabinetes. O fato de Tsipras não ter aceitado o esmagamento total pedido pela UE se deve principalmente a dois fatos: a) a pressão das ruas conduzida pelo KKE (força hegemônica no movimento sindical e no movimento estudantil) e outras organizações de esquerda menores; b) a pressão interna produzida pelas tendências mais à esquerda do Syriza (como os trotskystas, maoistas etc.).
 
Nesse cenário temos duas grandes possibilidades. A conciliação: se EUA e França conseguirem convencer a Alemanha que um acordo com o Syriza é a melhor estratégia nesse momento, a política de austeridade seguirá com uma cara mais "humana"; se a Alemanha não aceitar de forma alguma um acordo (coisa que duvido que aconteça) o Syriza será forçado a procurar uma saída radical fora da UE (coisa que deveria ter feito desde que foi eleito).
 
O cenário está aberto e os caminhos da Grécia não definidos. É necessário afirmar que a vitória do "sim" teria sido uma vitória da Troika, mas olhar de maneira crítica a forma como a direção do Syriza interpretará o "não". A conciliação mata a Grécia e construir uma saída fora da zona do euro é uma tarefa urgente que a "esquerda radical", assim como o KKE, já deveria está construindo [10].
 
Notas:
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 

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