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Diego Bernal

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Logo se aprende

É pau, é pedra, é o fim do caminho

Diego Bernal - Publicado: Sexta, 28 Junho 2013 02:21

É assim que começa umha das cançons mais bonitas escritas nesse galego tropical que é o português do Brasil. Tom Jobim intitulou-na Águas de março. Nela canta com grande beleza um acontecimento simples para quem nom consegue enxergar direitinho a complexidade do quotidiano, a chegada das chuvas que fecham o verao.


A minha sensaçom quando ouço esta música na doce voz de Elis Regina, de cabelos em pé pola emoçom, é que apenas a minoria privilegiada é capaz de perceber esse formoso espetáculo das chuvas de março. O resto caminhamos sob a água, afastados de focagens poéticas e vulgarmente irritados pola molhadela.

As línguas som também um maravilhoso e complexo mundo quotidiano de difícil compreensom.

No concelho de Rairiz de Veiga, perto da harmoniosa aldeia de Santo André, ouvim por boca da hospitaleira família Morgade de Sam Miguel de Congostro, o termo lingüiça para designar os chouriços pequenos. Eu aprendera esse vocábulo dous anos antes, a 8000 km de distáncia, na metrópole do Rio de Janeiro. Até entom, lingüiça era para mim léxico brasileiro alheio à minha cultura. Também o era maluco que essa mesma terça de entruido surdiu dos sábios lábios camponeses do nonagenário dono da casa.

Numha recente visita ao Rio, o professor da Universidade de Compostela José António Souto Cabo descobria-me que o verbo vasculhar era comum na comarca do Ribeiro, donde procede a estirpe dele, com o significado concreto de varrer ou abstracto de procurar. Significado que eu aprendera lendo a imprensa carioca. 

Graças ao Dicionário de dicionários, feito polo ILG, sabemos que alface, frango, batata, morango, ervilha ou cenoura som formas do galego popular silenciadas artificialmente polo estándar da língua. Mas nom só. Obrigado (agradecimento), panela, boato, adufe, doido, fome ou canivete som nomes que eu aprendim de adulto em aulas de português quando as pudem ter aprendido no ensino obrigatório, na matéria de galego, pois fam parte do secular dicionário imaterial tricotado polo nosso povo.

Boquiaberto fiquei quando Paulo Rico, editor amigo e ativista cultural da Gentalha do Pichel, me desvendeu que moleque, batucar, garoto, cachaça e pegar (apanhar), que minha ignorância ligava sem hesitaçom ao Brasil, som também palavras cem por cento galegas. Todas elas junto com a galego-brasileira chalana e os substantivos do mundo agrário galego aplicados a modernos usos urbanos no Brasil como rodízio, capoeira, espelunca, esteira e malhado poderiam ser a base argumental para escrever o ensaio, ao estilo de John Reed, Dez palavras que abalaram o mundo da separaçom entre o galego e o português.

Antônio Carlos Jobim, maior expoente da música brasileira, precisou de mais de três minutos de música e um cento de metáforas para definir umha simples chuva. Será que a língua galega cabe numha frase tam restritiva quanto ridícula como “o galego e o português som línguas distintas”?

Eu, para evitar sarilhos e vermelhidons de rosto, seguiria o exemplo do maestro Jobim e falaria da língua da Galiza com menos simpleza e mais metáforas e colcheias, “É pau, é pedra é o fim do caminho...”.


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