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Iñaki Gil de San Vicente

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O Sortu e a militarização espanhola

Iñaki Gil de San Vicente - Publicado: Sábado, 26 Março 2011 01:00

Iñaki Gil de San Vicente [Tradução do Diário Liberdade]

Um dos contributos fundamentais de Rosa Luxemburgo à crítica do capitalismo foi a análise da militarização como elemento chave da fase imperialista que se iniciava por aquela época.


A história do século XX e o que vai de XXI tem corroborado sua teoria e a tem alargado até extremos então inimagináveis. Por exemplo, calcula-se que por volta de 20% da força de trabalho ativa de EUA na década de 1980 estava relacionada com o complexo industrial-militar, e esta percentagem continuou sua tendência à alça. A militarização não penetra só no econômico e no Estado mesmo, senão que estende seus tentáculos na indústria político-mediática, na produção da ruim cultura de massas, no planejamento universitário, na sociedade inteira. Engels já anunciava esta tendência à fusão entre todas as componentes sociais ao sublinhar a identidade de fundo entre os acouraçados e a sociedade capitalista.

Pressionadas por esta evolução imparável, as burguesias atrasadas e fracas que se protegiam com exércitos tardo-medievais e poderes reacionários que afundam seus alicerces em modos tributários e escravistas de produção, como a Igreja, recorreram à militarizaçom capitalista para tentarem diminuir as distâncias que as separa das potências imperialistas hegemónicas, ou, no mínimo, para evitarem o alargamento desse abismo. Uma comparação entre a militarização do Estado francês e do espanhol dariam lições muito instrutivas sobre as diferenças formais que existem na idêntica opressão nacional que exercem contra o País Basco e os Países Cataláns mas extravasaríamos o espaço disponível.

A militarização moderna espanhola inicia-se definitivamente com a chegada de técnicos nazistas para racionalizar a produção bélica das indústrias bascas em 1937, que visava rearmar o exército internacional franquista. O muito efetivo planejamento industrial-militar nazista, herdeiro da Prússia bismarckiana, demorou em calhar no capitalismo espanhol pela tecnofobia de sua classe dominante: "que inventem eles", "viva a morte, abaixo a cultura", etc. A guerra de Ifni e a Marcha Verde mostraram o arcaísmo do muito fraco complexo industrial-militar espanhol. Depois de vãs tentativas modernizadoras realizadas por UCD foi o PSOE quem criou a estratégia para a militarização para além do estritamente bélico, aproveitando tanto os inícios nazistas como o papel central do Exército na Constituição avalada pelo rei que Franco nomeou.

A entrada na NATO foi imprescindível para isso, como a ajuda bélica ianque nos 50 o foi para sustentar a ditadura. Ao mesmo tempo, estreitava-se a interação entre a racionalidade militar e o endurecimento das opressões políticas, e os GAL foram um banco de prova do que sairiam depois as sucessivas estratégias repressivas que, por agora, culminaram na Lei de Partidos e na participação espanhola no ataque imperialista à Líbia, após a experiência adquirida em outras guerras recentes. Nestes momentos, a produção industrial-militar espanhola, de tecnologia média-alta, é uma das muito poucas ramas econômicas rendíveis.

Algumas esquerdas tradicionais sustentaram nos anos 80 e 90, dantes de desaparecer, que era impossível a existência de uma racionalidade militar burguesa porque, segundo diziam, exército e inteligência eram incompatíveis. Foi um profundo erro que afundou a fraqueza teórica precisamente quando o imperialismo criou a desculpa da "guerra humanitária" enquanto grelava uma crise como a atual em que o comando econômico é simultaneamente político-militar. Para outros a globalização encerrava a fase militarista porque também dava cabo da fase imperialista, e viram em Obama, prêmio Nóbel à "pax americana", um exemplo do avanço a uma "governança mundial" que ultrapassasse o "violento século XX". Rosa Luxemburgo teria abalado com a sua pena tanta superficialidade. Enquanto se davam estes *devaneios o capitalismo espanhol avançava na fusão de seus poderes até chegar à situação presente. Um exemplo temo-lo na diferença entre a negativa do PSOE a participar no Iraque e o ataque espanhol à Líbia. Que foi o que aconteceu nestes oito anos? Depois da cegata euforia de então desde 2007 voltou a crua realidade, e a militarização que ia sendo reforçada desde a década de 1980 apareceu como o que é, além de uma caraterística fundamental de todo capitalismo, no caso espanhol, um dos instrumentos decisivos para sua sobrevivência nacional-estatal.

O nacionalismo imperialista espanhol está soldando uma unidade político-militar, econômica e cultural na qual suas diversas componentes interagem de forma crescente. O Exército espanhol interveio já durante a luta popular contra a nuclearização no País Basco. Mais tarde, o Estado espanhol conseguiu que a NATO fosse garante da "integridade nacional" de seus membros. Por um lado, cada vez que alguém hesita sobre o papel angular do rei e do Exército, chama-se-lhe à ordem de imediato. Por outra parte, a militarização do PSOE aprecia-se vendo como os dois supostos sucessores de Zapatero estão estreitamente relacionados com o policíaco-militar, governo que não reprimiu a greve dos controladores aéreos militarizando o conflito.

Aliás, a centralidade hierárquica, disciplinar e concetual inerente à militarização burguesa domina já no nacionalismo espanhol dos CCOO e UGT, decididos a varrer as "particularidades regionais" do sindicalismo lutador das nações oprimidas e impor uma estatalização antidemocrática que agilize a corrente de comando da CEOE sobre os povos trabalhadores para aplicar os duríssimos planos já decididos. Mas, se isto não chegasse, todo isso se realiza dentro do enquadramento repressivo mais duro da UE, como reconheceu não faz muito o ministro Rubalcaba. Também não devemos esquecer a contraofensiva linguístico-cultural espanhola e o renascido nacional-catolicismo tridentino e imperial que avança ao som de condenações inquisitoriais.

Mas a racionalidade militar e a arte da guerra aconselham dispor sempre do que em política é chamado de "plano B", quer dizer, táticas alternativas perante os movimentos do inimigo. Aqui podemos aplicar ao Estado espanhol as teses de Lenine sobre a dialética entre guerra e política, e de Gramsci entre "guerra de movimentos" e "guerra de posições", para compreender por que teve algumas diferenças seu Tribunal Supremo quanto à ilegalização do Sortu, e as possibilidades que lhe abrem para outras decisões futuras sobre este partido dependendo da evolução do conflito. A ilegalização do Sortu mostra que o Estado conseguiu apressar ao extremo a contra-insurgência de desgaste em longo prazo para romper a tendência cumulativa à alça de forças soberanistas e independentistas, desgaste para o que vale tudo.

Ora bem, nas longas confrontaciones se costuma esquartejar a firmeza do bando opressor perante a decisão do bando oprimido, abrindo fendas em seus quartéis generais. Maquiavelo, primeiro teórico da racionalidade político-militar, advertia ao Príncipe que em determinados momentos o político é mais efetivo que o militar, lição histórica que Napoleón corroborou dizendo que com as baionetas pode ser feito de tudo exceto se sentar sobre elas.

País Basco 24-III-2011

Tradução para galego do Diário Liberdade.


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