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Leônidas Dias de Faria

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Sinistra!

Relativismo absolutista: um suicídio filosófico

Leônidas Dias de Faria - Publicado: Segunda, 22 Junho 2015 00:10

Travestida de enunciado libertário, a asserção de que "cada um tem sua verdade" não passa da afirmação ingênua de um dogma paradoxal, de um gemido conformista e anestesiante, capaz de transgredir apenas o bom senso.


Defender esse contrassenso, embora massageie o ego dos derrotados, desqualifica por completo sua luta por um mundo outro, em que o jugo objetivo não lhes pese sobre os ombros. O máximo que se consegue com esse slogan é reduzir a crítica a uma apreciação pessoal intransferível e incomunicável, portanto, inócua, acerca de uma realidade em si mesma insondável. A denúncia das atrocidades desse mundo se enclausura na subjetividade do crítico.

Assim como é indubitável a possibilidade de vários discursos serem verdadeiros ao mesmo tempo, inclusive sobre um mesmo tema, é também inquestionável a possibilidade de uma infinidade de discursos falsos serem proferidos a respeito, inclusive intencionalmente. Nem tudo o que se pensa ou se diz é verdadeiro. As pessoas se equivocam com frequência, assim como são perfeitamente capazes de mentir. E não há nada de libertador na negação dessa obviedade. Há, como urge alertar, um grilhão a ser inadvertidamente atado à pata dos incautos.

A verdade não é uma posse individual cujo reconhecimento faça parte do pacote constitutivo da dignidade de alguém, que teria assim preservada a validade de sua "visão de mundo", não obstante a negação necessária de seu lastro objetivo. Não há nada que alguém possa ter em si, para si ou consigo, como um atributo ou como bem de uso próprio e exclusivo, independente do que está à sua volta, a que se possa dar o carinhoso nome de "verdade". O nome disso que se pode ter como próprio é "convicção" ou "crença", estado subjetivo que pode ou não ser condizente com o que se passa de fato.

A verdade é uma propriedade de alguns discursos ou crenças não proferidas, em sua relação com as coisas e eventos a que dizem respeito. Desse modo, não basta que alguém creia em algo para esse algo converter-se em verdade; isso depende de ocorrências objetivas que usualmente fogem totalmente ao controle de quem crê e afirma isso ou aquilo sobre os fatos.

Não basta, para usarmos um dos infindáveis exemplos possíveis, que eu creia e afirme girar o Sol em torno da Terra para que esse evento cósmico se opere; assim como não é possível que, no caso de assim se passar, a opinião contrária sobre o tema preserve sua verdade. Tampouco é possível que estejam de posse da verdade, ao mesmo tempo, tanto aquele que afirma tal evento como aquele que o nega, independentemente do que efetivamente se passa na relação objetiva entre os referidos astros e o todo complexo de que participam.

O Sol não girar em torno da Terra é um fato que independe absolutamente das convicções que se apresentam a respeito, assim como se dá à revelia das interpretações o fato de ser o capitalismo um sistema social fundado na exploração do trabalho de uns por outros que não trabalham. A afirmação de tais fatos, assim como de quaisquer outros, é o que se pode apontar como enunciado verdadeiro. Classificar como equívoco a posição contrária não é cometer uma falta moral ou qualquer outra violência contra quem a defende, mas reconhecer esse indivíduo como interlocutor legítimo, a quem se deve o esforço de esclarecer com argumentos e ilustrações e de quem se deve esperar esforço idêntico.

Afirmar que cada um tem sua verdade própria é inviabilizar qualquer debate autêntico, ao mesmo tempo em que garante ao discurso hegemônico, midiaticamente instaurado, a manutenção de sua preponderância, que se vê reduzida a um consenso espontâneo, meramente casual, entre os mais numerosos – que assim se distinguem dos “excêntricos”. Não podendo jamais ser questionada, essa “verdade própria” da maioria serve de parâmetro para sua ação conjunta, cujo resultado inevitável é a reprodução do absurdo vigente.


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