A ocupação de moço de padaria, como a de aguadeiro, empregado de café ou a de moço de frete, era uma das profissões habituais da imigração galega em Portugal. A imagem do trabalhador galego a levar uma imensa cesta de pão às costas era muito habitual na capital lisboeta dos finais do século XIX e inícios do século XX. Com aquela carga saiam à primeira hora da manhã das padarias para irem vender o pão, chegando até aos lugares mais distantes da cidade.
A intenção dos responsáveis da Câmara era acabar com a falta de peso do pão que se repartia pelas ruas da cidade. Naquela altura, quando os moços de padaria que vendiam o pão com menor peso do assinalado eram detidos pela polícia, geralmente davam nomes e endereços falsos, com o qual não se impedia que continuassem a produzir-se aqueles furtos. A nova postura impunha a obrigação para os vendedores ambulantes de pão de levarem um cartão de identificação e também um certificado de caução no valor de 8.000 réis.
Os moços de padaria não eram responsáveis pela falta de peso nos pães, pois o furto era uma astúcia dos donos das padarias, mas eram eles que eram atingidos pela nova postura, sob a ameaça de punições de até 2.000 réis.
Os operários decidiram então fazer valer a sua razão, por meio da associação de classe: a Associação dos Operários Manipuladores de Pão de Lisboa, criada em Julho de 1887. Em 16 de Junho, depois duma assembleia de dois milhares de operários na sede da associação, decidiu-se iniciar uma manifestação para o governo civil com a intenção de apresentar uma moção de protesto contra a postura municipal. Antes de chegar ao destino, a manifestação foi dissolvida pela força policial e vários padeiros foram detidos.
Em 18 de Junho, os padeiros tentaram reunir-se novamente na sede da Associação, na rua de São Bento, assim como uma comissão operária dirigir-se ao ministério do Reino para expor as reclamações operárias. O comício operário foi proibido pelas autoridades, e os padeiros decidiram fazer a reunião no campo, na Serra de Monsanto, onde ficariam à espera da resposta do ministro aos membros da comissão. Mas o ministro do Reino, João Franco (que algum tempo depois, em 1906, viria a presidir o próprio Conselho de Ministros) negou-se a resolver nada referente à questão se os padeiros não deixavam a sua posição de força. Quando os integrantes da comissão chegaram ao Monsanto e depois de informarem do resultado das conversações com o ministro, pediram a opinião da assembleia, os operários proclamaram a greve dos moços de padaria.
Alem disso, decidiu-se que os operários em greve ficariam na Serra do Monsanto, a fazer um acampamento permanente até à aceitação das suas reclamações. Segundo o “Diário Ilustrado”, metade daqueles 2.000 padeiros grevistas acampados no Monsanto seriam galegos, ainda que muitos deles diziam-se portugueses. A cidade de Lisboa ficava sem fornecimento de pão e a greve dos padeiros convertia-se num surpreendente movimento de protesto como nunca tinha sido visto no país.
eliseo@nodo50.org