As vicissitudes da democracia mediatizada levam a que esta parte oficial da campanha decorra sem debate directo entre os partidos, cujas trocas de argumentos serão a partir de agora à distância, e sujeitas à interpretação dos jornalistas que acompanham os candidatos, e, não menos importante, dos comentadores que, sentados nos estúdios, irão atribuindo vitórias e derrotas consoante os seus interesses particulares. Que não são interesses pessoais, entendamo-nos, são interesses de classe.
Os tempos de antena nas TV's, que em tempos tiveram honras de horário nobre, passam agora antes dos telejornais, com audiências reduzidas, a confirmar-se o que tem acontecido nos últimos actos eleitorais.
O que ocorreu na pré-campanha dá o tom da campanha. As propostas do Bloco de Esquerda e do PCP, nomeadamente no que respeita à recusa do acordo com a troika e defesa da renegociação da dívida, continuarão a ser menorizadas, ou mesmo ridicularizadas, merecendo epítetos como o de "marcianos" (Constança Cunha e Sá) ou de como tendo razão antes do tempo, sendo que em política quem tem razão antes do tempo não tem razão (Marcelo Rebelo de Sousa). Significando isto que se se vier a impor, ainda antes das eleições, o cenário de renegociação da dívida, os media do sistema tratarão de explicar ao povo que isso é uma vitória dos partidos do "arco da governação", estando por saber como explicarão que é uma derrota do perigoso extremismo de esquerda, de acordo com a classificação que apresentam como objectiva.
Mas, dêem-se as voltas que se derem, é neste cenário, de uma comunicação social que toma partido, que a esquerda terá, nesta e na próxima semana, de procurar captar mais apoios, particularmente entre aqueles que, com o acordo da tríade PS/PSD e CDS, vão pagar mais severamente a agiotagem do capitalismo internacional sobre Portugal, ou, para sermos mais exactos, sobre o povo português.
Há quem menospreze a importância do reforço da representação parlamentar à esquerda do PS, com o argumento de que não conta para o governo. Se esta esquerda conseguirá ou não convencer uma parte significativa dos portugueses de que mais deputados contam, para dar força às lutas e à resistência popular, é a verdadeira questão que se coloca nestas eleições. Porque, ao contrário do que dizem os fazedores de opinião, o que é menos relevante, de facto, é a repartição de votos entre PS, PSD e CDS, porque é sabido que encontrão sempre a melhor maneira de executar a pior ofensiva contra o trabalho – incluindo os que não têm trabalho – de que há memória no Portugal de Abril.
E entre os muitos que não votam, mais de 1/3 dos recenseados, estão também muitos dos que mais têm a perder do pouco que ainda têm. E duas semanas parece pouco tempo para criar uma mobilização que negue a resignação e saia para a rua. Por isso, todos somos poucos na conquista de cada abstencionista para o voto no seu próprio futuro. Até 5 de Junho, este é o caminho a percorrer.