Mas o tema destas linhas é outro, é o prato do dia servido em doses abundantes nos fóruns das rádios e tv's, para deleite dos fazedores de opinião de serviço. Ao recusarem encontrar-se com os representantes do FMI e sus muchachos, BE e PCP deveriam ter antecipado que as propostas alternativas à austeridade seriam esquecidas e substituídas pelo alarido em torno da responsabilidade ou irresponsabilidade de negar o encontro.
Com esta recusa, o que estão de facto estes partidos a dizer aos eleitores que fariam se fossem governo? Que só falariam com governos de países "amigos"? Que fechariam o país a representantes do FMI, da OMC, da NATO?
Dir-se-á que PCP e BE não têm responsabilidades governativas, e isso é evidente, mas a questão que se coloca é, se ambicionam mesmo ter essas responsabilidades, porque não vão demonstrando, em exercício, o que fariam se as tivessem? É sabido que ambos os partidos têm apresentado soluções alternativas ao "resgate", e que passam principalmente pela renegociação da dívida e por uma acção conjunta dos países já atingidos ou ameaçados pela especulação dos ratings. Não seria esta a melhor ocasião de colocar essas propostas alternativas no debate público e popular?
Ao negar o encontro com os senhores do FMI / Banco Central Europeu / Comissão Europeia, BE e PCP deixaram um vácuo, rapidamente ocupado pelos seus adversários políticos, que têm passado as últimas horas a explicar ao povo porque não deve votar nesses perigosos extremistas que, além, do mais, são mal-educados.
Como é evidente teria sido possível encontrar outra solução que não o rotundo não, como exemplifica a CGTP, aceitando o encontro, anunciando o que lá irá fazer e que terá ainda tempo de antena à saída para falar directamente aos trabalhadores.
Uma esquerda que quer ser governo não pode virar as costas a nenhum interlocutor, tem apenas de ser firme nas suas convicções e na defesa dos interesses do povo e do país, falando de cabeça levantada seja com quem for. Isto se quer ser levada a sério, claro.