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ucraniaUcrânia - Diário Liberdade - [Alejandro Acosta] No cenário atual, no caso de um (improvável) ataque militar russo, o mais provável é que a OTAN não responderia em termos militares diretos. Pelo menos inmediatamente. No caso da política militarista do imperialismo escalar, as consequências seriam imprevisíveis.


Quais são os fatores que podem levar à escalada da guerra na Ucrânia e na região? A Rússia pode invadir a Ucrânia?

No centro da crise da Ucrânia, se encontra o aumento da pressão do imperialismo sobre a Rússia como parte da política da OTAN na Europa e do imperialismo norte-americano na região Pacífico da Ásia. A recente visita do secretário do Departamento de Estado, John Kerry, à Rússia, para se encontrar com Vladimir Putin e Serguei Lavrov, o ministro das Relações Exteriores russo, teve como objetivo reduzir as tensões na Ucrânia para fortalecer uma frente única, onde o papel da Rússia é fundamental, na tentativa de estabilizar, até onde for possível, o Oriente Médio. Essa política representa uma das últimas cartadas da desgastada Administração Obama em vista às próximas eleições, no contexto em que os republicanos controlam ambas as câmaras do Congresso, com forte influência da extrema-direita do Tea Party, agrupada no Partido Republicano.

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Mas a situação é contraditória e os interesses envolvidos dificultam avançar para acordos sólidos. O governo de Poroshenko continua aplicando medidas contra a população russa que mora na Ucrânia. Além das declarações de que pretende preparar uma grande força militar para retomar o aeroporto da cidade de Donetsk, os batalhões nazi-fascistas foram legalizados e os seus membros passaram a receber benefícios sociais. Entre eles estão a ONU (Organização dos Nacionalistas Ucranianos) e o EIU (Exército Insurgente Ucraniano). Ambos colaboraram ativamente com as forças hitleristas e foram responsáveis por vários massacres. A extrema-direita pressiona para que Stepan Bandera, o conhecido fascista ucraniano e colaborador do nazismo, seja reconhecido como "herói nacional", coisa que já chegou a acontecer em 2010. Mas o governo teve que voltar atrás devido à pressão do Parlamento Europeu, da Rússia e de várias organizações. O primeiro-ministro ucraniano, que é ligado à extrema-direita, chegou a declarar que a Rússia teria atacado a Ucrânia e a Alemanha na Segunda Guerra Mundial.

Para conter os golpistas ucranianos, que atuam como meros marionetes do imperialismo, a Rússia tem aplicado na Ucrânia a mesma política já conhecida na Transnístria (Moldávia), em Abkhazia e na Ossétia do Sul (Geórgia) e em Nagorno-Karabakh (Azerbaijão). O principal objetivo tem sido conter o ingresso da Ucrânia na OTAN, já que deixaria a ameaça militar a apenas 430 quilômetros de Moscou. Ao mesmo tempo, e dentro da mesma política de contenção, a Rússia tem reforçado a presença militar na Crimeia.

Quais seriam as consequências da entrada da Ucrânia na União Europeia?

A integração da Ucrânia na União Europeia, na atual situação política, conduziria inevitavelmente à implosão da semifalida economia local. O país seria totalmente dilapidado pela crescente pressão dos monopólios que buscam salvar os lucros a qualquer custo.

No recente acordo da União Europeia com a Ucrânia, nada foi mencionado sobre a eliminação da necessidade de visto para os ucranianos entrarem na Europa nem sobre a entrada da Ucrânia na União Europeia. As cúpulas da Comissão Europeia e do governo alemão já se pronunciaram de maneira contrária. A inclusão da Ucrânia implicaria na necessidade de injetar centenas de bilhões de euros para estabilizar o país, enquanto atuais membros da União Europeia ameaçam implodí-la.

A Rússia pode estabelecer barreiras protecionistas contra as importações de produtos ucranianos que hoje gozam de tratamento preferencial, provocando a disparada do já estratosférico déficit comercial. O governo deposto de Ianukóvich tinha calculado que a integração na União Europeia custaria à Ucrânia nada menos que 104 bilhões de euros, somente por conta da adoção de centenas de novas leis comerciais e de outras milhares de leis para adequar o país às novas regulamentações.

Em 2013, enquanto a União Europeia exportou à Ucrânia 24 bilhões de euros (principalmente equipamentos industriais e produtos químicos e manufaturados), as importações da Ucrânia somaram apenas 14 bilhões de euros, compostas fundamentalmente por matérias-primas agrícolas e minerais, além de aço.

Nos dias 3 e 4 de julho, acontecerão conversações trilaterais entre a União Europeia, a Rússia e a Ucrânia. A política a ser seguida será a de contenção dos conflitos no Donbass. Inclusive essa é a política da Administração Obama, como ficou claro com a recente visita de John Kerry à Rússia. A Ucrânia terá a entrada barrada tanto à União Europeia como à União Euroasiática.

Qual é a estratégia militar da Rússia em relação à Ucrânia?

Em primeiro lugar, a Federação Russa busca manter o status quo e impedir que a Ucrânia ingresse na OTAN. Tanto a Ucrânia como a Bielorússia têm funcionado como os dois principais mecanismos de contenção contra o aperto do cerco da OTAN.

Conforme o próprio Vladimir Putin tem declarado, a política do governo russo para a Ucrânia busca que sejam convocadas eleições gerais e amplas e que as duas repúblicas do Donbass, Donetsk e Lugansk, passem a gozar de ampla autonomia, nos moldes da República Autônoma da Crimeia, antes da anexação à Rússia. Essa autonomia envolveria o poder de veto na Rada (parlamento nacional), com o consequente poder de veto da entrada do país na União Europeia e na OTAN.

A existência das repúblicas de Donetsk e de Lugansk depende do apoio da Rússia. Mas não há motivações filantrópicas ou "socialistas", como uma parte de esquerda tem levantado. Trata-se da conhecida política russa de defesa das fronteiras e de contenção do imperialismo.

O governo da Federação Russa somente avançaria em termos militares sobre a Ucrânia no caso das potências imperialistas escalarem a agressão sobre o Donbass. Essa operação implicaria na posterior adesão da Ucrânia à OTAN e o próximo alvo, com certeza, seria a Crimeia. O aperto do cerco contra a Rússia seria gigantesco, e iria além de um simples regime change (ou mudança de regime), podendo retroceder à situação imediatamente posterior ao colapso da União Soviética, no início da década de 1990. Essa situação poderia voltar a ficar colocada na ordem do dia se a ala direita do imperialismo continuar se fortalecendo, principalmente nos Estados Unidos.

A Ucrânia compartilha quase dois mil quilômetros de fronteiras com a Rússia.

As alternativas militares acarretariam, como calcanhar de Aquiles, em primeiro lugar, um novo aperto das sanções, que teriam o potencial de aumentar os problemas da economia russa e a desestabilização interna. Ao mesmo tempo, os esforços do governo russo, do imperialismo europeu, e agora com a adesão da Administração Obama a essa política, é exatamente a oposta, a distensão do conflito no leste da Ucrânia.

O avanço militar russo com o objetivo de controlar o território ucraniano somente poderia ser feito por meio de ataques com artilharia pesada. Os gastos com a reconstrução seriam gigantescos e ameaçariam a estabilidade da própria Rússia.

O exército ucraniano conta com 150 mil homens, além da Guarda Nacional, os reservistas e o apoio semivelado da OTAN. Conforme ficou evidente na derrota que sofreu em Debaltsevo (Donetsk), em fevereiro, a desmoralização das tropas é enorme.

As alternativas militares da Rússia em relação à Ucrânia

As alternativas militares para a Rússia se resumiriam a quatro ou cinco alternativas, caso fracassar a política de manter o status quo ou de buscar um acordo sobre a manutenção da integridade da Ucrânia, com a autonomia para o Donbass e sem voltar atrás em relação à Crimeia.

Em primeiro lugar, a Rússia pode tentar avançar um pouco as fronteiras dentro do Donbass ou buscar separar o Donbass da Ucrânia como um todo, independentemente de, posteriormente, anexá-lo à Rússia ou não.

Uma segunda alternativa seria avançar até o Rio Dnieper, que divide a Ucrânia, de norte a sul, em duas partes.

Uma terceira alternativa poderia incluir Odessa, onde fica localizado o porto mais importante do país, na região sul, na fronteira com a Moldávia, o que permitiria conectar a Rússia com a Transnístria.
Uma quarta possibilidade seria invadir toda a Ucrânia, o que pareceria a possibilidade mais viável sobre o ponto de vista militar, para evitar os contra-ataques posteriores.

A alternativa de concentrar o ataque só na região sul, por exemplo, com o objetivo de dominar uma faixa costeira, até a Península da Crimeia ou avançando até a fronteira com a Transnítria, colocaria o problema da defesa posterior, que ficaria muito exposta.

O Rio Dnieper serve como uma espécie de barreira natural contra possíveis contra ataques, numa região dominada pela estepe. No lado ocidental do país, predominam as planícies com pastagens, principalmente no sul. No lado oriental, também existem algumas florestas.

Devido à proximidade geográfica e à facilidade de locomoção no terreno, o avanço seria rápido, tanto em relação à infraestrutura, como ao apoio logístico e aéreo. Seria algo parecido com o que foi visto na Geórgia em 2008, mas numa escala maior.

A situação geográfica imporia a necessidade de estacionar um grande número de soldados para manter o controle a da situação. Mas, apesar do exército russo contar com aproximadamente um milhão de homens, ainda precisa manter forte presença na região norte do Cáucaso, na Crimeia, nas fronteiras com a Finlândia e a OTAN, nos países Bálticos e no Ártico.

Mesmo que as cidades menores e os povoados sejam deixados para trás, o esforço para manter os suprimentos e pacificar a retaguarda seria enorme. O objetivo mais provável seria tomar Kiev rapidamente e bloquear Odessa por meio da Frota do Mar Negro, que está estacionada em Sebastopol, na Crimeia. Mas a travessia do Rio Dnieper requereria esforços importantes devido a que o exército ucraniano teria tempo para explodir as principais pontes durante a retirada. Uma vez controlada a região oriental, ficaria mais fácil de mantê-lo, pois o controle poderia ser feito a partir de pontos específicos e com o apoio de uma parte considerável da população. Mas a região conta com 13 milhões de habitantes, o que envolveria um número alto de tropas. A própria preparação da invasão requereria uma grande mobilização das tropas que seria rapidamente detectada pelos serviços de inteligência europeus e norte-americanos, que hoje já acompanham de perto as movimentações em Belgorod, perto da fronteira com a província de Kharkov.

Os possíveis resultados de uma invasão militar russa à Ucrânia

O primeiro ponto crítico da invasão russa seria que escalariam as sanções contra Rússia. Por esse motivo, o governo Putin tem buscado a redução das tensões e a normalização das relações com as potências europeias. A visita de John Kerry à Rússia busca o apoio no Oriente Médio e usa como moeda de troca exatamente favorecer essa política russa. Mas o ponto crítico, que a Rússia de Putin não pode aceitar, é o ingresso da Ucrânia na OTAN. A Alemanha tem respeitado essa linha vermelha, apesar do envolvimento no golpe de estado do Maidan e a desestabilização da periferia russa, como resposta ao avanço da Rússia na Europa Central.

Em segundo lugar, o custo da conexão com a Crimeia por terra não vale a pena para a Rússia, em relação aos custos envolvidos em todos os aspectos. Apesar das vantagens, se não for completada com a dominação completa da Ucrânia, estaria longe de resolver o problema principal, a segurança das fronteiras.

Dificilmente a Rússia conseguiria controlar a região ocidental durante muito tempo, Kiev ou Lviv por exemplo. O que sobrar da Ucrânia passaria a ser controlado diretamente pela OTAN, inclusive porque a destruição da capacidade militar local seria substituída diretamente pela OTAN.

A criação de uma nova "cortina de ferro" no Rio Dnieper traria consequências muito piores para a Rússia que uma Ucrânia neutra. Ainda haveria os gigantescos custos envolvidos na reconstrução e na estabilização do país. Essa política estaria muito além das possibilidades objetivas da Rússia, considerando não apenas o poderio bélico, mas as debilidades da economia e os compromissos com os chineses para a integração da Europa no chamado Novo Caminho da Seda.

Escalação total da guerra?

No cenário atual, no caso de um (improvável) ataque militar russo, o mais provável é que a OTAN não responderia em termos militares diretos. Pelo menos inmediatamente. No caso da política militarista do imperialismo escalar, as consequências seriam imprevisíveis.

Para a OTAN, mobilizar forças em terra, na Ucrânia, implicaria no desafio das dificuldades da própria mobilização, a necessidade de estabelecer a superioridade aérea contra a Rússia e, posteriormente, enfrentar um exército poderoso e armado com equipamento de última geração.

Enfrentar a aviação e as defesas aéreas russas requereria a mobilização do mais avançado da OTAN, além da necessidade de reforçar as bases em todo o cerco ocidental contra a Rússia. O esforço militar, econômico e político seria gigantesco. Por outra parte, a Rússia teria a vantagem de operar a partir do próprio território e a OTAN contaria com um maior número de aparatos militares, além da força combinada de várias potências imperialistas de primeira ordem.

As consequências da escalação da guerra na Ucrânia desenvolveriam as tendências revolucionárias em toda a região. Essa política não está colocada, neste momento, mas poderá estar colocada no próximo período, conforme a crise capitalista se aprofundar e a capacidade de manobra do imperialismo ficar ainda mais reduzida.

Alejandro Acosta está atualmente na Rússia cobrindo os acontecimentos geopolíticos na região como jornalista independente.


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