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esperanza-aguirreEstado espanhol - Carta Maior - [Oscar Guisoni] A renúncia, aparentemente por razões pessoais, da presidenta da estratégica Comunidade de Madri deixa o governo conservador de Mariano Rajoy sem uma peça valiosa em um momento de máximo desgaste político provocado pela grave crise econômica que atinge o país. O adeus de Esperanza, a aguerrida Thatcher madrilena, deixa um profundo vazio na rançosa direita espanhola. 


Há apenas alguns dias um site republicano a havia pintado da pior maneira possível: "Espanhóis, a única Esperança que devemos perder é esta", dizia uma legenda abaixo de seu rosto austero de política linha dura. Esta semana a dama de ferro de Madri surpreendeu aliados e não aliados com uma sonora saída quando ninguém dava por concluída sua carreira política. Se algo caracterizou Esperanza Aguirre durante toda sua vida política, esse algo foi a surpresa, a capacidade de colocar o sapato em cima da mesa quando ninguém esperava, de esticar a corda até o limite, de dizer diretamente o que seus correligionários não tinham coragem de dizer, até levar a política a um extremo poucas vezes visto na democracia contemporânea espanhola.

A renúncia, aparentemente por razões pessoais, da presidenta da estratégica Comunidade de Madri deixa o governo conservador de Mariano Rajoy sem uma peça valiosa em um momento de máximo desgaste político provocado pela grave crise econômica que atinge o país. O adeus de Esperanza, a aguerrida Thatcher madrilena, deixa um profundo vazio na rançosa direita espanhola.

Esperanza Aguirre e Gil de Biedma, Condesa consorte de Murrillo Y Grande da Espanha é, como seu pomposo nome indica, uma filha da aristocracia mais antiga da península. Nascida em Madri no pós-guerra, em 3 de janeiro de 1952, começou sua carreira política aproximando-se da ultra-minoritária União Liberal, uma organização que logo iria se integrar ao conservadorismo espanhol expresso pela Aliança Popular, o partido que recolheu a herança do franquismo durante a aurora do retorno democrático no final dos anos setenta.

Em 1983, um ano depois do arrasador triunfo do socialista Felipe González
nas eleições gerais, Esperanza é eleita conselheira por Madri. Em 1987, sua vida política dá uma virada quando se integra plenamente à Aliança Popular, organização pela qual concorre mais uma vez ao Conselho de Deliberação. Desde sua posição, protagonizará essa espécie de golpe de estado democrático que a direita mais recalcitrante deu no prefeito socialista de Madri, Juan Barranco, em 1989, inaugurando um longo período de hegemonia da direita na capital do reino.

Desde o início, Esperanza sempre esteve à direita de seus próprios correligionários. E em matéria de ambições foi sem dúvida a primeira. "Quero ser ministra da Defesa", afirmava enquanto ocupava seu primeiro cargo de importância, em 1991, como responsável pela área do Meio Ambiente do município. Mas teve que esperar até 1996 quando seu correligionário, José María Aznar, assumiu o governo nacional, para começar a jogar nas ligas maiores. Aznar, um neoliberal reconhecido por suas posições ultraconservadoras, a nomeou ministra da Educação. Já na trincheira, Esperancita, como a chamam maliciosamente seus detratores, não tardou em enfrentar-se com estudantes e professores e até com o mundo do cinema por seus constantes "patazos" e suas posições extremistas.

Em 1999 Aznar remodelou seu gabinete e Esperanza teve que deixar o governo para ir para o Senado, onde foi designada presidenta da instituição, a primeira mulher a chegar à cúpula da Câmara Alta espanhola. Mas as vicissitudes de uma câmara sem poder real – não tem poder de veto sobre as leis debatidas pelos deputados – não estava, à altura de suas ambições e, em 2002, abandonou o Senado para apresentar-se como candidata a presidir a Comunidade de Madri, o governo regional da capital e um dos centros nevrálgicos do poder na península.

O tiro esteve a ponto de sair pela culatra quando, nas eleições regionais de 2003, ficou a duas cadeiras de obter a maioria absoluta e uma coalizão entre PSOE e Esquerda Unida quase lhe arrebata o sonho. Mas a situação sofreu uma reviravolta e dois deputados socialistas se retiraram de um modo nunca esclarecido da votação no parlamento regional e se armou tal escândalo que foi preciso chamar novas eleições. E aí Esperancita conquistou seu sonho: ganhou por maioria absoluta e se transformou na dama de ferro que sempre sonhou ser.

Ela lutou desde essa trincheira nos últimos nove anos sendo reeleita por duas vezes mais com arrasadoras maiorias absolutas, a última em 2011. Seu principal adversário, mais que seus opositores socialistas e comunistas, sempre foi Alberto Ruíz Gallardón, o prefeito da cidade de Madri que expressa a ala mais centrista do Partido Popular e que sempre cruzou na frente de suas ambições para controlar o partido e chegar à presidência do PP, que quis retirar de Mariano Rajoy por mais de uma ocasião, mas que sempre lhe fugiu das mãos.

Suas posições extremistas tampouco a ajudaram a transcender como uma figura nacional para além de Madri. Seu apoio à educação privada e o desmonte que promoveu na saúde pública a transformaram em um emblema do liberalismo mais rançoso, assim como sua resistência às medidas mais progressistas do governo do socialista José Luís Rodríguez Zapatero contribuíram para forjar o mito de "Thatcher" com castanholas capaz de sapatear no tablado com fúria de condessa consorte que está na política para contribuir para que o mundo siga sendo igual ou mais injusto que antes, credenciais que raras vezes abrem as portas para um triunfo eleitoral.

No ano passado, seu corpo jogou-lhe uma mala pesada e um câncer de mama a obrigou a enfrentar a morte com a cara descoberta, um episódio do qual saiu-se bem mas que influiu muito em sua decisão de apresentar a renúncia na segunda-feira passada, dando por encerrada de forma abrupta uma carreira política meteórica e contundente. Ainda que alguns analistas acreditem que por trás de sua demissão haja mais que motivos pessoais.

Em meio à dura crise econômica que afeta o país e ante o vertiginoso desgaste do governo conservador de Mariano Rajoy, Aguirre tentou imprimir um pulso forte ao governo justamente no momento em que vários líderes conservadores regionais ameaçam com uma rebelião contra os permanentes ajustes e resgates impostos pelos bancos e pelas autoridades europeias.

Com apenas sessenta anos e após mais de trinta de carreira política, é evidente que Esperancita tinha tempo para seguir apostando no prêmio máximo. Mas por alguma razão que ainda se desconhece decidiu descer do cavalo. O tempo dirá se a decisão é definitiva ou se pretende esperar que diminua a tormenta. E alguém, então, talvez, venha bater à porta de sua casa para oferecer a possibilidade de subir ao trono maior, esse ao qual sempre aspirou sem disfarçar e ao qual nunca pode chegar por mérito próprio e interferência alheia: a presidência do governo da Espanha.


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