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180912 euro merkelUnião Europeia - Resistir - [Jacques Sapir] Uma possível dissolução da zona Euro, solução agora defendida por um número cada vez maior de economistas, coloca o problema das divisas de reserva que viriam a ser utilizadas quer pelos Bancos Centrais, quer por agentes privados.


O sistema monetário internacional passou duma situação de oligopólio, dominada pelo dólar, a uma situação de quase-duopólio, também ainda dominada pelo dólar, com a introdução do Euro. É esta situação que está em vias de se desmoronar. 

A introdução do Euro, em 1999, foi acompanhada inicialmente por uma acentuada subida do dólar nas reservas dos Bancos Centrais e pelo afundamento das "outras divisas". Esse afundamento deve-se essencialmente à queda do yen japonês e de outras divisas europeias que serviam de divisas de reserva (franco suíço, libra esterlina). Foram estas as divisas que mais sofreram com a introdução do Euro. 

Quadro 1 – Proporção das diversas divisas nas reservas de câmbios dos Bancos Centrais (%) 

Dólar americano
Euro
Marco alemão
Franco francês
Outras 
(incl. libra e yen)
1995 59,0 15,80 2,40 22,50
1996 62,1 14,70 1,80 21,10
1997 65,2 14,50 1,40 18,60
1998 69,3 13,80 1,60 15,00
1999 71,0 17,9 10,90
2000 70,5 18,8 10,50
2001 70,7 19,8 9,10
2002 66,5 24,2 8,80
2003 65,8 25,3 8,60
2004 66,0 24,9 9,00
2005 66,4 24,3 9,20
2006 65,7 25,2 8,90
2007 64,1 25,8 9,80
2008 64,1 26,4 9,90
2009 62,1 27,6 10,40
2010 61,8 26,0 12,10
2011 62,1 25,0 12,80

Fonte: FMI, Composição de Divisas das Reservas de Câmbio Estrangeiro Oficial, Washington DC, 2012

A situação criada pela instituição do Euro caracterizou-se portanto pela subida do poder desta última divisa e, ao mesmo tempo, pelo reforço do dólar. Foram as "outras divisas" que sofreram com a criação do Euro. Em 2007, na véspera da crise, a porção do dólar nas reservas dos Bancos Centrais ainda se mantinha em 65,7 %, enquanto era apenas de 59 % em 1995. A criação do Euro conduziu pois à criação de um duopólio assimétrico dólar-euro. 

A partir de 2007, na sequência da crise dos " subprimes ", a porção do dólar começou a baixar paulatinamente. Mas essa baixa pouco aproveitou ao Euro, até 2010. Na sequência da "revelação" da crise no seio da zona Euro pelo encadeamento da crise grega, e depois da irlandesa, e depois da portuguesa e, finalmente, da espanhola, o Euro, que tinha atingido uma porção de 27,6 % regrediu para 25 %. 

Com efeito, o aspecto mais interessante da evolução actual é que a queda do Euro a partir de 2010 não se faz tanto a favor do dólar, como seria natural esperar e talvez mesmo temer, mas a favor das "outras divisas". Mas, a composição desse grupo alterou-se radicalmente. 

Quadro 2 – Composição do grupo "outras moedas" (%) 

Libra esterlina (BP)
Yen japonês (JPY)
Franco suíço (CHF)
Outros
1999 2,9 6,4 0,2 1,6
2000 2,8 6,3 0,3 1,4
2001 2,7 5,2 0,3 1,2
2002 2,9 4,5 0,4 1,4
2003 2,6 4,1 0,2 1,9
2004 3,2 3,8 0,2 1,9
2005 3,6 3,7 0,1 1,9
2006 4,2 3,2 0,2 1,5
2007 4,7 2,9 0,2 1,8
2008 4,0 3,1 0,1 2,2
2009 4,3 2,9 0,1 3,1
2010 3,9 3,7 0,1 4,4
2011 3,9 3,7 0,1 5,1

Fonte: FMI, Composição de Divisas das Reservas de Câmbio Estrangeiro Oficial, Washington DC, 2012

A proporção da libra aumentou de 1999 até 2007, mas depois essa evolução parou e acabou mesmo por diminuir. A proporção do franco suíço manteve-se marginal e foi o yen quem mais enfraqueceu desde a criação do Euro. Pelo contrário, as "outras divisas", grupo que engloba essencialmente divisas da zona Ásia-Pacífico, aumentou muito acentuadamente desde a crise de 2007/2008. 

O fenómeno político a que se chama a emergência do grupo dos "BRIC", ou mesmo dos "BRICs" [1] tinha que ter uma tradução no seio das divisas de reserva. 

Não é porque a China se recusa a deixar que a sua divisa se torne totalmente convertível, o que impede a sua constituição como divisa de reserva, nem porque o rublo russo, apesar das importantes reservas de câmbio da Rússia, se mantém como possivelmente perigoso. De resto, os esforços do governo russo para promover o rublo como divisa de reserva são frustrados pela fraqueza da dívida pública russa, o que limita os instrumentos de entesouramento em rublos. A evolução faz-se pois, quanto ao essencial, em proveito das "outras divisas" e, dentro delas, das "novas divisas" (dólar australiano, dólar canadiano, dólar de Singapura). 

É assim claro que, no caso da dissolução da zona Euro, voltaremos rapidamente a uma situação de oligopólio. O medo na zona do Euro, que se manifesta agora nos operadores públicos [2] , só tem paralelo com o medo na zona do dólar. 

Convém pois fazer justiça a certas crenças que rodearam a criação do Euro. 

A – A criação do Euro enfraqueceu a posição do dólar? Isto é obviamente falso, pois que vimos acima que a porção do dólar aumentou fortemente com a criação do Euro. Quando essa porção diminuiu, manteve-se sempre muito superior, até 2007, ao seu valor de 1995. 

B – O enfraquecimento do Euro reverte a favor do dólar e da libra esterlina? Também isso é falso. O Euro enfraquece a partir de 2010, mas esse enfraquecimento é acompanhado por uma estagnação das porções do dólar e da libra. 

C – As mudanças na economia mundial repercutem-se nas divisas? Isso é verdade, mas mesmo assim muito lentamente. Vemos, a partir de 2010, um movimento de contestação do duopolo assimétrico, constituído pelo par dólar-euro, em proveito das "novas divisas", mas também, e isso é importante para os agentes privados, uma nova subida dos metais preciosos como vectores de entesouramento. 

D – O papel do Euro nas transacções comerciais mantém-se importante ? É verdade, por enquanto, mas tendo em conta os movimentos que se observam nas divisas de reservas, podemos pensar que isso traduz uma forma da "Lei de Gresham" [3] , ou seja, que a divisa em que se tem mais confiança é utilizada como reserva de valor, enquanto que a divisa em que se tem menos confiança é utilizada para as transacções. 

No caso de uma dissolução da zona Euro, e extrapolando a partir destes resultados, devemos pois esperar um retorno a uma situação de oligopólio no domínio das divisas de reservas. Se a parte do dólar americano poderá, sem dúvida, aumentar a curto prazo (6 a 12 meses), deverá estabilizar num espaço de 24 meses – no máximo – no seu nível actual e muito provavelmente voltar ao seu nível de 1995, ou mesmo abaixo, dados os problemas estruturais da economia americana. Quanto ao marco alemão, deverá voltar à sua posição de 1995 e mesmo melhorá-la e representar entre 16% a 18% das reservas. As "outras divisas" poderão atingir cerca de 18% a 20% das reservas de câmbio com uma forte subida das "novas divisas", e poderão representar até 11-13% do total.

[1] O "S" significa República da África do Sul. 
[2] LINGLING WEI, ANDREW BROWNE e ALMAR LATOUR, "China CIC Chief Sees Rising Risk of Euro Breakup", The Wall Street Journal, 7/Junho/2012. 
[3] Nome do economista britânico que constatou que "a moeda má afasta a boa da circulação". 

[*] Economista francês. Ensina na EHESS-Paris e na Faculdade de economia de Moscovo (MSE-MGU). Especialista dos problemas da transição na Rússia, é também um especialista dos problemas financeiros e comerciais internacionais. É autor de numerosos livros, sendo o mais recenteLa Démondialisation (Paris, Le Seuil, 2011). 

O original encontra-se em http://fr.rian.ru/tribune/20120825/195752559.html . Tradução de Margarida Ferreira. 


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