A campanha do UKIP se centrou nos fantasmas que aparecem quando há sérios problemas econômicos: a invasão de estrangeiros e a perda da identidade nacional. O UKIP não se cansou de proclamar aos quatro ventos que, com a atual relação de pertencimento com a União Europeia, cerca de 27 milhões de pessoas iriam invadir as ilhas para se aproveitar da generosa cobertura social e medida britânica.
Estas cifras se baseiam no fato de que, no dia 1º de janeiro de 2014, Romênia e Bulgária se converterão em membros plenos da União Europeia, com completa liberdade de deslocamento para seus cidadãos. Somente depois da campanha, o líder partidário Nigel Farage reconheceu que as duas nações não se mudariam em sua totalidade e que – segundo as projeções partidárias baseadas no que ocorreu quando a Polônia ingressou na UE – a invasão seria de aproximadamente 400 mil pessoas. O esclarecimento já não importava mais. Insulares e amedrontados pela mais forte queda no nível de vida das últimas três décadas, muitos britânicos já tinham votado no UKIP.
No contexto da crise atual – duas recessões desde 2010, estagnação e expectativas nulas para este ano -, a eleição de 2.300 conselheiros em 34 municípios, a maioria no Sul (excetuando Londres) e na zona central da Inglaterra, era considerada como um termômetro da atualidade política. O trabalhismo conseguiu 29% dos votos, os conservadores 25%, o UKIP 23% e os liberal democratas 14%. Em um país dividido em um norte trabalhista e um sul conservador, salvo pela capital, o líder trabalhista Ed Miliband destacou as vitórias obtidas em Hastings e outras zonas municipais do sul como prova de que pode triunfar nas eleições gerais.
Os conservadores previam uma forte derrota, mas temiam um limite: a perda de 300 conselheiros. O fantasma apareceu com sobras: perderam mais de 320. O primeiro ministro David Cameron indicou que compreendia a frustração dos eleitores: “Entendo as razões pelas quais pessoas que nos apoiavam não nos apoiam agora. Vamos tomar as medidas necessárias para recuperar esse apoio”, disse Cameron.
A estratégia dos conservadores para lidar com o fenômeno UKIP é um endurecimento da política imigratória e europeia. No discurso à rainha da próxima semana, os conservadores apresentarão um anova lei migratória com fortes limitações para o acesso dos estrangeiros à saúde, à moradia e aos serviços sociais. Em um movimento que deixará de cabelo em pé seus parceiros europeus, Downing Street (sede do governo britânico) sugeriu que o primeiro ministro não se oporia a que um parlamentar conservador apresente um projeto de lei para a realização de um referendo, em 2017, sobre a permanência do Reino Unido na União Europeia.
Nos dias que antecederam as eleições, os conservadores qualificaram os integrantes do UKIP como “palhaços, lunáticos e loucos”. O líder do partido Nigel Farrage respondeu assim a esses epítetos: “Nos chamaram de tudo. O mesmo establishment que arruinou o país. Agora terão que se acostumar ao fato de que somos uma presença permanente na paisagem política”, afirmou ele, posicionando-se como o “outsider”.
A agenda partidária do UKIP tem todos os tópicos da direita dura. O partido independentista propõe um “divórcio amigável” com a União Europeia, adotando tratados especiais como os que Noruega ou Suíça, um congelamento imigratório, uma taxa de imposto única para toda a sociedade sem que importe o nível de renda, duplicação do número de prisões e o aumento dos gastos com defesa.
A pergunta é até onde toda esta agenda influirá não só entre os conservadores, mas também junto aos trabalhistas. Dadas as peculiaridades do sistema eleitoral britânico, que não é proporcional – o parlamento não reflete a quantidade de votos de cada partido, mas sim a quantidade de distritos eleitorais que ganha partido conquista -, os trabalhistas precisam fincar um pé no Sul para ganhar uma maioria em nível nacional.
Nas últimas semanas, adotaram uma agenda mais dura em questões imigratórias e se prevê que apoiarão com apenas algumas objeções o projeto da nova lei imigratória: a posição do trabalhismo sobre esse tema entre 1997 e 2010 é apontada como um fator de sua derrota nas últimas eleições. Como em outros países europeus, os ventos da crise estão preparando o caminho para uma agenda de direita.
Tradução: Marco Aurélio Weissheimer