Assessores de Mursi disseram que o decreto iria acelerar uma transição prolongada que tem sido dificultada por obstáculos jurídicos, mas rivais de Mursi foram rápidos em condená-lo como um novo faraó autocrático que queria impor sua visão islâmica no Egito.
"Mursi, um ditador 'temporário'", foi a manchete do jornal independente Al-Masry Al-Youm e centenas de manifestantes na Praça Tahrir, o coração da revolta anti-Mubarak de 2011, exigiam a saída de Mursi, acusando-o de lançar um "golpe de Estado".
Estimulado pelos elogios de todo o mundo por mediar uma trégua entre o Hamas e Israel, Mursi ordenou na quinta-feira (22) que uma assembléia dominada por islâmicos escrevendo a nova Constituição não pudesse ser dissolvida por contestações legais.
Mursi, um islamista cujas raízes estão no grupo Irmandade Muçulmana, também deu a si mesmo amplos poderes que lhe permitiram demitir o procurador-geral impopular e abrir a porta para um novo julgamento para Mubarak e seus assessores.
O decreto do presidente teve como objetivo acabar com o impasse e empurrar o Egito, a nação mais populosa do mundo árabe, mais rapidamente em seu caminho democrático, disse o porta-voz presidencial Ali Yasser à Reuters.
O presidente disse que qualquer decreto que ele emitisse não poderia ser contestado, uma decisão que consolida seus poderes, mas deve polarizar ainda mais o Egito, ameaçando mais turbulência em uma nação no coração da Primavera Árabe.
'Outro ditador'
O decreto deve preocupar aliados ocidentais, particularmente os Estados Unidos, um aliado generoso do exército do Egito, que elogiou efusivamente a nação por seu papel em conduzir israelenses e palestinos a um cessar-fogo na quarta-feira.
O Ocidente pode se preocupar com medidas que, por exemplo, comprometem a independência judicial. Mas um diplomata ocidental disse que era muito cedo para julgar e sua nação iria ver como o decreto seria exercido nos próximos dias.
"Estamos muito preocupados com as possíveis ramificações enormes desta declaração sobre os direitos humanos e o Estado de Direito no Egito", afirmou Rupert Colville, porta-voz da Comissária de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas, Navi Pillay, no escritório da ONU em Genebra.
"O decreto é basicamente um golpe em instituições estatais e ao Estado de Direito, que provavelmente deve prejudicar a revolução e a transição para a democracia", declarou Mervat Ahmed, um ativista independente em Tahrir protestando contra o decreto. "Eu me preocupo que Mursi será outro ditador como o anterior a ele."
Protesto
Manifestantes irritados com o decreto de Mursi invadiram a sede do partido da Irmandade Muçulmana em Alexandria hoje, jogando para fora livros e cadeiras, e ateando fogo neles na rua, contou uma testemunha. Perto de uma grande mesquita na segunda cidade do Egito, partidários e opositores de Mursi atiraram pedras uns nos outros. Dois carros nas proximidades tiveram os vidros quebrados conforme os confrontos se afastavam da área.
União europeia
A União Europeia pediu hoje a Mursi que respeite o processo democrático no país. "É de extrema importância que o processo democrático seja concluído de acordo com os compromissos assumidos pela liderança egípcia", disse um porta-voz da chefe de Relações Exteriores da UE, Catherine Ashton, em um comunicado.
Estes compromissos incluem "a separação de poderes, a independência da Justiça, a proteção das liberdades fundamentais e a realização de eleições parlamentares democráticas o mais cedo possível", acrescentou Ashton.
Assessores de Mursi disseram que a decisão, que também deu ao presidente novos poderes que lhe permitiram despedir o procurador-geral da era Mubarak e nomear um novo, pretendia acelerar a transição do país, que tem sido dificultada por obstáculos jurídicos.
Mas a declaração levantou temores entre egípcios de pensamento secular de que a Irmandade Muçulmana, onde Mursi tem as suas raízes, e os aliados do grupo visam dominar o novo Egito.