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40934342 cb6ee17c18 z 0Escócia - Esquerda - [James Foley e Pete Ramand] Alguns chamam-lhe a ciência sinistra. Mas, entre todas as controvérsias sobre o referendo, a economia provoca as emoções mais violentas.


Os media, juntamente com os lideres da campanha do NÃO, enquadraram o problema da segurança económica da Escócia em torno da credibilidade pessoal de Alex Salmond, e a tática deu resultados. Pessoas geralmente sensatas confessam que até votariam SIM, se não fosse considerarem que ter como timoneiro o “Wee Fat ‘Eck” [alcunha de Alex Salmond] seria um risco grande demais. Quem quer comprometer o seu futuro para ele [Salmond] se poder pavonear como não-coroado Rei da Escócia?

Esta estratégia resulta a dois níveis. Primeiro, Salmond, antes visto como o  mais forte trunfo do movimento do SIM, representa agora um verdadeiro embaraço. Mesmo tendo-se afastado dos olhos do público, Better Together descreve-o como arrogante e imprudente, jogando com a prosperidade da Escócia ao sabor dos seus interesses.

Em segundo lugar, a classe política escocesa tornou-se míope em relação à sua situação económica presente. Exige-se a Salmond que descreva, a um pormenor quase ridículo, como a futura economia escocesa e os compromissos internacionais poderão funcionar. No entanto, ninguém do Labour, dos Tories ou dos Liberais-Democratas sofre qualquer pressão para garantir a segurança da economia escocesa. Numa era de potenciais abandonos da UE, a subida do UKIP e a estagnação da economia britânica, isto resume-se a uma complacência surpreendente dos nossos inteletuais públicos.

Os riscos da permanência no Reino Unido são fáceis de antever. As instituições financeiras britânicas não aprenderam nada com a crise de 2008, e provavelmente vão desregular ainda mais quando a oportunidade chegar, enquanto todos os partidos em Westminster estão comprometidos com a austeridade pelas próximas décadas. A menos que o decorrer dos acontecimentos sofra uma reviravolta, os britânicos acabarão a próxima era mais pobres, muito mais tristes e muito mais isolados dos seus vizinhos.

Entre a era Thatcher e 2012, o Reino Unido transferiu mais rendimento para os ricos do que qualquer outra nação desenvolvida. Uma pequena elite conseguiu fortunas, enquanto a verdadeira classe média britânica estagnou. Quando o preço do metro quadrado disparou e as dívidas se multiplicaram, os pensionistas britânicos os mais pobres do grupo UE 27; prejudicando as crianças que ficaram numa situação de miséria semelhante à descrita por Dickens; e as restrições de combustível foram as piores da Europa chegando a níveis abaixo dos da Estónia. E a brecha na riqueza da Grã-Bretanha alargou-se até duas vezes o tamanho das dos seus piores rivais na UE. Apesar dos intermináveis discursos moralizantes de Westminster sobre as famílias, o Reino Unido foi considerado o terceiro pior país da Europa para criar uma família.

A partir de 2008, o crescimento britânico caiu abaixo das economias do G7, excepto da Itália, e os seus salários passaram a ser os mais baixos de todos. Tendo perdido todas as hipóteses de reformar a ordem moral londrina da era-gueto de Gordon, o nível de vida dos britânicos caiu de tal forma, que excedeu a queda do do Japão durante a sua desgraçada ‘década-perdida’. E Osborne e companhia, com a austeridade reforçaram a volatilidade existente, enquanto elevavam a exploração para níveis vitorianos.
Se os britânicos continuarem com o presente curso das coisas, correm numa direcção assustadora. Podem vir a ultrapassar países como Singapura, Portugal e os Estados Unidos tornando-se a mais desigual das sociedades desenvolvidas, exemplo de indecência e miséria. Os sintomas já são visíveis. A Organização Mundial de Saúde afirma que a pobreza infantil é uma “opção política” deliberada feita pelos partidos de Westminster. Um em dez trabalhadores estão em situação de emprego precário, e a crise normalizou os contratos “zero-hour”*.  As “bedroom taxes”**sugerem para o futuro uma profunda e irracional crueldade, embora isso simbolize meramente a economia do Reino Unido e o nosso sistema de partidos políticos não ofereça outra alternativa.

Para enfrentar o século XXI, os britânicos precisam de profundas transformações. No centro das transformações planetárias, como as mudanças climáticas, o Reino Unido ficou atrás dos seus rivais, em termos morais e competitivos. Somos o terceiro pior país da Europa no que se refere a energias renováveis, dedicando apenas 1% do PIB a políticas verdes, menos do que a equipamentos e publicidade, e três vezes menos do que com as forças armadas. A investigação sobre energias limpas é dez vezes mais alta no Japão e na Finlândia. Enquanto isto, a Grã-Bretanha está mal adaptada ao surgimento das economias BRIC, exportando mais para a república irlandesa, com uma população abaixo dos 5 milhões, do que para o Brasil, Rússia, India e China todos juntos. Além disso, uma em cada dez empresas britânicas tem a ver com indústria de armamento. Os partidos de Westminster não conseguem proceder às reformas necessárias porque estão ligados ao neo-liberalismo dos Estados Unidos, militar e financeiramente hegemónicos.

O principal argumento do Better Together, de que as maiores economias são mais resistentes e flexíveis, ainda está por escrutinar. As pequenas economias do Norte, geograficamente semelhantes à Escócia, mantiveram as suas moedas independentes, mais estáveis do que a libra esterlina. E é fora de dúvida que todas as economias regionais comparáveis têm níveis de vida melhores ou iguais aos do Reino Unido, e muito menos desigualdades. A Escócia pode aspirar, pelo menos, a replicar estes modelos. Mas, com o capitalismo propenso a crises recorrentes e a crescentes desigualdades, como novo estado europeu devemos ter como objetivo algo melhor, mais sustentável, capaz de modificar o decurso dos próximos cem anos. Para isto, temos de planificar a nossa economia de forma a ir ao encontro das necessidades sociais e ambientais, sem desperdiçar recursos na anarquia dos mercados.

Contrariamente ao mito popular, a Escócia não é ‘dependente de subsídios’. Desde os anos 1970, gere um excedente fiscal de 100 mil milhões de libras, enquanto o resto do Reino Unido vive com um largo défice. Claro que os voláteis lucros do petróleo têm um papel significativo nestas contas. Mas, tal como o petróleo tem limites físicos, também o polo financeiro de Londres tem limites sociais, e o Reino Unido precisa de uma transição dolorosa do instável capitalismo rentista, com que nenhum partido deseja confrontar-se. A Escócia tem os recursos físicos para liderar a nova revolução energética, com um quarto do vento da Europa e do potencial das marés, e um décimo do seu potencial das ondas. Mas precisamos de vontade social e política, aliada às infraestruturas económicas, para tornar isto viável. Independência é uma pré-condição para estas longamente esperadas mudanças sociais.

Até agora, o debate sobre economia escocesa tem sido paroquial e pessoal. Desafiamos os partidos do Better Together a expor os seus pontos de vista para acabar com a dependência dos britânicos do setor financeiro, dos negócios de armas e das indústrias poluidoras, e criar uma economia sustentável. A instabilidade da independência é menor comparada com os riscos de ficar na dependência de um iminente referendo sobre a UE, dos bancos em ‘rédea solta’, e da adesão às inevitáveis e já iniciadas invasões dos Estados Unidos. Comparar isto com a Escócia, com dois partidos centristas na liderança, aspirando a um futuro ao estilo nórdico. O que não é uma utopia. Mas temos de ter em vista o estabelecer de precedentes; não nos prender à inevitabilidade do esmagamento da Grã-Bretanha de Cameron.

* Contratos de trabalho em que o patrão não oferece horas mínimas e o empregado tem de estar disponível para ser chamado, sendo pago à tarefa.

** Imposto sobre os quartos desocupados.

James Foley e Pete Ramand integram a Radical Independence Campaign. Publicado originalmente em The London Economic, a 06/02/2014. Traduzido por Isabel Gentil.


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