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TuzlaBósnia e Herzegovina - Brasil de Fato - [Achille Lollo] Desta vez, a "grande" mídia europeia não conseguiu censurar a revolta popular que assombrou as principais cidades da Federação Bósnia-Herzegovina; enfim, uma revolta que faz cair a máscara que a Otan, a União Europeia e, sobretudo, os Estados Unidos tinham colocado nesse "protetorado".


Foto: Protesto em Tuzla.

A agência oficial italiana (Ansa) resumiu em apenas 18 linhas uma revolta popular que mobilizou cerca de 300 mil manifestantes enfurecidos pela falta de trabalho e por não ter dinheiro para comprar alimentos essenciais, como pão e leite. Uma revolta que se iniciou, no último dia 5, no antigo centro industrial de Tuzla, no norte do país, onde os operários de cinco grandes indústrias (móveis, sabão, sabão em pó, estruturas para escritórios e metalurgia) foram demitidos sumariamente em virtude desses grupos industriais terem declarado bancarrota, depois de uma falaciosa privatização, cujos únicos beneficiários foram os novos oligarcas do "protetorado" bósnio.

De fato, em 14 de dezembro de 1995, após a conclusão da guerra entre as três etnias (croatas, bósnios e sérvio-bósnios), as privatizações foram impostas pelos Estados Unidos e subscritas no Acordo de Dayton, com o objetivo de criar uma formidável economia de mercado na recém- criada Federação Bósnia- Erzegovina, para premiar os bósnios e croatas, respectivamente, 43,7% e 17,3% da população.

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É necessário lembrar que para obter uma paz duradoura o presidente Clinton determinou que os bósnios e os croatas ocupassem os territórios que haviam sido "libertados" durante a guerra, enquanto os sérvios-bósnios (31,8%) deviam permanecer apenas no território da República Srpska, que eles haviam proclamado em 1992. Por isso, todas as formas de governo deviam ser tripartite e cada etnia ter sua específica autonomia política e territorial.

O Parlamento da União Europeia legitimou o travesso Acordo de Dayton, cuja assinatura final foi dada em Paris. Por isso os banqueiros da Alemanha e da França receberam do Banco Central Europeu a autorização para financiar todos os programas de privatização propostos pela nova classe dirigente croata-bósnia e bósnia, mesmo sabendo que, assim, estavam entregando a "Federacija Bosne i Hercegovine (FBiH)" ao nepotismo dos novos oligarcas, cujo único objetivo era o rápido enriquecimento. Um processo que ficou sem controle, sobretudo quando o governo da Alemanha garantiu a cobertura financeira da emissão da nova moeda que, como aconteceu na Croácia, se chamou "marco-bósnio" com valor paritário ao marco da Alemanha e, portanto, da União Europeia.

Revolta no protetorado

A Otan mantém na Federacija (FBiH) 70 mil soldados para garantir a paz e controlar severamente os sérvios-bósnios, confinados nos territórios da Srpska e praticamente mantidos à beira do fluxo de capitais que a União Europeia depositou em Sarajevo, nos caixas do governo da Federação Bósnia-Herzegovina.

Na Federacija (FBiH), todas as fases das privatizações, bem como as atividades econômicas e administrativas do governo central e das prefeituras, são monitoradas por funcionários da UE e por inúmeras ONGs, cujos dirigentes são suntuosamente pagos com contratos assinados com os ministérios da Cooperação de França, Alemanha, Bélgica, Itália e Suécia.

Praticamente, à Federacija (FBiH) foram dadas as melhores oportunidades para se tornar um modelo de "Estado com economia liberal", com o objetivo de se esquecer de todas as manipulações que a Otan, os EUA e os países da União Europeia fizeram para transformar a Bósnia no trampolim do projeto de fragmentação da Federação Socialista Iugoslava. Pois, é imperativo lembrar que sem a dramática guerra na Bósnia, o presidente Clinton e seus aliados europeus não podiam legitimar "a guerra humanitária contra a Iugoslávia para salvar a minoria muçulmana no Kossovo".

Na realidade, depois da guerra todas as promessas de progresso e os projetos de desenvolvimento foram sabiamente utilizados para criar na Bósnia-Herzegovina uma sociedade viciada e vítima do nepotismo bósnio-muçulmano e croata-bósnio que entregou o país aos "oligarcas". Uma elite voraz e oportunista que ao longo dos últimos 20 anos provocou um desastre do ponto de vista político e, sobretudo, econômico e financeiro.

De fato, os oligarcas e seus protetores europeus e estadunidenses conseguiram "in extremis" impedir que a Federacija (FBiH) declarasse bancarrota, em 2013, quando explodiu a "bebolucija" (protesto em favor dos direitos dos recém-nascidos), juntamente às reivindicações dos estudantes à causa do corte das bolsas de estudo.

Um movimento de protesto de extrema importância que mostrou aos habitantes da Federacija (FBiH) que a classe política havia praticamente levado o "protetorado europeu" à beira da falência. Por isso, a única forma para acabar com o embasamento dos oligarcas passava pelo abandono dos condicionalismos do nacionalismo e do racismo étnico para finalmente reencontrar a solidariedade dos trabalhadores, dos estudantes e do povo em geral.

Foi então em Tuzla – onde o desemprego havia atingido 44,5% – que os protestos dos operários desempregados, no dia 6, se transformaram em revolta popular com os manifestantes que atacaram e incendiaram o prédio da prefeitura.

Logo, em Banja Luka, capital da República sérvio-bósnia Srpska, jovens e trabalhadores organizaram manifestações pacíficas para se solidarizar com os trabalhadores de Tuzla e lançar a palavra de ordem: "Revolução contra os oligarcas, revolução contra a corrupção, revolução para ter trabalho, pão e direitos".

Palavras que inviabilizaram os apelos à calma proferidos pelas múmias do poder, Bakir Izetbegoviv, oligarca bósnio-muçulmano, "dono" da presidência tripartite, e Valentin Inkzo, Alto Representante da Comunidade Internacional para a transição. Assim e sem nenhuma organização, mas recorrendo apenas à rede, as palavras de ordem que haviam sido lançadas em Tuzla e Banja Luka se espalharam pelo pais acendendo a revolta em Mostar, Kakanj, Br´cko, Sanski Most, Prijedor, Gra´canica, Biha´c, Zavidovi´ci e em outras 33 pequenas cidades, para depois atingir em cheio a capital Sarajevo, onde os confrontos com a polícia foram extremamente duros, tanto que entre os 200 feridos hospitalizados, 144 são policiais.

Na capital Sarajevo, onde os manifestantes exigiam a demissão do primeiro ministro Nermin Niksic, a revolta durou praticamente três dias e parou somente no domingo quando os manifestantes conseguiram romper o cerco da polícia e atear fogo no palácio do governo e no prédio residencial do presidente bósnio- muçulmano, Bakir Izetbegoviv, que, infelizmente se alastrou até o Arquivo Central, destruindo a ala reservada aos documentos e mapas históricos da época do Império Austro-húngaro.

Yankee Go Home?

Se em Tuzla, Banja Luka e Mostar a palavra de ordem era "Revolução", em Sarajevo os manifestantes não se cansavam de gritar a histórica frase "Yankees Go Home". O motivo disso tudo tem a ver com a política dos EUA de não querer deixar a Bósnia-Herzegovina inteiramente nas mãos da União Europeia. De fato, as "excelências" da Casa Branca encarregadas de salvaguardar o poder e a influência do Império nos Bálcãs, desde a assinatura dos Acordos de Dayton, denunciam a perigosa penetração da Alemanha nessa região, em função de suas ligações culturais, étnicas e sobretudo financeiras e econômicas.

Por isso, os EUA exigiram que o Alto Comissário da Comunidade Internacional para a transição na Bósnia fosse Valentim Inkzo, um funcionário austríaco notoriamente ligado aos EUA e monitorado por um vice, Frederick Moore, estadunidense apoiado incondicionalmente pelo representante da Grã-Bretanha no comando local da Forças de Implementação da Paz da Otan.

O ódio dos manifestantes para com os EUA, os soldados da Otan e, sobretudo, a repulsa ao Alto Representante Valentim Inkzo deve-se, antes de tudo, a gestão gestão falimentar que os EUA planejaram nesse "protetorado", conseguindo destruir a economia e alcançando o recorde europeu no desemprego com uma taxa que chega a 33,2%, dos quais 66% é formado por jovens.

As falsas privatizações, as consequentes falências e a destruição da agricultura praticamente acabaram com a economia do país, privilegiando poucos setores da sociedade que vivem em função dos "custos da ocupação militar" ou administrando o fluxo das importações. Para a maioria dos trabalhadores – há quase 12 meses sem salários e sem seguro desemprego –, não há alternativas a não ser passar fome ou tentar a sorte com a emigração. A desarticulação da economia é tão elevada e tão absurda que, por exemplo, um abacaxi importado da Costa Rica – mas pago com o financiamento dos fundos da União Europeia – custa menos do que uma vulgar maçã produzida no interior da Bósnia.

Mas a revolta estava no ar. De fato, em dezembro os representantes dos cinco países da União Europeia que deveriam monitorar a transição da Bósnia, nomeadamente França, Alemanha, Bélgica, Suécia e Itália, assinaram um documento chamado "No Paper" criticando duramente o Alto representante, Valentim Inkzo, e seu vice, o estadunidense Frederick Moore, pelo fato de terem provocado a falência econômica do país e por impedir ou atrasar ainda mais a adesão da Bósnia-Herzegovina à União Europeia.

Uma adesão que não pode acontecer com o país cheio de dívidas e uma economia praticamente inexistente e a um passo da bancarrota. Apesar disso tudo, na Casa Branca ninguém está preocupado com o futuro da Bósnia-Herzegovina, visto que até quando a crise econômica e social alimenta a instabilidade nesse "protetorado", os soldados da Otan são obrigados a permanecer. Um pormenor que inviabiliza o processo de adesão à União Europeia e é isso que aos EUA interessa mais. Algo que faz lembrar o que disse a embaixadora dos EUA na Conferência de Genebra 2: "Dane-se a União Europeia..".


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