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010813 coreiadonorteCoreia do Norte - Vermelho - [Haroldo Lima] Deixo a Coreia do Norte depois da grande festa nacional que comemorou os 60 anos da vitória na Guerra da Coreia, após o que foi fundada a República Democrática Popular da Coreia. Daqui mesmo, deste avião da Air Koryo, que acaba de decolar, escrevo essas linhas.


Acostumado a transitar por metrópoles capitalistas, brasileiras e de outras nacionalidades, registro, de saída, talvez a impressão que mais me marcou: em Pyongyang, que é a capital do país, com seus 3,3 milhões de habitantes; nas cidades interioranas por onde passei; e na área agrícola que conheci, desse país de 22 milhões de habitantes, não vi uma só favela, um só casebre, um só mendigo, ninguém em frangalhos perambulando pelas ruas e nelas morando. 

A espécie de gente desvalida, que traz estampada, em rostos esquálidos, a dor permanente, de penúria infindável, e que compõe, copiosa, a paisagem social das cidades do capital, essa espécie de gente, na Coreia do Norte, foi extinta. Aqui não há miséria, tampouco luxo, diferenças sim, mas a vida floresce a partir de um patamar de dignidade que a todos alcança.

Nas margens das estradas por onde passei, observando o longo desdobrar do arrozal e da milharada com suas folhas delgadas dançando à brisa da manhã, dei-me conta de outro ser extinto, a cerca, essa figura inexorável em rincões ocidentais, sentinela avançada e impiedosa da divisão, da separação e do impedimento.

O clima era de festa, pois foi para uma festa que fui, representando o Partido Comunista do Brasil, convidado pelo Partido do Trabalho da Coréia. Era o 60º aniversário da vitória dos coreanos do norte na Guerra da Coreia, que se deu em 27 de julho de 1953. O fato, que impacta até hoje a mente dos coreanos e infla, a um nível bastante elevado, o orgulho nacional, teve, na verdade, significado universal: foi a primeira vez que o mais poderoso Exército do mundo – o dos Estados Unidos – sofreu uma derrota militar fragorosa, em campo de batalha. Outra derrota tão humilhante ele só iria sofrer vinte anos depois, na mesma Ásia, no Vietnã. 

Mas o preço pago em baixas pelo Exército norte-americano na derrota na Coreia foi maior do que na capitulação frente ao Vietnã. As forças armadas populares vitoriosas nas Guerras da Coreia e do Vietnã escreveram páginas de raro brilho na história universal das guerras.

Vitórias tão espetaculares assim instituem quadro político novo, suscitam projetos originais, consolidam destacamentos partidários avançados e revelam heróis. Em 1973, o quadro político novo que surgiu foi representado pelo aparecimento do Vietnã unificado, lançando seu projeto de mais um tigre asiático, dessa vez, socialista, temperando, mais ainda, o Partido Comunista do Vietnã, revelando líderes do porte dos comunistas Ho Cho Minh e do general Giap. 

Em 1953, a novidade foi a consolidação da República Democrática Popular da Coreia, com seu projeto socialista de desenvolvimento, sua força dirigente testada, o Partido do Trabalho da Coreia, e um líder que se notabilizou como extraordinário general e condutor de massas, o comunista Kim Il-Sung.

Mas, os norte-americanos derrotados formularam também um projeto político próprio, o projeto dos derrotados: manter o vencedor sob pressão, retirar-lhe as condições de crescimento, minar sua resistência pela ameaça constante, calúnias e provocações e, com o apoio da parcela nacional derrotada, manter a Pátria dividida entre Norte e Sul.

Agora bem, a evolução natural das coisas traz necessidades novas, irrecusáveis, e a Coreia do Norte, que tem um parque industrial de porte médio, uma população crescente, que já lançou mísseis balísticos e cujo Exército tem o maior contingente de tropas do mundo, procurou desenvolver, com recursos próprios, a tecnologia do átomo, para ter acesso à fonte energética passível de ser conseguida, para quem não tem, por exemplo, reserva petrolífera. Tamanha audácia os Estados Unidos não aceitariam.

O plano norte-coreano de acesso à tecnologia nuclear para fins pacíficos foi usado pelos norte-americanos como mais uma razão para aumentar as pressões e sanções sobre a Coreia. A justificativa chegava à insolência, pois quem se arvora a ajuizar o suposto risco que a paz no mundo estaria correndo com esses planos da Coreia do Norte, é justamente o país que detém o maior arsenal de armas atômicas do mundo, ele, os Estados Unidos, o único até hoje a lançar duas dessas armas sobre população civil, matando centenas de milhares de cidadãos!

Foi criado então o impasse imobilizador, tão ao gosto dos Estados Unidos. Por seu turno a Coreia, aceitando negociar até com os norte-americanos, reiteram sua disposição de buscar o uso pacífico de energia nuclear, admitindo supervisão internacional.

Depois da morte de Kim Il-Sung, em 1994, o Partido do Trabalho da Coreia, dirigido pelos comunistas que o sucederam – Kim Jong-Il, também já falecido, e Kim Jong-Unm, o atual secretário geral – não alterou sua posição de defesa da soberania da Nação para tomar as medidas necessárias. 

A truculência e a arrogância norte-americanas, tudo fazendo para impedir a expansão econômica da Coreia do Norte, não conseguem seus objetivos, mas causam danos enormes. 

Os serviços públicos são depauperados e grandes projetos adiados. A própria prioridade nacional para o fortalecimento e modernização das Forças Armadas, vital para a defesa e sobrevivência nacional, se por um lado é justa no contexto dramático da situação vigente, por outro lado, enfraquece a disponibilidade orçamentária para investimentos cruciais. 

Não fosse assim, serviços públicos poderiam estar mais bem aparelhados, o aparato industrial mais desenvolvido. Até uma modernização arquitetônica de áreas das cidades já poderia ter havido. Em que pese em Pyongyang proliferarem edificações públicas modernas e arrojadas e hotéis vistosos, como um prestes a ser inaugurado com 105 andares, veem-se, pelos bairros, conjuntos habitacionais antigos, de traços pesados, talvez de influência soviética. Também a lavoura padece de mecanização e os transportes urbanos, embora com bom uso dos ônibus elétricos, tem frota que precisa ser remodelada. 

O heroico povo continua vibrante e destemido. Exibe, nos festejos do 60º aniversário da vitória na Guerra, desfiles monumentais, da população civil, em evoluções que encantam pela beleza plástica, ritmo, alegria e tamanho; e do Exército, que impressiona pela proporção avantajada, disciplina e sincronismo absolutos, e material bélico exibido, em quantidade e qualidade, onde não faltaram numerosas carretas transportando mísseis. 

Mas as sanções internacionais, articuladas pelos Estados Unidos, cobram preço elevado. O próprio intercâmbio cultural e tecnológico diminuído com outros povos e Governos, priva a sociedade coreana de recursos que lhe poderiam estar sendo úteis na construção nacional, na sua vida cotidiana, e até na incorporação de formas dinamizadoras da economia socialista.

Para terminar, lembremos que os Estados Unidos tem uma longa história de agressão e guerra. Nos últimos decênios, acostumaram-se a dar tratamento torpe a quem ousa discordar de seus desígnios. Começam por tratá-lo como “eixo do mal”, divulgam mentiras, fazem provocações, inventam e alardeiam riscos que a paz mundial estaria correndo se o país na berlinda não for contido. 

O bombardeio vem depois, a ocupação, o assassinato de líderes, o confisco de riquezas e o abandono posterior, do país destruído, sangrando, indefinidamente, ao relento... Assim fez os Estados Unidos no Iraque, na Líbia e está fazendo no Afeganistão. 

Governantes norte-americanos vez por outra dão a entender que, “perdendo a paciência”, assim procederiam na Coreia do Norte e também no Irã. Será bom que o Império vá “devagar com o andor” e que perceba que, pelo menos nesses dois casos, “o buraco é mais embaixo”! 

* Haroldo Lima é membro do Comitê Central e da Comissão Política Nacional do PCdoB 


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