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doadesobergalizaGaliza - Diário Liberdade - [Joam Evans] Desta vez a cousa vai de leis. E isso faz com que deva pedir desculpas por duplicado: pola chatice de insistir mais uma vez sobre as consequências da inação na defesa da paróquia neste momento crucial e por fazê-lo em chave jurídica. Agradece-se a compreensão e paciência de quem continue com a leitura.


Há apenas um par de semanas tornou-se pública a versão do Anteprojeto de Lei de Racionalização e Sustentabilidade da Administração Local que o Partido Popular irá levar ao Congresso. Este Anteprojeto vem modificar uma lei anterior, a de Bases do Regime Local, que regulava o quadro jurídico da administração local.

A modificação proposta para um dos artigos, relativo às entidades de âmbito territorial inferior ao município (as paróquias na Galiza e nas Astúrias, as "juntas vizinhais" no Bérzio, os "concejos" em Euskal Herria, ...), traz uma mudança radical frente a redação de 1985: "las entidades de ámbito territorial inferior al Municipio [...] carecerán de personalidad jurídica".

Isto contravem diretamente os Estatutos de Autonomia da Galiza (Art. 27.2 e 40.3) e das Astúrias (Art.º 6.2.), que reconhecem explicitamente a personalidade jurídica das paróquias. No caso das Astúrias, o reconhecimento concretizou-se numa Lei de Paróquias (Lei 11/1986, de 20 de novembro), certamente cativa, mas melhor do que nada, enquanto na Galiza o Parlamento fugiu dessa responsabilidade legislativa como do demo. Em qualquer caso, a modificação que pretende aprovar Madrid apresenta-se como claramente inconstitucional ou, para ser mais claros, potencialmente inconstitucional.

Quem pode interpor um recurso de inconstitucionalidade de se aprovar finalmente o Anteprojeto na sua redação atual são os Governos da Galiza e das Astúrias ou as suas assembleias legislativas, devendo cursar-se dentro dos três seguintes à publicação da Lei. De não se fazer, as previsões estatutárias relativas ao reconhecimento jurídico da paróquia ficariam em papel molhado. E de continuar o silêncio cúmplice dos 10 últimos meses, as que ocupam as cadeiras das nossas magníficas instituições políticas não poderão eludir a sua responsabilidade nem jogar a carta do vitimismo botando-lhe a culpa a Madrid ou ao PP.

E é que, em termos jurídicos, o atual projeto de aniquilação legal da paróquia pode resumir-se em três conceitos: "procedimento sumaríssimo", "indefensão" e "morte civil". A morte civil consiste na perda da personalidade jurídica e a consequente privação de direitos. Retirando a possibilidade de dotar a paróquia de personalidade jurídica, esta deixa de considerar-se viva a efeitos legais. Trata-se de dispensar o "tiro de graça" que alguns levam lustros desejando, incomodados polo perigo latente que a capacidade de auto-organização política e jurídica da paróquia supõe para os políticos profissionais e as suas instituições. A desaparição forçada, crime de lesa humanidade quando aplicado a pessoas físicas, neste Estado vira anedota quando se trata de pessoas jurídicas, sejam molestas instituições milenares, partidos políticos inconvenientes ou meios de comunicação censuráveis.

A indefensão também carateriza processualmente esta crónica da morte paroquial anunciada. A paróquia, que é necessariamente parte no processo que procura a sua execução política, não tem nenhum meio para levar para a frente a sua defesa. Mesmo que os Estatutos de Autonomia da Galiza e Astúrias reconheçam a sua personalidade jurídica, apenas os governos ou as suas senhorias políticas profissionais podem decidir iniciar o procedimento de recurso de inconstitucionalidade. E ainda que em agosto de 2012 se lhes pediu um pronunciamento ao respeito, até hoje não abriram a boca. Deste jeito, as nossas paróquias, instituições políticas potenciais (e também as do Eu-Návia e além, que mesmo tendo já personalidade jurídica de seu nada teriam a dizer sobre a sua supressão), ver-se-ão despojadas do direito de existirem, simplesmente pola inação das suas senhorias e mesmo sendo a indefensão uma violação dos direitos fundamentais segundo a constituição (Art. 24.1.) do seu famoso "Estado de derecho".

O mais engraçado desta crónica fúnebre é que, de não mudar subitamente o critério de interpretação do Tribunal Constitucional, o processo estaria ganhado (polas paróquias) praticamente de antemão. Ironias da história, o governo de Albor, estando o PSOE de Felipe González em Madrid na altura em que se aprovou a Lei de Bases do Regime Local (a que agora se quer modificar), interpôs recurso de inconstitucionalidade contra o mesmo Art. 45 da discórdia, que regula as entidades de âmbito territorial inferior ao município, pois entendia que colocava em causa a competência estatutária da Junta para legislar sobre o funcionamento das paróquias. Neste aspecto, a sentença do TC estabeleceu que parte das previsões daquele Art. 45 careciam do caráter de norma básica e não resultavam de direta aplicação no âmbito da Comunidade Autónoma da Galiza. Resultou que nem os governos de Albor, nem os Fraga nem nenhum dos que o sucederam levaram à prática as consequências desta vitória jurídica (legislar à vontade sobre a paróquia), mas de continuar com o seu silêncio cúmplice, a esquela das nossas paróquias deixará em mal lugar os ilustres moradores do atual Hórreo Auto-anêmico.

Finalmente, e por não demorar mais esta chata exposição, não poderia faltar o epíteto sumaríssimo ao procedimento que pretende dar cabo ao futuro político das paróquias. No procedimento sumaríssimo as partes do processo acumulam-se num só ato e momento no que se procede à instrução, julgamento, condena e execução da sentença do réu, que carece de qualquer garantia ou possibilidade de recurso e que pode estar de corpo presente ou em rebeldia. Neste caso, o tribunal de exceção será o Congresso dos Deputados, onde o acordo já garantido de PP e PSOE em relação à supresão das entidades de âmbito territorial inferior ao município fará com que o silêncio anunciado dos Governos e Parlamentos da Galiza e Astúrias os torne em conivente público expectante da aplicação da pena capital em praça pública.

Frente o totalitarismo parlamentar, à paróquia resta-lhe apenas a via da rebeldia. Poderão dissolver as entidades locais menores das paróquias de Arcos da Condessa, Bembrive, Berã, Camposancos, Chenlo, Morgadães, Paços de Reis, Queimadelos e Vila-Sobroso. Poderão dissolver a Paróquia Rural do Gio, em Eilão, deixando sem possibilidade de se constituírem as restantes paróquias eunaviegas. Poderão dissolver centos de juntas vizinhais no Bérzio, embargando as suas contas e expropriando os seus bens. Poderão impor a sua pena de morte civil por lei orgânica, mas as nossas paróquias continuarão vivas, "eternas" como sentenciou Otero Pedraio. Não se esqueça: "A paróquia rural é uma das mais pujantes caraterísticas da nossa Terra e de jeito nenhum se deve prescindir da sua existência" (Sempre em Galiza, 1950).

Foto: Ramón Piñeiro / Wikipedia - Licença CC 2.0. Pároquia de Doade, em Sober (Terra de Lemos, Galiza)


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