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131022 mulherBrasil - FSD - Atualmente, há muitas páginas feministas em português no Facebook, e elas em sua maioria se preocupam em contemplar também as lutas contra o racismo, a homofobia, a transfobia e, mais recentemente o capacitismo, isto é, o preconceito contra pessoas com deficiências físicas. Porém, apenas uma minoria faz um feminismo classista, com enfoque na luta da mulher trabalhadora.


É importante ressaltar que o feminismo que não tem uma perspectiva de combater o capitalismo é limitado em muitos aspectos e, além de não dar conta de resolver o problema da opressão à mulher branca, cis e heterossexual, deixa ainda mais a desejar quando se trata de lutar pelas mulheres trans, negras, lésbicas, bissexuais. Ou, ainda, as pertencentes a outras minorias que geralmente não são sequer mencionadas nesses espaços feministas online – as mulheres indígenas, as minorias religiosas como mulheres islâmicas e judias, as mulheres ciganas, entre outras. É também um feminismo centrado nas mulheres dos grandes centros urbanos, que não incorpora as mulheres camponesas às suas preocupações.

Isso acontece porque o resultado de ser discriminada por ser mulher e também por outros motivos não se limita a simplesmente fazer com que a mulher ouça piadas a mais, receba comentários negativos sobre a sua aparência a mais, entre outros sintomas mais superficiais. O racismo, a homofobia, a xenofobia, a intolerância religiosa, etc são fatores que empurram as mulheres para mais embaixo na escala econômica da sociedade, e as mulheres pobres encaram problemas que vão muito para além de terem seus cabelos criticados ou ouvirem piadas discriminatórias.

As mulheres da classe trabalhadora são de longe as mais vulneráveis a caírem nas redes do tráfico para prostituição – seja ela arbitrada pela mulher ou mesmo escrava, em situação tal que a mulher se encontra presa e vigiada, e é sistematicamente estuprada sem receber por isso. As mulheres trabalhadoras são também as mais vulneráveis a irem presas, e a situação das mulheres encarceradas no Brasil é dramática, pois somos um país com uma tradição fraca em termos de direitos humanos, no qual uma parte ampla da população defende que apenas o que consideram “humanos direitos” deveriam ter seus “direitos humanos” respeitados.

As mulheres trabalhadoras são as maiores vítimas do assédio (moral e sexual) no trabalho, uma vez que elas mais frequentemente têm que se submeter a trabalhos insalubres (física e moralmente) para conseguirem seu sustento. São elas também as que mais sofrem com a falta de creches públicas, pois não havendo possibilidade de pagar creches particulares muitas são obrigadas a parar de trabalhar ou, ainda, a deixar seus filhos com crianças pouco mais velhas. Muitas jovens de periferia ou nos meios rurais perderam suas adolescências e até infâncias sendo, na prática, mães de seus próprios irmãos.

As mulheres da classe trabalhadora são as que mais frequentemente não têm condições de divórcio de maridos violentos, sendo muitas vezes obrigadas a permanecerem em relações destrutivas por não conseguirem nenhuma outra forma de obter renda. São justamente os homens mais pobres, e com menor escolaridade, os que menos contribuem para os serviço doméstico, e é com eles que as mulheres trabalhadoras estão casadas.

Quem são as mulheres negras, as mulheres lésbicas, as mulheres trans que o movimento feminista no Facebook tanto julga defender? São, majoritariamente, mulheres pobres: são as terceirizadas, as desempregadas, as part-times, as informais. E elas são pobres em boa medida justamente por acumularem duas opressões ou mais.

Fazendo um levantamento estatístico que analisa sobre o quê as páginas feministas estão publicando, e sobre o que os blogs feministas estão escrevendo, fica claro que só há dois casos em que as mulheres que compõe ao mesmo tempo também outras minorias estão sendo contempladas: na questão do aborto e na questão estética. Tirando o fato de o movimento feminista no Facebook reconhecer que as mulheres que morrem abortando são mais frequentemente as pobres e que a mídia não contempla a beleza das mulheres negras (que são também a maior parte da pobreza deste país), de um modo geral as demandas específicas das mulheres trabalhadoras não são contempladas.

Podemos notar isso ao observarmos que apenas muito, mas muito raramente se publica sobre: prostituição, mulheres presas, assédio sexual, acesso a creches, entre outras demandas que são mais requisitadas pelas mulheres negras, trans, lésbicas, etc. Quando há publicações a esse respeito, a repercussão é quase nenhuma ou mesmo nenhuma.

Não basta publicar uma vez por mês sobre como os cabelos afro são lindos e uma vez por mês quando uma mulher trans consegue uma vitória em termos de aquisição de direitos, só que num país estrangeiro, como a Argentina ou o Canadá. E, ainda, uma publicação por ano no dia da visibilidade lésbica. Fazer feminismo interseccional de fato é muito mais do que isso.

Interseccional de fato é reconhecer que as mulheres negras é que são as que têm maior taxa de natalidade, menor taxa de renda e maior chance de ficar sem creche e ter a carreira interrompida por isso. As que mais frequentemente são assassinadas por parceiros violentos, porque não têm outra fonte de renda. Elas não são só a maioria de quem morre nos abortos, são a maioria das assassinadas, das vítimas de violência doméstica, da violência estatal que é a falta de creches, as maiores vítimas do desemprego e do subemprego.

Interseccional de fato é divulgar como mulheres lésbicas podem se prevenir de DSTs, publicar sobre violência doméstica entre lésbicas, sobre a discriminação que mulheres lésbicas tipo “bofinho” sofrem no mercado de trabalho, ficando relegadas a guetos de trabalho precário como o telemarketing.

Fazer feminismo interseccional não é só ficar comovida toda vez que perdemos mais uma mulher trans para o suicídio ou para o assassinato misógino, e esperar as trans morrerem para falar delas só postumamente, ou falar das trans estrangeiras que fazem sucesso entre outras coisas por se encaixarem impecavelmente no padrão de beleza branca e consumista. Isso é mais que insuficiente, mais que medíocre. Interseccional de fato é colocar o dedo em feridas nas quais ninguém quer mexer: a prostituição como única fonte de renda, a falta de acesso a cirurgias e hormonização no SUS, os poderosos responsáveis pelas leis burocráticas que temos com relação a troca de nome e sexo na documentação oficial do Estado.

Enquanto o feminismo online faz repercutir amplamente desavenças por causa de uso de O no lugar de X ou @, mulheres trans são vítimas de estupro estrutural, sistemático e institucionalizado.

Se não atentarmos para o antagonismo de classes, que é o fundamento e a estrutura de toda forma de opressão, ficaremos atacando sintomas da opressão. Indícios superestruturais de um problema muito mais profundo, para o qual a única saída é a construção de uma sociedade socialista.

É possível reconhecer uma feminista interseccional quando se percebe que o projeto de sociedade dela não se limita a alargar os horizontes do que é considerado bonito ou feio numa sociedade de consumo, mas sim a erradicar esse sistema. Quando ela não luta apenas por uso correto de pronomes, mas por encarceiramento de consumidores de prostituição e criminalização dos mesmos. Quando ela, enfim, reconhece que ser vítima de machismo e mais alguma discriminação não se limita à soma simples de uma opressão mais a outra. As opressões interagem entre si, quando atingem uma mesma pessoa, empurrando as mulheres vítimas para uma marginalidade antes de mais nada econômica e que condiciona todo o resto.

Toda a cobrança por feminismo interseccional que não reivindica o fundamento da opressão estar na luta de classes é vazia e inútil.


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