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mercado-venezuelaVenezuela - Opera Mundi - [Lamia Oualalou] Para Mark Weisbrot, presidente venezuelano deve estabilizar taxa de câmbio e reduzir inflação para fazer país crescer.


Durante a administração de Hugo Chávez e nesses meses de governo de Nicolás Maduro, a análise – principalmente estrangeira – da economia da Venezuela sempre esteve pontuada pela palavra "colapso". No entanto, se os primeiros quatro anos de Chávez foram marcados pela instabilidade econômica, consequência direta do golpe de Estado de abril de 2002, na década seguinte a Venezuela viveu uma vigorosa recuperação, com uma sensível melhora dos índices sociais, como do analfabetismo e pobreza extrema.

Agora, quando o país vive um delicado momento, com a morte do presidente venezuelano e a eleição de Maduro, as profecias mais pessimistas voltaram a tomar conta da imprensa internacional, cuja atuação pode ser definida como uma "verdadeira farsa", na opinião do economista norte-americano Mark Weisbrot. Co-diretor do Center for Economic and Policy Research, em Washington e também presidente do Just Foreign Policy, Weisbrot foi um dos palestrantes do debate sobre o Venezuela Pós-Chávez, promovido no Rio de Janeiro [Brasil] pelo Centro Internacional Celso Furtado de Políticas Públicas com o apoio da revista Carta Capital, na última terça-feira, 30 de abril.

Em entrevista a Opera Mundi, Weisbrot comentou as recentes medidas econômicas aplicadas por Maduro e os problemas da inflação e escassez de produtos, cujos efeitos, segundo ele, foram sentidos nas urnas. Para Weisbrot, o novo presidente deve ter como prioridade o crescimento da Venezuela. "Até os empresários opositores não vão embora se percebem que podem ganhar muito dinheiro investindo no país", afirma.

OM : Os protestos contra a vitória de Maduro na eleição presidencial da Venezuela podem provocar uma instabilidade política e econômica?

MW: Não, a tensão já está diminuindo. É verdade que a imprensa internacional continua a dizer que se trata de uma vitória duvidosa, apesar de todos os países vizinhos e de a Europa terem reconhecido o resultado. Somente os Estados Unidos persistem com a postura de não reconhecer. Internamente, acho que o governo venezuelano já está se organizando.

OM: Problemas econômicos, como a alta inflação e a escassez de alguns produtos, tiveram efeito na diminuição dos votos para o candidato chavista?

MW: Sim, até porque a inflação parecia estável até pelo menos agosto do ano passado, mas voltou a disparar no segundo semestre de 2012. Além disso, a desvalorização da moeda, no começo do ano, não ajudou. Isso tem a ver com a administração do sistema de câmbio: naquele momento, houve uma restrição dos dólares destinado a financiar as importações, o que incentivou os atores econômicos a trocar no mercado paralelo, fazendo com que esse câmbio disparasse e, consequentemente, a inflação também. Mas não se trata de um desequilíbrio profundo da economia, algo que tornaria o colapso econômico inevitável, como acontece em alguns países europeus.

OM: A recuperação da economia venezuelana é sustentável?

MW: Sim. Na ultima década, a Venezuela viveu somente dois episódios de recessão: na tentativa da oposição de derrubar Chávez em 2002 e em 2008, a crise mundial. No tempo entre essas duas crises houve um crescimento muito acelerado, a pobreza foi reduzida pela metade, e a miséria, em 70%, isso falando de critérios de renda, sem incluir os benefícios de um acesso maior à educação e à saúde. Na recessão de 2008, porém, o governo cometeu um erro. Ficou preocupado com o déficit das contas correntes e desistiu de fazer uma política contracíclica, de evitar a crise, o que teria ajudado a economia a se recuperar.

Desde meados de 2010 a economia vem se recuperando, o que levou a um crescimento de 5,6% no último ano. Apesar do que muitos economistas falam, não há risco de desequilíbrio das finanças públicas. Se olharmos o critério clássico de relação entre dívida pública e PIB (Produto Interno Bruto), chegamos a 62%, o que é ainda bom. Mas com a estrutura econômica da Venezuela, seria mais interessante distinguir a dívida externa da interna, e comparar o peso dos juros às receitas de exportação em dólares. Em 2012, a porcentagem chegava a 4,3% para a dívida externa, e 1,1% para a interna, embora esta última esteja crescendo vertiginosamente. Até incluindo a dívida da empresa petrolífera nacional PDVSA, cujos juros representam 3,1% das receitas de exportação, não há preocupação.

OM: A Venezuela contraiu um empréstimo importante com a China. Isso não contribui para a dependência e a fragilidade das finanças públicas?

MW: É verdade, mas ele já esta sendo reembolsado. Aliás, isso, do ponto de vista geopolítico, é positivo. A China não vai permitir que o governo venezuelano entre em colapso, nem que as maiores reservas de petróleo do mundo voltem a estar controladas pelos EUA. Eu acredito que a China tem agora um compromisso com a Venezuela, e até gostaria que fosse ainda maior.

OM: O senhor vê com preocupação a evasão de capitais?

MW: É um problema sim, compartilhado também pela Argentina. Conforme as pessoas perdem a confiança na moeda, mais ela é trocada por dólares, que por sua vez são retirados do país, pressionando ainda mais a desvalorização e fazendo com que as reservas se esgotem. Esse fenômeno é incentivado pela imprensa e pela oposição e pode ter o efeito de uma "profecia". Se mídia e oposição conseguem convencer a população de que a moeda não vale realmente nada, elas ajudam o processo a se desenrolar. Rumores de falência podem causar uma corrida aos depósitos. O principal, portanto, é insistir no crescimento, robusto. Até os empresários opositores não vão embora se percebem que podem ganhar muito dinheiro investindo no país. Isso é o que aconteceu durante a última década.

OM: O que o governo pode fazer para consolidar o crescimento e o emprego?

MW: Ano passado eles incentivaram a economia por meio da construção civil, importando recursos da China. Agora, seria importante usar mais mão de obra e recursos internos, além de incentivar a produção local. É preciso reconhecer que, durante os mandatos do presidente Chávez, a Venezuela não fez muito progresso na diversificação da economia e ainda depende exclusivamente do petróleo. Os números apontam que esse cenário piorou, mas não é verdade. Se o peso do petróleo na produção aumentou, tem a ver com o preço dele, que disparou. Mas, ainda assim, o quadro não melhorou. Hoje, 23% da economia venezuelana depende de importações, o que é bastante alto, especialmente se consideramos bens de consumo e os alimentos.

OM: Qual deve ser a principal prioridade do governo de Maduro?

MW: Ele tem que fugir das tentações liberais para equilibrar a economia. Sem isso pode existir uma recessão. Além de manter o crescimento, ele tem que estabilizar a taxa de câmbio e reduzir a inflação. Combinar crescimento e inflação controlada é possível, o próprio governo demonstrou isso até o final de 2012. Chávez conseguiu dinamizar a economia sem deixar a inflação e a escassez de produtos sair do controle. Até a desvalorização de 2010 foi bem absorvida pela economia, enquanto os críticos asseguravam que ia provocar uma explosão da inflação, o que não aconteceu.

OM: Mas quais são as ferramentas ao alcance do governo?

MW: São várias. Algumas soluções passam pelo controle de capitais, por exemplo, que é bastante fácil no caso da Venezuela, já que 96% das exportações são de petróleo e transitam pelo governo. Outra opção é escolher a hora de autorizar dólares para as importações, para evitar a escassez, mal vista pela população e que pode até frear alguns setores da economia. Talvez fosse interessante aumentar os juros, impedindo a fuga de capitais.

OM: Por que o governo não conseguiu ainda implementar todas essas políticas?

MW: Porque tem um problema real de capacidade administrativa. Algo não é exclusivo da Venezuela, mas realidade também em outros governos de esquerda latino-americanos, como Equador e Bolívia. Agora uma nova equipe está no comando, com chances de renovação, de melhorar a capacidade administrativa. Nesse contexto, a economia da Venezuela tem tudo para crescer por muitos anos, afastando os problemas de inflação alta e da escassez.

Imagem: Corredor de supermercado de Caracas. Maioria dos alimentos consumida pelos venezuelanos vem de outros países.


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