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dois graUSLe Monde Diplomatique - [Eric Klinenberg] Desde a Conferência de Copenhague, em 2009, a Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima tenta limitar o aquecimento do planeta a 2 °C. Esse objetivo orientará as negociações de Paris em torno da redução das emissões de gases do efeito estufa. Mas a modificação do clima já pode ter tido consequências.


Limitar o aquecimento global a 2 °C em relação ao período pré-industrial: essa ideia se apoia nos trabalhos do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), que estuda diversos cenários e suas consequências. Evocado desde o final dos anos 1990, esse objetivo começou a ser discutido na Convenção das Nações Unidas em 2000. Parecia capaz de impedir danos graves ou irreversíveis em escala global. Todas as partes adotaram a cifra recomendada, da qual também tem conhecimento o grande público.

O último relatório do IPCC, publicado em 2014, avalia em 0,85 °C o aumento das temperaturas desde 1880 – aproximação razoável da época pré-industrial. Isso quer dizer que já atingimos um patamar não negligenciável do aquecimento admissível. A maior parte das regiões do globo foi afetada. Na agricultura, por exemplo, observam-se quedas de rendimento para o milho e o trigo; e, ao contrário, aumento da produção em certas regiões de latitude elevada e maior índice de mortalidade de árvores em outras.

A tendência atual de nossas emissões de gases do efeito estufa aponta para uma elevação de pelo menos 4 °C até o fim deste século. Segundo um prognóstico amplamente aceito, se esse cenário se concretizar, nosso mundo virará de cabeça para baixo. A segurança alimentar estará comprometida, pois a agricultura dificilmente se adaptará, não importam os novos progressos técnicos que possam surgir. A acentuada elevação do nível dos oceanos e o agravamento dos riscos naturais tornarão bem difíceis nossas condições de vida.

Detenhamo-nos, porém, na hipótese de um mundo cujo clima só seria aquecido em 2 °C. O último relatório do IPCC permite descrever suas principais características. O equilíbrio entre as regiões se reconfiguraria, pois as consequências da mudança não seriam homogêneas no espaço. Sem dúvida, poderíamos aguardar efeitos positivos, principalmente para a agricultura dos países nórdicos; mas o balanço global, infelizmente, seria negativo. Inúmeras repercussões, graças a esforços de adaptação, talvez permanecessem moderadas; outras, no entanto, se revelariam francamente preocupantes.

Algumas regiões, como a bacia mediterrânica, sofreriam bastante por causa da diminuição dos recursos hídricos. Durante a transição para o novo clima, a rapidez da mudança ultrapassaria a capacidade de evolução de certas espécies. As árvores, ou mesmo algumas plantas herbáceas, não conseguiriam acompanhar o ritmo. Os ecossistemas já ameaçados atualmente sofreriam prejuízos irreversíveis, como o gelo do Ártico, os recifes de coral tropicais, as plantas e as geleiras das montanhas altas. O agravamento da variedade climática e, portanto, extremos de todos os tipos (secas, chuvas fortes, inundações) suscitariam inúmeras dificuldades. Mesmo com uma elevação limitada a 45 centímetros, o mar invadiria as zonas costeiras baixas.

Dependentes de técnicas duvidosas

O IPCC julga possível estabilizar o clima nesse nível, sob determinadas condições. Seria necessário, para tanto, reduzir drasticamente nossas emissões de gases do efeito estufa a curto prazo, de modo a termos uma sociedade neutra em carbono por volta de 2050, antes de chegarmos a emissões globalmente negativas no fim do século. Chegar a emissões negativas implica recorrer a processos que consumam mais do que liberem carbono atmosférico: reflorestamento, geração de eletricidade proveniente de biomassa com sequestro de carbono etc. A maior parte das soluções exige técnicas que ainda não existem ou ainda não foram utilizadas em grande escala. Ou seja: adotar medidas de redução das emissões torna a humanidade fortemente dependente de técnicas que ainda vão ser desenvolvidas – uma aposta arriscada.

Os dados do problema se complicam ainda mais quando levamos em conta as incertezas associadas a determinados fenômenos, como o derretimento total da calota de gelo da Groenlândia, exemplo emblemático dos riscos a que está sujeito o clima. Segundo o IPCC, “um aquecimento contínuo, superior a certo patamar acima dos níveis pré-industriais, provocaria o desaparecimento quase completo da calota da Groenlândia em um milênio”. Ora, não sabemos com precisão qual é esse patamar. Ele se situa provavelmente entre 1 °C e 2 °C – e esse processo irreversível faria os oceanos subir em média 7 metros!

Considerando os riscos nada negligenciáveis que o cenário de “mais 2 °C” implica, alguns Estados insulares pequenos, por exemplo, sugerem limitar o aquecimento a 1,5 °C. Os cientistas ainda não avaliaram esse objetivo, mas os elementos conhecidos permitem calcular que as regiões polares, as zonas costeiras baixas e as montanhas altas seriam bem menos afetadas. A segurança alimentar ficaria globalmente garantida, sobretudo na África. Compreende-se que os países mais ameaçados queiram conter o aquecimento nesse nível; mas semelhante solução exigiria um esforço bem maior de limitação das emissões, geraria custos enormes a curto prazo e acentuaria nossa dependência de técnicas por inventar ou aperfeiçoar. Um problema crucial desafia os cientistas: o da existência de efeitos de limiar irreversíveis entre 1,5 °C e 2 °C.

A “comunidade internacional” terá de tomar decisões rapidamente, levando em conta essas incertezas. Não obstante, o patamar de 2 °C parece hoje mais um limite a respeitar do que um objetivo a atingir. Melhor mesmo seria nem sequer chegar perto dele...

Ilustração: Retuers.


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