Foto: Justin Norman (CC BY-NC-ND 2.0)
A tragédia da morte de mais de cem pessoas e toda a cultura do medo difundida acriticamente pelos meios de comunicação alinhados aos interesses das grandes potências levarão à poderosas operações “antiterroristas”, com iminentes prejuízos aos povos.
O aumento exponencial da repressão do Estado contra os cidadãos é uma das primeiras consequências disso. A Europa toda está em alerta. França e Bélgica declararam estado de emergência. Casas e apartamentos vasculhados sem autorização dos proprietários estão ocorrendo desde o dia seguinte aos ataques. O Exército e todas as forças de segurança estão na rua, enquanto os cidadãos não podem se reunir.
Mas o pior ainda está por vir: tal como ocorreu após o 11 de setembro de 2001, haverá violações aos direitos humanos. População vigiada, prisões arbitrárias, torturas e assassinatos perpetrados pelo Estado em nome da “segurança nacional”, da “liberdade” e da “democracia”.
“Certamente haverá violações de direitos humanos, com a seguinte justificativa: você é tão criminoso que não tem direito a ser bem tratado”, afirma Miguel Machado, professor de Direitos Humanos e co-autor do livro “Direitos Humanos e Cidadania”.
Segundo ele, está sendo implantada, desde as reações ao 11 de Setembro, a teoria conhecida como Direito Penal do Inimigo, ou Direito Penal de Terceira Velocidade, desenvolvida pelo jurista alemão Günther Jakobs. Ela se baseia na punição sem julgamento adequado, penas e processos arbitrários e leis severamente repressivas.
A CIA (Agência Central de Inteligência dos EUA) foi responsável pela implementação da tortura generalizada após os ataques terroristas contra o World Trade Center. Em Guantánamo e outras prisões ao redor do mundo, os acusados de terem ligações com redes terroristas foram brutalmente torturados e mortos.
Sessões de tortura por mais de 100 horas seguidas privados do sono, pancadas e líquidos quentes no pênis durante os interrogatórios, “alimentação via retal”, afogamento simulado e torturas psicológicas foram praticadas contra os presos – suspeitos de terrorismo, sem provas concretas de envolvimento.
Tudo isso comandado pelo Estados Unidos com o aval de mais de meia centena de países. Métodos que violam a dignidade e os direitos humanos, pelas vítimas terem cometido supostos crimes.
“Isso foi implantado na prisão de Guantánamo pelos Estados Unidos e irá se fortalecer com o que nós estamos vendo dos atentados na França”, diz Machado. Isso também pode abrir caminho para a perseguição política, de supostos “terroristas”. “Certamente haverá pré-julgamentos”, alerta.
Outro ponto que já está sendo impulsionado é o preconceito e a discriminação dos muçulmanos. A intensa propaganda estadunidense contra o Islã já vinha surtindo efeitos devastadores nos EUA e na Europa. Agora, com a nova edição da campanha contra o “terrorismo”, os muçulmanos que vivem no Brasil também começam a ser associados com homens-bomba, tanto pela extrema-direita tradicionalmente preconceituosa como pela ignorância do senso comum.
Recentemente, o deputado federal Jair Bolsonaro, representante da direita fascista que defende os crimes cometidos pela ditadura militar-empresarial até hoje, declarou que os imigrantes sírios, por exemplo, são a “escória do mundo”. Também defendeu que os refugiados, além dos imigrantes bolivianos e haitianos, fossem reprimidos e assassinados pelo Exército.
De acordo com o presidente da Comissão do Direito dos Refugiados, do Asilado e da Proteção Internacional da OAB-SP, Manuel Furriela, tem aumentado a violência e perseguição aos refugiados, principalmente baseada na islamofobia – o preconceito contra os muçulmanos.
“Com certeza os ataques terroristas, ao serem ligados a pessoas de certas nacionalidades, principalmente de países árabes, ou de certa religião, aumentam a xenofobia e a perseguição a grupos daquela região ou ligados a países árabes”, conta.
Em Curitiba, duas mulheres muçulmanas denunciaram terem sofrido sérias agressões, vítimas do preconceito propagado pela incessante desinformação dos meios de comunicação a respeito do Oriente Médio, com claras finalidades políticas imperialistas. Segundo as denúncias, Luciana Schmidt Velloso recebeu uma pedrada na perna e Paula Zahra sofreu uma cusparada, agressões precedidas de ofensas com caráter islamofóbico, em 20 de novembro.
No âmbito internacional, os imigrantes e refugiados árabes e muçulmanos sofrem esse tipo de discriminação há anos, graças à cultura do medo do “terrorismo islâmico” iniciada com a “Guerra ao Terror” nos EUA. Na Europa, as recentes imigrações de refugiados, principalmente sírios, abriram mais uma brecha para a violência da extrema-direita, como foi o caso da cinegrafista de uma televisão húngara que agrediu um homem na fronteira com a Sérvia.
Nas primárias do Partido Republicano para eleger o candidato à presidência dos EUA no ano que vem, o ultradireitista Donald Trump afirmou que, se for eleito presidente do país, vai deportar todos os refugiados sírios de volta para o Oriente Médio. Além disso, a Câmara dos Representantes (dominada pelos republicanos) aprovou no dia 17 de novembro um projeto que permite a investigação da vida dos refugiados sírios e iraquianos que queiram entrar nos EUA. O projeto vai para o Senado, mas o presidente Barack Obama deve vetá-lo.