As enigmáticas paisagens oníricas do italiano Giorgio de Chirico, que tanto inspiraram os surrealistas franceses, estão agora expostas no Museu de Arte de São Paulo. As obras pertencem todas à Fondazione Giorgio e Isa de Chirico, sediada em Roma, a mais importante instituição detentora dos trabalhos do artista.
A mostra itinerante já foi exposta em Porto Alegre e, encerrando a temporada em São Paulo, seguirá para Belo Horizonte.
A exposição apresenta 45 pinturas, 11 esculturas e 66 fotografias do artista italiano, produzidas no final de sua vida, ao longo das décadas de 1960 e 70. Essa fase final, chamada por ele neometafísica, representou um retorno de De Chirico à inspiração que caracterizou o período mais importante de sua produção no início do século XX.
São trabalhos muito singulares, que se caracterizam pela repetição, em incontáveis variações, de um determinado tema. O sentido de tal produção "minimalista" era evocar uma determinada atmosfera subjetiva, que perseguiu, inspirou e assombrou De Chirico ao longo de toda a vida.
Nas pinturas do artista, alguns elementos são bastante recorrentes, como a arquitetura, a escultura clássica, o manequim, o por do sol, a imobilidade, elementos através dos quais De Chirico explorava estados emocionais como o silêncio ou a solidão. A recusa em retratar a realidade exterior visível, contraposta por uma busca pela expressão de estados subjetivos insólitos, constituía a base da técnica que o artista chamaria de pintura metafísica, ou seja, uma pintura abstrata em seu conteúdo.
A fase metafísica da obra de De Chirico desenvolveu-se até 1917, depois disso, ele retrocedeu para técnicas mais convencionais. A pintura metafísica constituiu o período mais importante de sua atividade, e foi ela precisamente que provocou uma profunda admiração em poetas e pintores como André Breton, Paul Éluard, Benjamin Péret ou Max Ernst, os futuros fundadores do grupo surrealista. Mas a pintura de Giorgio de Chirico não era apenas apreciada por eles, mais do que isso, foi uma das grandes inspirações do surrealismo, uma obra que apresentava exatamente os elementos misteriosos e fantásticos que constituíam os estímulos fundamentais à imaginação que tanto perseguiam os surrealistas.
Nesse sentido, a pintura de De Chirico coloca-se como uma precursora isolada do surrealismo, antecipando técnicas e conceitos que se tornariam uma das grandes correntes da pintura moderna, e daí o seu grande valor.
A exposição De Chirico, o sentimento da arquitetura, permanecerá em cartaz no MASP até o dia 20 de maio.
Breve retrato do artista
Giorgio de Chirico nasceu em 1888, na Grécia. Na adolescência ele estudou no Japão e na Alemanha, até se estabelecer no Haiti, onde travou amizade com o poeta Guillaume Apollinaire. Morando na Itália, a partir de 1910 ele desenvolve obras totalmente marginais ao movimento futurista, em um estilo sui generis, caracterizado por seus temas desvinculados da realidade exterior. Foi apenas em 1917 que o pintor, junto ao ex-futurista Carlo Carrá, funda a pintura metafísica. De Chirico desenvolveria esse estilo até o início da década de 1920, quando, para o espanto de todos, ele passa a pintar em um estilo acadêmico, fase que tomaria os 30 anos seguintes da vida de sua vida. É apenas na década de 1960 que o artista abandona esse caminho e volta-se para uma pintura muito similar à que produziu entre 1910 e 20, pintura a que chamou de neometafísica.