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Atilio Borón

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Um ano sem Chávez

Atilio Borón - Publicado: Sábado, 08 Março 2014 15:07

A direita, articulada como nunca em escala mundial por obra e graça do fenomenal poder midiático estadunidense, acreditava que com a morte do líder bolivariano, o chavismo acabaria.


Em sua vulgaridade intelectual seus partidários reciprocamente se consolavam quanto suas derrotas latino-americanas, dizendo que "morto o cachorro se acaba a raiva". Porém, até agora a história tem sido mesquinha com seus anseios. A "raiva" dos povos não é um fenômeno passageiro, mas a consequência da iniquidade, desigualdade e opressão que o capitalismo segrega incessantemente nestas terras como em qualquer outro lugar. Só que em Nossa América a raiva uniu-se com uma bicentenária tradição político-intelectual emancipacionista, antioligárquica e anti-imperialista que não está ausente por completo em outras partes do chamado costumeiramente de Terceiro Mundo, mas que se apresenta firme num punhado de países, sem dúvida, sem a força e longevidade evidenciadas na América Latina e no Caribe. Tradição que se personifica nas figuras gigantescas de Bolívar e Martí, em ambos extremos do século dezenove e que continua com uma longa lista – que não podemos reproduzir aqui –, que arrancando com Simón Rodríguez, Miranda, San Martín, Artigas, Bilbao, Hostos, Betances e tantos outros, passaria tempos depois por Mariátegui e Mella até chegar a Bosch, Che e Fidel. Desse feliz encontro entre a "raiva" e uma venerável tradição política brotaram os ventos emancipacionistas que percorrem nossa geografia desde começos do século, impulsionados por essa verdadeira força desatada da natureza que foi Hugo Chávez.

Ventos que diminuíram sua intensidade, mas que continuam soprando. Por isso Nicolás Maduro venceu as eleições presidenciais de 14 de abril de 2013 por 1,5% do voto popular, ainda que Barack Obama insista em sua necessidade de desconhecer sua vitória. É preciso lembrar ao ocupante da Casa Branca que nas eleições presidenciais de seu próprio país, em 1960, John F. Kennedy ganhou por uma diferença de 0,1%: 49,7 versus 49,6 de Richard Nixon. E nas eleições de 2000, George W. Bush ganhou com 47,9% de Al Gore, que obteve 48,4. Porém, o irmão de Bush, John Ellis (a) "Jeb", então governador do estado da Flórida, traçou uma escandalosa artimanha jurídica que permitiu George W. vencesse no estado (onde havia sido derrotado por Gore) e, assim, levasse os votos eleitorais da Flórida, com o qual conseguiu a maioria no colégio eleitoral que o consagrou presidente.

A derrota de 14 de abril mergulhou a direita venezuelana numa grande decepção. Encorajada pelo silêncio da Casa Branca, decidiu desconhecer o resultado das urnas, denunciar uma suposta fraude eleitoral e lançar, através de Henrique Capriles, um intenso motim (antes: o golpe de abril de 2002, depois a greve petroleira). Essa tentativa criminosa produziu uma dezena de vítimas fatais e enormes danos materiais. Ante a inconsistência das denúncias de fraude, depois que extensas auditorias certificaram a honestidade das eleições, os Estados Unidos e seus parceiros locais lançaram uma campanha de desestabilização econômica: desabastecimentos programados, sincronizados e acúmulo de artigos de primeira necessidade; corrida contra o Bolívar e desenfreio especulativo dos preços foram os três pontos da sabotagem econômica, tal como recomenda Eugene Sharp em seus manuais para o "golpe suave". Prosseguiram com estas táticas, destinadas a irritar a população e a fomentar a ideia da inaptidão ou sensibilidade governamental, até as eleições municipais de 8 de dezembro de 2014. Dando mostras de uma notável incapacidade para ler a conjuntura política, a direita as definiu como um referendo nacional: "Se o chavismo perde" – diziam – "Maduro deve renunciar". Em tal caso, não existiam razões para esperar até 2016 para convocar o referendo revocatório contemplado pela Constituição bolivariana. Porém, longe de perder, o chavismo tirou 900.000 votos do conjunto da direita, a Mesa de Unidad Democrática (MUD), e quase 10% dos votos. Isto, unido ao paulatino avanço na concretização de um dos grandes sonhos de Chávez: a institucionalização da CELAC, com a realização de sua Segunda Cúpula em Cuba, fez com que a direita internacionalizada lançasse sem qualquer escrúpulo e abraçasse sem mais a via da sedição, mal dissimulada por trás dos meandros do direito da oposição de manifestar-se pacificamente. Na realidade, este último é apenas uma ilusão para ocultar o verdadeiro projeto: derrotar Maduro, como explicitou o líder dos sediciosos, Leopoldo López Mendoza, seguindo a cartilha dos "democratas" sublevados contra Gadaffi em Benghasi e os neonazistas na Ucrânia atual. Caberá ao governo de Maduro traçar uma fina linha para diferenciar a oposição que respeita as regras do jogo democrático da que aposta na insurreição e na sedição. Diálogos de paz com a primeira, porém – como ensina a jurisprudência estadunidense – todo o rigor da lei penal para os segundos. Fazer o contrário não levaria a nada, senão à propagação do incêndio da subversão.

Um ano após sua partida, a herança de Chávez aparece dotada de uma invejável vitalidade: o chavismo continua sendo invencível nas urnas – ganhou 18 das 19 eleições convocadas durante seu mandato – e na Pátria Grande os processos de unidade e integração que com tanto fervor e clarividência promovera o grande patriota latino-americano seguem em curso, avançando apesar de todos os obstáculos que se erigem contra eles. Daí a intensificação da contraofensiva reacionária que concebe a luta de classes como uma guerra sem quartel e sem limites morais ou jurídicos de nenhum tipo. O objetivo imediato, urgente devido à deterioração da posição dos Estados Unidos no grande tabuleiro da geopolítica internacional, é apoderar-se da Venezuela e de seu petróleo, com a cumplicidade das classes e setores sociais que usufruíram do despojo da renda petroleira praticado pelas grandes transnacionais durante quase todo o século vinte. Gente que jamais perdoará Chávez e o chavismo de terem devolvido essa riqueza ao povo venezuelano, e que por isso se colocam a destruir a ordem constitucional. Essa é a natureza profunda de sua reivindicação "democrática": o petróleo para os Estados Unidos e o governo e todo o aparato estatal para as velhas classes dominantes e seus representantes políticos que aperfeiçoaram a pilhagem durante a Quarta República. O império se monta sobre esta retrógrada ambição para fazer na Venezuela o que fez no Iraque, na Líbia, no Afeganistão e agora pretende fazer na Síria e na Ucrânia. Em todos os casos, em nome da democracia, dos direitos humanos e da liberdade, bandeiras belíssimas que na boca de seus maiores transgressores se convertem numa poção venenosa que os povos de Nossa América não estão dispostos a ingerir, tendo uma razão bem simples: passou um ano de sua morte, porém Chávez está bastante vivo na consciência de nossos povos para que estes decidam ser presos novamente ao jugo de seus exploradores.

Tradução: Partido Comunista Brasileiro (PCB)


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