1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 (1 Votos)
Samir Amin

Clica na imagem para ver o perfil e outros textos do autor ou autora

Em coluna

A incapacidade de lidar com o Euro

Samir Amin - Publicado: Domingo, 11 Julho 2010 12:52

Samir Amin

A crise actual está destinada a durar e mesmo a aprofundar-se. Seus efeitos som diversos e muitas vezes desigual de um país europeu para outro.


As respostas sociais e políticas aos desafios que representam para as classes trabalhadoras, as classes médias, os sistemas de poder políticos, som e serám, portanto, diferentes de país para país. A gestom desses conflitos destinados a desenvolver-se é impossível na ausência de um Estado europeu, real e legítimo, e o instrumento monetário dessa gestom nom existe.

1. Nom há moeda sem estado. Juntos, Estado e moeda no capitalismo som os meios para gerir o interesse geral do capital, que transcende os interesses particulares dos segmentos do capital em concorrência uns com os outros. O dogma atual imagina o capitalismo gerido pelo "mercado", mesmo sem um Estado (reduzido às suas funçons mínimas de tutor da ordem), nom se baseia en umha leitura séria da história do capitalismo real, nem numha teoria que se reivindique "científica" ao nível de demonstrar que a gestom do mercado produz - mesmo que tendencialmente - um equilíbrio qualquer (menos ainda "óptimo").

Mas o euro foi criado na ausência de um Estado europeu, que substituísse os Estados nacionais, cujas principais funçons de gerentes dos interesses gerais dos capitais estivessesm em via de aboliçom. O dogma de uma moeda "independente" do Estado expressa esse absurdo.

A Europa política nom existe. Embora ingenuamente se imagine superar o princípio da soberania, os Estados nacionais continuam a ser os únicos legítimos. Nom existe a maturidade política que fizesse o povo de qualquer uma das naçons históricas da Europa aceitar o resultado de eleiçons "europeias". Poder-se-ia querê-lo, mas a verdade é que vai demorar muito tempo para emergir uma legitimidade europeia.

A Europa econômica e social nom existe. Umha Europa de 25 ou 30 Estados continua a ser uma regiom profundamente desigual em seu desenvolvimento capitalista. Os grupos oligopolistas que agora controlam toda a economia da regiom (e, dentro dela, a actual política e cultura política) som grupos que têm umha "nacionalidade", determinada pola de seus mais importantes dirigentes. Trata-se de grupos que som predominantemente britânicos, alemães, franceses e, secundariamente, holandeses, suecos, espanhois, italianos. Europa Oriental e parte do sul estám em um relacionamento com o Noroeste da Europa à semelhança do que existe nas Américas, entre a América Latina e os Estados Unidos. Nestas condiçons, a Europa é mais que um mercado comum, mesmo que singular, ele próprio parte do mercado global do capitalismo tardio dos oligopólios generalizados, mundializados e e financeirizados. Europa, deste ponto de vista, é, como eu escrevi, "a regiom mais mundializada" do sistema global. A partir deste fato, reforçado pela impossibilidade da Europa política, resulta umha diversidade dos níveis de salários reais e dos sistemas de segurança social e taxaçons, que nom pode ser abolida nas instituiçons europeias como elas som hoje.

2. A criaçom do euro pôs, assim, a carroça à frente dos bois. Os políticos que o decidiram, na verdade eles por vezes confessaram, afirmaram que a operaçom seria forçar a "Europa" a inventar propriamente um estado transnacional, recuperando assim o cavalo à frente da carroça. Este milagre nom aconteceu, e todo indica que nom vai ocorrer. Tive a oportunidade desde o final dos anos 1990, para expressar as minhas dúvidas sobre este movimento. Minha expressom ("pôr a carroça à frente dos bois") foi recentemente posta em relevo por um oficial superior responsável pela criaçom do euro, que na época dissera que minha opiniom era excessivamente pessimista. O absurdo de tal sistema pode dar a aparência de funcionamento sem maiores problemas - como escrevi - apenas se a conjuntura geral permanecesse favorável e fácil. Havia necessidade, portanto, de esperar aquilo que aconteceu: no momento em que umha "crise" (de início aparentemente financeira) golpeasse o sistema, a gestom do euro se tornaria impossível, incapaz de fornecer respostas coerentes e eficazes.

A crise atual está destinada a durar e mesmo a aprofundar-se. Seus efeitos som diversos e muitas vezes desigual de um país europeu para outro. As respostas sociais e políticas aos desafios que representam para as classes trabalhadoras, as classes médias, os sistemas de poder políticos, som e serám, portanto, diferentes de país para país. A gestom desses conflitos destinados a desenvolver-se é impossível na ausência de um Estado europeu, real e legítimo, e o instrumento monetário dessa gestom nom existe.

As respostas dadas pelas instituiçons europeias (incluindo o BCE) para a "crise" (a grega, entre outras) som absurdas e fadadas ao fracasso. Essas respostas som resumidas em uma palavra - austeridade em todos os lugares, para todos - e som semelhantes às respostas dos governos em 1929-1930. E, como as respostas dos anos 30 agravaram a crise real, igualmente aquelas defendidas hoje em Bruxelas produzirám o mesmo resultado.

3. O que poderia ser feito durante os anos 90 deveria ter sido definido no âmbito da criaçom de umha "serpente* monetária europeia". Cada naçom européia, mantendo-se de facto soberana, teria portanto gerido sua economia e sua moeda em funçom da sua capacidade e suas necessidades, mesmo que limitadas pola abertura comercial (mercado comum). A interdependência teria sido institucionalizada pela serpente monetária: as moedas nacionais seriam trocadas a taxas fixas (ou relativamente fixas), revistas ao longo do tempo através de ajustes negociados (valorizaçom ou desvalorizaçom).

Haveria então uma perspectiva - longa - de um endurecimento "da serpente" (que talvez preparasse a adoção de uma moeda comum). Progressos nesse sentido seriam medidos pela convergência - lenta, incremental - da eficiência dos sistemas de produção, dos salários reais e dos benefícios sociais. Em outras palavras, a serpente teria facilitado - e não dificultado - o progresso possível através de uma convergência desde o alto. Isso teria exigido políticas nacionais diferenciadas que colocassem estes objetivos e os meios para perseguir essas políticas, entre outros o controle dos fluxos financeiros, o que implica a rejeição da absurda integração financeira desregulamentada e sem fronteiras.

4. A crise do euro em curso poderá constituir a oportunidade para deixar o absurdo sistema de gestom desta moeda ilusória e a criaçom de umha serpente monetária européia em consonância com o potencial real dos países envolvidos.

Grécia e Espanha poderám iniciar o movimento, decidindo que: (i) sair ("temporaneamente") do Euro (ii) desvalorizar (iii) estabelecer controles de câmbio, pelo menos no que diz respeito aos fluxos financeiros. Estes países estariam, entom, em umha posiçom forte para negociar eficazmente o reescalonamento de seus débitos, após umha auditoria, o repúdio da dívida relacionada com operaçons de corrupçom ou especulaçom (aos quais oligopólios estrangeiros tenham participado e da qual extraíram um bom lucro!). O exemplo, estou certo, faria escola.

5. Infelizmente, a probabilidade de umha saída da crise, com estes meios é, provavelmente próxima de zero. Porque a escolha da gestom do euro "independente dos Estados " e o respeito à sacralidade da "lei dos mercados financeiros" nom som produtos de pensamento teórico absurdo. Adequam-se perfeitamente à manutençom dos oligopólios no posto de comando. Ela é parte da complexa construçom européia, concebida ela própria exclusivamente e integralmente para evitar o questionamento do poder econômico e político exercido por esses oligopólios, em seu exclusivo proveito.

Em um artigo publicado em vários sites, intitulado "Carta Aberta de G.A. Papandreou a A. Merkel", os autores gregos da tal carta imaginária ponhem em confronto a arrogância da Alemanha ontem e hoje. Duas vezes no século XX, os dirigentes deste país têm desenvolvido o projeto quimérico de modelar a Europa por meios militares, sempre superestimados. Seu objetivo de liderança de umha Europa concebida como "umha zona do marco" nom se baseia, por outro lado, numa superestimaçom da superioridade da economia alemã, que é, de fato, relativa e frágil?

A saída da crise seria possível somente se e na medida em que uma esquerda radical ousasse tomar a iniciativa política para a formaçom de um bloco histórico alternativo "anti-oligárquico". Eu escrevi que a Europa será de esquerda ou nom será. O realinhamento das esquerdas eleitorais europeias à ideia de que "a Europa assim como está é melhor do que nom haver Europa" nom permite sair da situaçom de impasse, o que requer a desconstruçom das instituiçons e dos tratados europeus. Na falta disso, o sistema do Euro, e junto com ele o da "Europa" como está, afundarám num caos cujo desfecho é imprevisível. Pode-se, entom, imaginar todos os "cenários", incluindo o que eles dizem querer evitar: o ressurgimento de projetos de ultradireita. Nestas condiçons, a sobrevivência de umha Uniom Europeia perfeitamente impotente ou a sua implosom nom faz muita diferença para os Estados Unidos. A ideia de uma Europa unida e forte, obrigando Washington a considerar seus pontos de vista e interesses, é umha ilusom.


Diário Liberdade é um projeto sem fins lucrativos, mas cuja atividade gera uns gastos fixos importantes em hosting, domínios, manutençom e programaçom. Com a tua ajuda, poderemos manter o projeto livre e fazê-lo crescer em conteúdos e funcionalidades.

Microdoaçom de 3 euro:

Doaçom de valor livre:

Última hora

Quem somos | Info legal | Publicidade | Copyleft © 2010 Diário Liberdade.

Contacto: info [arroba] diarioliberdade.org | Telf: (+34) 717714759

Desenhado por Eledian Technology

Aviso

Bem-vind@ ao Diário Liberdade!

Para poder votar os comentários, é necessário ter registro próprio no Diário Liberdade ou logar-se.

Clique em uma das opções abaixo.