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Amy Goodman

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Liberdade religiosa e direitos reprodutivos

Amy Goodman - Publicado: Segunda, 20 Fevereiro 2012 01:00

Amy Goodman

Obama está a ser pressionado para anular a regulamentação de saúde que exige às universidades e aos hospitais católicos, assim como a todos os empregadores, que distribuam anticoncetivos às mulheres que tenham cobertura médica através de seus planos de saúde.


A cúpula da Igreja Católica dos Estados Unidos deu início a uma espécie de guerra santa contra o presidente Barack Obama. O arcebispo Timothy Dolan apelou aos membros da Igreja para cobrarem “de seus líderes eleitos a volta da liberdade religiosa e dos direitos de consciência e a revogação da norma sobre a contraceção”. Obama está a ser pressionado para anular a regulamentação de saúde que exige às universidades e aos hospitais católicos, assim como a todos os empregadores, que distribuam anticoncetivos às mulheres que tenham cobertura médica através de seus planos de saúde. Após receber diversas críticas, a Fundação Susan G. Komen Race for the Cure (uma organização dedicada à prevenção do cancro de mama que conta com dois mil milhões de dólares de fundos anuais) voltou atrás na sua decisão de acabar com o financiamento da Planned Parenthood, uma organização de planeamento familiar. O governo de Obama deve fazer o mesmo e escutar a maioria dos norte-americanos. Os Estados Unidos, inclusive os católicos, apoiam fortemente os direitos reprodutivos.

Na semana passada, o pré-candidato republicano Rick Santorum chamou a atenção dos média com a sua vitória em três estados. Exatamente uma semana antes das eleições primárias, a agência de notícias Associated Press informou que a Fundação Komen havia adotado políticas que dificultavam o financiamento de clínicas vinculadas ao programa Planned Parenthood para realizar estudos sobre o cancro da mama, principalmente junto de mulheres sem plano de saúde.

Uma das principais responsáveis pela decisão foi a espalhafatosa vice-presidente da Komen, Karen Handel. Na campanha para o governo da Georgia em 2010, Handel incluiu na sua plataforma política a retirada do financiamento da entidade favorável à anticonceção. As reações amplas e implacáveis logo surgiram. Em 03 de fevereiro, a organização reconheceu o erro. Quatro dias depois, Handel entregou o seu cargo.

Recentemente, o Departamento de Saúde e Serviços Humanos dos Estados Unidos publicou uma regulamentação que exige dos planos de seguro de saúde o oferecimento de métodos anticoncecionais. Essa decisão avivou ainda mais a polémica. Para completar, no dia das eleições primárias, o Tribunal Federal de Apelações da Nona Região revogou a problemática Proposição 8, que proibia os matrimónios de pessoas do mesmo sexo no estado da Califórnia.

Na primeira batalha contra Mitt Romney pelas primárias republicanas, Santorum “conseguiu três strikes”. Como católico conservador e pai de sete filhos, o republicano lidera há tempos uma guerra cultural com foco no matrimónio, aborto e sexo. Chegou, inclusive, a comparar numa ocasião a homossexualidade com a bestialidade.

Segundo o independente Guttmacher Institute, que estuda assuntos relacionados com a saúde reprodutiva a nível mundial, “de todas as mulheres que mantiveram relações sexuais nos Estados Unidos, cerca de 99% utilizaram um método anticoncecional alternativo ao invés do planeamento familiar natural. Esse número permanece praticamente invariável no caso das mulheres católicas (98%)”. De acordo com um inquérito realizado pelo Instituto Público de Investigação Religiosa, aproximadamente 58% dos católicos consideram que os empregadores deveriam oferecer planos de assistência de saúde a seus empregados que incluam a cobertura de métodos anticoncecionais.

Os ativistas católicos que reconhecem o amplo uso de anticoncecionais entre os fiéis, apesar da proibição oficial, sugerem que as mulheres possam ter acesso aos cuidados preventivos “em qualquer outro lugar”. E se não puder pagá-los? Loretta Ross, coordenadora nacional do SisterSong, coletivo pela Justiça Reprodutiva das Mulheres de Cor, disse-me: “A norma realmente beneficia mulheres de baixo rendimento, dependentes de assistência médica, no controle de natalidade. As mulheres negras, em particular. É preciso destacar que liberdade religiosa também implica liberdade por parte da religião. Se não quiser usar métodos anticoncecionais, ninguém deve ser obrigado a comprá-los nem usá-los. Mas não impeçam que outras mulheres, caso assim desejem e não possam pagá-los, tenham acesso a eles.

Uma solução possível para o debate vem de um lugar inesperado. Michael Brendan Dougherty, comentarista católico, estava na igreja há duas semanas quando ouviu o padre ler a carta do Arcebispo Dolan, que incentiva os católicos a se oporem ao presidente. Dougherty, que também é contra a regulamentação da anticonceção, disse-me que um sistema de saúde de pagamento único daria conta do problema: “Resolveria principalmente o problema da consciência, como aconteceu na Europa. Os arcebispos repudiam o subsídio do governo ao aborto ou à anticonceção. Mas não estão furiosos porque não se lhes pede que cooperem formalmente com coisas que consideram pecaminosas”.

Ross concorda com a implantação de um sistema de saúde de pagamento único, porém lança uma advertência aos católicos radicais: “Não se metam nos nossos dormitórios. Fiquem fora desse debate que tenta simplesmente esconder uma guerra contra as mulheres. Primeiro com toda essa retórica sobre a liberdade religiosa e o cuidado com o embrião. Agora com o pensamento de que a anticonceção também é uma violência contra a criança antes mesmo dela ser concebida. Não vamos ficar de braços cruzados. E como mostrou a luta contra a Fundação Komen, somos uma força a ser considerada. Vamos trabalhar para fortalecer a posição do presidente Obama de apoiar o acesso aos métodos anticoncecionais”.

Artigo publicado em "Democracy Now" em 09 de fevereiro de 2011. Denis Moynihan colaborou na produção jornalística desta coluna.

Texto em inglês traduzido por Mercedes Camps para espanhol.

Texto em espanhol traduzido para português por Rafael Cavalcanti Barreto e revisto por Bruno Lima Rocha para Estratégia & Análise.

Revisto para português de Portugal por Carlos Santos

Amy Goodman é co-fundadora da rádio Democracy Now, jornalista norte-americana e escritora.


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