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Alexandre Carrodéguas

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A política como cultura de vida

Alexandre Carrodéguas - Publicado: Quarta, 31 Agosto 2011 02:00

Alexandre Carrodéguas

Nos anos sessenta e quase ao mesmo tempo, Pasolini e Lukács dérom-se conta de que o capitalismo entrara numha nova fase: já nom era meramente um capitalismo de produçom, senom que se transformara em cultura de consumo e aniquilara as culturas autónomas pré-existentes. Entrara na vida quotidiana.


Lukács falava concretamente de "capitalismo manipulatório". No caso galego, as culturas populares pré-existentes, nomeadamente a labrega, fôrom exterminadas. A subcultura operária tinha escassa tradiçom e por isso era sobre os costumes comuns do campesinato, sobre essas culturas de vida, onde a esquerda devia construir o movimento nacional-popular. A "cultura moral da multidom" de que falava E. P. Thompson. Os escritos de Pasolini ainda som fundamentais para enxergar esta revoluçom antropológica. Ele foi o grande profeta desta catástrofe. Na Galiza, Marcos lorenzo explicou a liquidaçom do rural, esse etnocídio, e a sua substituiçom pola cultura de "grande superfície" da periferia das cidades. da esfera pública desapareceu a cultura da solidariedade, da libertaçom e da democracia real. A lógica cultural do individualismo e do consumismo converteu-se no imaginário do sistema.

Pasolini, seguindo o escritor renascentista Guicciardini, lembrava umha metáfora genial: a contraposiçom entre o palácio e a praça. Quando nom existe a mobilizaçom organizada que crie umha nova cultura, que construa novas práticas, a esquerda alternativa mal articula siglas sem conexom com a praça. sem textura real organizada. Assim, torna-se ilusório querer entrar no palácio sem movimento orgánico encarnado ao qual poder representar. Hoje o palácio, como di Arcadi Oliveras, está habitado por delinqüentes. Ou, como lamentava o nosso Pasolini, por criminosos. Temos que nos dar conta de até que ponto o poder homologador do palácio exerce através dos seus terminais mediáticos umha intensa campanha de aculturaçom. de até que ponto perdemos a autonomia. Por isso, o central é a formaçom de um novo sujeito constituinte, de umha esquerda consubstanciada nas assembleias dos centros de trabalho, nas escolas, nos bairros... Um sujeito que nom tenha um programa fechado que defender como fórmula alheia ao próprio movimento real, senom que se vai construindo através das necessidades quotidianas, vividas como necessárias. Porque, como me contavam os velhos comunistas dos estaleiros de Ferrol, já nom se fam bibliotecas nos cacifos dos obradoiros? Por que ansiamos ir a Cancum em viagem de férias, igual que os nossos patrons? Nom será que nós, o mundo do trabalho, estamos colonizados polo imaginário do sistema? A nossa tarefa imediata primordial nom é a construçom de umha sigla que funcione a modo de ferramenta pontual, senom a da constituiçom desse novo sujeito que dispute a hegemonia à direita. É a gente a que tem que se organizar capilarmente (Gramsci) como tecido social alternativo.

A esquerda sofreu umha grande derrota e nom vale a pena continuar a nos autoenganarmos. Estamos na travessia do deserto e devemos ser conscientes de que a nossa praça está atomizada, fragmentada. Temos os ingredentes, mas nom coalham. Mas também sabemos que está na nossa mao fazê-lo e que nom há nengum determinismo que o impida. Há milhares de análises sobre a catástrofe do sistema: demasiado estado maior e pouca infantaria, demasiados analistas e pouca açom. sabemos que a política é doxa (opiniom) e nom episteme (ciência), e portanto tampouco a podemos deixar seqüestrada em maos dos técnicos. Em todo o caso, estes participarám das nossas assembleias. sabemos ademais que os partidos sistémicos formárom umha espécie de cartel e que estám em crise profunda. Autonomizárom-se em relaçom ao eleitorado que dim representar porque fôrom cooptados pola instituiçom e passárom a ser comissários do grande poder económico. Em Ferrol, ponhamos por caso, onde eu militava no BNG quando iniciamos a luita contra a central de gás, o aparato político do partido que controla o partido obrigou a que mudássemos de postura. Passou-se da mobilizaçom à instituçom. E ao entrarmos no palácio -nos paços do concelho-, foi abandonada a praça, que ficou sozinha e caluniada. O BNG entrou numha deriva da qual ainda nom deu saído.

O objetivo é encarnar essa nova democracia real, viva e popular que reivindica o movimento do 15-M, as praxes criadoras de umha esquerda que seja de luita e de governo, que nom seja comissária do poder económico usurpador, que nom quebre o vínculo de fideicomisso entre representante e representado, que fomente umha nova cultura democrática de vida, na qual devem participar as maiorias despossuídas e garantes da verdadeira democracia, como movimento e nom como procedimento. O que dantes chamávamos povo.

Fonte: Galizalivre a partir de Novas da Galiza.


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