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Sílvia Ribeiro

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FAO e transgénicos: aposta errada

Sílvia Ribeiro - Publicado: Quarta, 31 Março 2010 19:17

Sílvia Ribeiro

É grave e irresponsable a tentativa de FAO de legitimar os transgénicos como solução à fome e a crise climática no terceiro mundo, cuja expressão mais recente é a conferência Biotecnologías agrícolas nos países em desenvolvimento (Guadalajara, México, 14 de março). Em frente das críticas que vão em aumento, os servidores públicos de FAO (Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura) declararam que a biotecnologia é mais que transgénicos e eles só propõem opções".


Mas os documentos que coordenou a FAO para a conferência não recolhem questões fundamentais sobre biotecnologia, como o domínio das empresas trasnacionais sobre todo o sector. Ignoram também os resultados à vista do uso de biotecnologia agrícola: a contaminação transgénica das variedades camponesas, o aumento do uso de agrotóxicos desses cultivos (que piora a mudança climática) e outros impactos sobre o ambiente e a saúde dos consumidores.

Se FAO tivesse querido realizar um processo de discussão sobre "opções", não poderia ter organizado uma conferência sesgada, sem a participação dos actores fundamentais, e eliminando as posições críticas. Agora, o que faz a FAO é condonar a apropriação das sementes e a corrente alimentar do planeta que cresce por parte de umas poucas trasnacionais de transgénicos, o qual agravará a fome e o caos climático.

A conferência partiu de um processo errado desde o início: não estavam –e continuam sem estar– os camponeses e agricultores familiares e as suas organizações, que são nada menos que os que produzem a alimentação da maioria do planeta e são a chave mais importante para enfrentar a crise climática e alimentar. Este papel fundamental das camponesas, pastores, pescadores artesãos e outros pequenos produtores tem sido confirmado com novos dados em vários relatórios recentes. (Por ex. Quem vai alimentar-nos? Perguntas perante a crise climática e alimentar, do Grupo ETC www.etcgroup.org/é/node/4952)

Mas a FAO não se preocupou com esta notável falha, e sim considerou que convidando uma dezena de indivíduos de organizações não governamentais internacionais cumpria com a formalidade "participativa". A maioria desses convidados seleccionados pela FAO são de organizações das trasnacionais da indústria dos transgénicos (como Croplife e Biotechnology Industry Organization, BIO) ou organizações de grandes agricultores industriais e ONG e instituições que são favoráveis ou turvamente ambíguas aos transgénicos. Como excepção, Pat Mooney, director do Grupo ETC, aceitou integrar o comité de pilotagem desta conferência, depois de muita insistência de parte do secretariado da FAO que assegurou que seria um processo "justo e neutro".

A 23 de fevereiro 2010, Pat Mooney, Prêmio Nobel Alternativo e um dos mais profundos conhecedores do trabalho da FAO desde há 40 anos, renunciou publicamente a este comité, depois de constatar que em todo o processo, a FAO nunca tomou em conta nenhuma de suas observações e recomendações, mas sim usou o seu nome para justificar diante de organizações mexicanas que não iriam permitir-lhes participar na conferência, mas que Mooney representava as suas preocupações.

Entre muitas outras ausências graves nos documentos, uma das mais ofensivas é o facto de que ainda que a conferência se realizasse no México, centro de origem do milho, a FAO não se dignou incluir no relatório nem pedir contas ao governo mexicano sobre a contaminação transgénica de variedades nativas. Nem sobre a já ocorrida nem a que agora promete o governo com a aprovação de 24 sementeiras experimentais de milho transgénico a favor das trasnacionais Monsanto, DuPont-Pioneer e Dow.

Um dos principais organizadores da conferência, Shivaji Pandey, por décadas servidor público do Centro Internacional da Investigação Agrícola sobre Milho e Trigo (CIMMYT) localizado em Texcoco, México e actualmente presidente do Grupo de Trabalho sobre Biotecnologia da FAO, respondeu com uma breve e aséptica nota às preocupações que dirigiram à FAO mais de mil 500 organizações de 70 países demandando que a FAO devia chamar a atenção do governo mexicano perante a escalada de contaminação e restabelecer a moratória, por ser centro de origem do milho. Pandey responeu com o seu mantra de que "a biotecnología inclui muitas tecnologias", que têm "muito potencial" e os transgénicos sim, alguns riscos, mas que em definitivo era um problema nacional. Como pode um servidor público da FAO considerar o centro de origem do milho do mundo –sendo aliás um dos quatro principais cereais base da alimentação de toda a humanidade– um problema "nacional"?

Não há nos documentos para a conferência nenhuma menção à gravíssima contaminação transgénica em centros de origem e diversidade como o México. No entanto, os mesmos servidores públicos de Cibiogem que no México aprovaram em forma irresposável condonar a contaminação transgénica passada e a aumentar para permitir o lucro das trasnacionais, serão palestrantes na conferência da FAO no tema de bio-segurança! Seguramente não mostrarão as críticas que têm recebido a mais de 700 cientistas contra a aprovação de sementeiras de milho transgénico (www.uccsnet.org).

Entretanto, afora, em ruas, praças e centros de Guadalajara e outras partes do mundo, haverá uma grande variedade de actividades da sociedade civil e organizações camponesas para denunciar estas falácias e defender, realmente, as alternativas camponesas que precisamos para enfrentar as crises. Definitivamente, não incluem transgénicos.

Fonte: La Jornada. 

Tradução: DL.


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