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José André Lôpez Gonçâlez

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O Grande Combate (V)

José André Lôpez Gonçâlez - Publicado: Sexta, 12 Março 2010 19:04



José André Lôpez Gonçâlez- As Derrotas Consolidam o Despotismo 


ALEMANHA-1923

O ano 1.923 está  assinalado na sorte da IIIª Internacional como decisivo. Com Lenine doente, o choque entre Trotski e a oposição de esquerdas com o resto da direcção do Partido Bolchevique estoura abertamente. É neste mesmo ano que, numa situação revolucionária excepcional, o Partido Comunista da Alemanha (KPD) fracassa no propósito de converter a situação em tomada do poder pola classe operária.

Em Janeiro de 1.923 faz-se a denúncia da Alemanha como a responsável unilateral da Primeira Guerra Mundial e o exército francês preenche o Ruhr alemão em represália por não poder pagar as reparações de guerra. O governo do banqueiro Cuno faz o chamamento para a resistência passiva da população e uma onda favorável às forças da extrema direita abrange a Alemanha de lês a lês. A ocupação origina um grau de decomposição social sem analogia até o momento em qualquer outra sociedade industrial moderna. A inflação, permitida de consciência pola burguesia, preenche caracteres galgantes: um ovo custa em Fevereiro 300 marcos; à roda do 15 de Julho, 3.400; para o 5 de Agosto, 12.000; em 8 de Agosto, 30.000, até chegar o momento que os comércios e os armazéns incrementem os preços hora por hora... Assim, os salários diminuem primeiro à metade menos e de contado à quarta parte de antes da guerra. O número de desempregados medra a enchente[79]. A quantidade de homens, mulheres e crianças na maior das indigências aumentam diário. Neste candente cenário, a influência do KPD nos sindicatos é cada dia maior e os recrutamentos nas localidades grandes contam por milhares. Um poderoso movimento de conselhos espalha polas mais importantes instalações fabris e aí o KPD é a força mais activa. Formam-se, por iniciativa do KPD, as Centúrias Proletárias e o 1 de Maio desfilam por Berlim mais de 25.000 trabalhadores com bracelete vermelho. O propósito do KPD de formar a partires das Centúrias, órgãos de fronte única frustra-se, embora um número importante de operários do Partido Social-Democrata da Alemanha (SPD) e independentes passam a formar parte delas. No mesmo mês explode uma Greve Geral na bacia do Ruhr e a rebelião em Bochum. Erich Wollemberg (Walter) refere na apresentação à “Insurreição armada” (Fevereiro de 1970):

Com o nome de Walter´ eu era o chefe militar da insurreição de Bochum, insurreição contra o regime capitalista e reaccionário do Governo alemão do chanceler Cuno, assim como contra o imperialismo francês. O C.C. do KPD, reunido em sessão extraordinária em Essem, capital da bacia do Ruhr, (Brandler, presidente do C.C.; Ruth Fisher, chefe da oposição da esquerda), tinha condenado de modo unânime a insurreição e mandado a desarmação dos trabalhadores armados. A insurreição de Bochum conseguira a fraternidade entre os proletários alemães que aclamaram e gritaram: Abaixo Poincaré! Abaixo Stinnes! (na altura Stinnes era o capitalista mais opulento e poderoso da República de Weimar). Em Maio de 1923, desperdiçou-se uma grande oportunidade para a revolução socialista...”[80]

Paralelamente, o nacionalismo de direitas reforça-se de maneira espectacular. Em volta de Setembro de 1923, o Partido Nacional-Socialista (NSDAP) chefiado por Hitler conta já com 50.000 membros e umas Formações de Assalto (SA) fortemente armadas, ajudadas, protegidas e financiadas polos grandes empresários[81] e oficiais do Exército.

O KPD quer fazer para o 29 de Julho um dia de luita contra o nazismo, mas o Comitê Central cambaleia perante o carácter que se lhe há dar por causa da proibição do Governo. Brandler pede conselho o Comitê Executivo da Internacional e Estaline contesta “se hoje na Alemanha o poder, por dizê-lo de algum modo, caíra e no caso que os comunistas quiseram conquistá-lo, fracassariam com grandes perdas. Isto no ‘melhor’ do caso. No pior seriam destroçados... Em minha opinião devemos enfrear os alemães e não estimulá-los.” A jornada antifascista, resulta por uma grande quantidade de reuniões públicas ao longo e largo do país, dá em resultado um êxito notável. Mas a direção vacila ante os acontecimentos. O 9 de Agosto assisti-se à explosão duma greve geral em Berlim que em três dias obriga a demitir o governo de Cuno. A burguesia, apavorada ante o desenvolvimento dos factos, apóia um governo da social-democracia para estabilizar a situação. Não é menos o apavoramento da direcção do KPD ante a combatividade dos obreiros e face das probabilidades de formação dum governo de coligação. A revolução na Alemanha entrava na fase decisiva com um Comitê Central desorientado. A direcção do KPD, então, decide trasladar-se a Moscovo para discutir as perspectivas com os máximos dirigentes da Internacional. O plano traçado para a insurreição, para o que o KPD tem de se preparar, tem como ponto chave o apoio ao governo social-democrata de Saxônia sobre a base da frente única com o reforçamento das Centúrias Proletárias e dos Conselhos dos Operários.

A agressão à  Saxônia desencadeia uma greve geral que se transforma numa insurreição por toda a Alemanha. Por vez primeira um levantamento obreiro pode ser preparado tecnicamente com antecipação e contar com a inestimável ajuda da União Soviética. Mas, a forma em que vai ser conduzida constitui toda uma antologia de erros em todas as ordens. Dezenas de milhares de militantes abandoam os seus trabalhos para se trasladar às casas que hão ser os quartéis donde se prepare à insurreição. O KPD entra a formar parte do Governo de Saxônia onde participa o Secretário Geral Brandler, mas, quando o Exército dá o ultimato ao Governo de Saxônia e prepara a entrada no Land, os social-democratas negam-se a fazer o chamamento à greve geral. O KPD vacila e sem outro plano na mão, anula a ordem de insurreição. Contudo, em Hamburgo, os militantes comunistas luitam nas ruas emquanto às fábricas seguem a trabalhar em ritmo lento e a população, ainda que simpatize com os insurrectos, olha passiva[82].

Clara Zetkin, dirá mais tarde:

“o Partido não centralizou avonde os conselhos das fábricas e, além disso, não os politizou... e esqueceu dirigir a vontade das massas para a guerra civil”, e Trotski amargamente: “... Zinoviev definia nestes termos a significação do que acontecera na Alemanha: «Esperávamos a revolução alemã, mas nom véu (Pravda, 22 de Junho de 1924)». Em realidade, a revolução estava no seu direito de contestar: «Eu si viera, mas vocês, senhores, chegaram tarde a cita».”[83]

A derrota do proletariado na Alemanha desencadeou uma agre discussão na Internacional, mas jamais um verdadeiro debate sobre os acontecimentos: Zinoviev, Kamenev e Estaline, que luitam já contra Trotski e a incipiente oposição, buscam, como cortinado de fume, culpáveis na direcção do KPD. O Executivo da Internacional, intervindo directamente, substitui Brandler[84] do seu cargo de secretário geral por outra direcção de «esquerdas» (Fischer-Maslow).

A burguesia estabilizara a situação na Alemanha e no resto da Europa. A luita do proletariado tinha, também, de se desenvolver num novo cenário.

AS AVENTURAS DE 1924-1925

Em Junho de 1924, a par da crise na Alemanha, o governo da Bulgária é derrotado por um golpe da direita. A direcção Koralov-Dimitrov do PCB, tarde e arrasto perante os acontecimentos, firma a sua “neutralidade”, mas decide, convocar um mês antes da derrota do proletariado na Alemanha[85], uma insurreição ultra-esquerdista em Setembro, que é esmagada com brutalidade.

O V Congresso da Internacional Comunista celebrar-se-á sob a sombra das derrotas na Europa e a crise que se desenvolve no primeiro Estado operário e no Partido Bolchevique, em Junho-Julho de 1924. Desde os primórdios os debates estão emponçonhados pola vontade de Zinoviev de afogar qualquer crítica no Comitê Executivo da Internacional e polos da Troika Zinoviev—Kamenev—Estaline na briga contra Trotski e a Oposição de Esquerdas. Produto desta situação começará pôr as bases dum curso esquerdista e sectário trançando com as resoluções que se impuseram no IV, ainda pressente Lenine. Se o IV não só denunciara o perigo do fascismo como inimigo mortal do proletariado, também avisara que era uma força dirigida “contra os mesmos envasamentos da democracia burguesa” e sinalara “uma das tarefas mais importantes dos partidos comunistas é organizar a resistência ao fascismo internacional, colocar-se à frente do conjunto do proletariado em luita contra as bandas fascistas e aplicar energicamente neste terreno a táctica de frente única”. O V Congresso, em troca, propõe: “Quanto mais se descompõe a sociedade burguesa e todos os partidos da burguesia, sobretudo a social democracia, tomam um caráter mais ou menos fascista (...) o fascismo e a social democracia são as duas faces dum único instrumento da ditadura do grande capital”.

Uma análise muito superficial dos erros cometidos polo KPD na aplicação da frente única e a tergiversação dos quatro primeiros congressos da Internacional Comunista (os celebrados ainda vivo Lenine) leva a propor uma sectária política de “fronte única pola base”.

A luita contra o «brandlerismo»  e o «trotskismo» é o cortinado de fumo que necessitam para substituir o melhor das direções dos partidos comunistas, que alinhavam com Trotski e os oposicionistas: Na França, Rosmer e Monatte; na Polônia, Warski, Walecki, Kostrzewa[86], etc. Uma nova espécie de quadros, acríticos, servis, a maior parte deles sem capacidade autónoma alguma, irão trepando ao poder nos partidos e, assim, inexoràvelmente, trocar-se-á radicalmente o carácter da Internacional que fundara Lenine. A burocrática sombra de Moscovo havia-se mostrar, já a seguir, muito alongada.

Submetidos os partidos comunistas num isolamento atroz, são conduzidos duma derrota para outra por toda a Europa.

Na Estónia, pequeno país báltico que chegara à sua independência em 1918 mercê  à Revolução de Outubro, conhece um ascenso revolucionário de primeira categoria. O Partido Comunista é a orginazação operária de maior influência nos sindicatos obreiros e nas organizações dos pequenos lavradores. A burguesia, por outro lado, está numa situação de catastrófica crise. Uma brutal repressão contra os trabalhadores dá ocasião ao processo monstro de Novembro de 1924 de 149 comunistas e numerosos assassinatos nas ruas de líderes operários naturais. O Partido Comunista que, desde o verão vem preparando a insurreição, evita por todos as vias fazer um chamamento à acção para... não darem pistas dos preparativos insurrecionais! Quando a insurreição estale que tão “ciosamente” prepara o partido aos olhos dos seguidores e das massas (tanto que são ignorantes dela mesmo muitos dos militantes), a aventura acabará com um desapiedado esmagamento dos operários estonianos[87]. Todos os erros serão imputados à velha direcção quando a nova se eleva ao poder por indicação da direcção internacional, mas é bem outra a realidade: a luita no seio da «troika» entre Zinoviev e Estaline começara já a se desenvolver, Estaline apoiando-se no aparelho do Partido bolchevique e Zinoviev no da Internacional. Desejoso este último por conseguir uma vitória internacional que faça dobrar o pulso à facção de Estaline, era o responsável direito da insurreição putchista e de afogadilho que ocultara tanto ao Comitê Central bolchevique e o Comitê Executivo da Internacional até[88].   
 
Notas:

[79]

     DESEMPREGADOS    SEMI-EMPREGADOS    TOTAL    MÉDIA MENSAL DE DESEMPREGADOS
Janeiro    4,2%    12,6%    16,8%    1913    2,9%
Abril    7 %    28,5%    35,5%    1918    1,2%
Setembro    9,9%    39,7%    49,6%    1919    3,7%
Outubro    19,1%    47,3%    66,4%    1920    3,8%
Novembro    23,4%    47,3%    70,3%    1921    2,8%
Dezembro    28,9%    39,9%    62,2%    1922    1,5%
La insurrección de Hamburgo, Hans Kippenberger, em La insurrección armada, A. Neuberg, pág. 93  

[80] La insurrección armada, pág. 7.

[81] Emil Kirdorf, principal accionista das minas de Gelsenkirchen, fundador do Sindicato do Carvão do Ruhr e controlador dos haveres públicos da União Mineira e da Associação do Noroeste, foi membro destacado do Partido Nazi. Walter Funk, director dum importante jornal financeiro, jurou, após a IIª Guerra Mundial que a indústria jamais subministrara mais de 2.000.000 de marcos aos nazis precedentemente à sua subida ao poder. Fritz Thyssen, nas suas memórias “Eu paguei Hitler” refere às mesmas cifras de ajuda. [Leia-se: Michael J. Thornton, El nazismo (1918-1945), pág. 46, Ediciones Orbis, Barcelona, 1985]

[82] Para a Rebelião de Hamburgo vede o informe de Hans Kippenberger publicado em La Insurrección Armada, págs. 93-112

[83] La Internacional Comunista después de Lenin, pág. 176, Obras.1, Akal Editor, Madrid, 1977.

[84] Contudo, ainda que burocraticamente expulso do Partido e da Internacional em 1928, Brandler defendeu sempre fielmente o comunismo até a sua morte em Hamburgo em 20 de Setembro de1967.

[85] Jorge Dimitrov há escrever em «Internacional Comunista», n.º 7/8 de 1924:

“O comportamento passivo do PCB o 9 de Junho foi um erro fatal, que teve conseqüências decisivas, tanto para o Partido, e assim mesmo para todo o povo búlgaro trabalhador. Foi pago o erro aquele durante os acontecimentos de Junho e, sobretudo de Setembro com milhares de mártires e com rios de sangue dos operários e camponeses” (Obras Escolhidas, Vol 1, pág. 294, Akal Editor, Madrid, 1977.)

E confessar («Internacional Comunista», n.º 6/9 de 1925): “Os lavradores, os obreiros e as minorias nacionais oprimidas nos Bálcãs e de resto dos países, nas atrozes provas polas que teve que atravessar e segue atravessando o povo búlgaro trabalhador, na frustrada experiência do poder agrário na Bulgária, nos erros fatais da União Agrária Búlgara e do Partido Comunista — em toda esta lição búlgara há valiosas lições sobre o único e justo caminho que devem empreender na sua luita de libertação” (Obras Escolhidas, Vol. 1, pág. 362). Dimitrov refere à estultícia de não fazerem fronte comum com a União Agrária de Alexander Estamboliiski, colocado na ala esquerda da sua formação política, quando as forças da Concórdia Popular (um partido de tendências semelhantes aos fascistas) de Alexandre Tzankov, as da União Militar e as terroristas ultranacionalistas da Macedônia, ORIM, após um golpe de estado do Czar Boris III que encomendara formar governo ao líder da grande burguesia e do Bloco Constitucional, Razankov, desarmaram a Guarda Laranja (a milícia camponesa) do líder da União Agrária Búlgara. Estamboliiski pede ajuda ao Partido Comunista para enfrentar os ultra-direitistas. As bases do PCB aprestaram-se fazerem frente comum com os lavradores e mesmo na cidade de Plevem saíram já à rua e estalara a greve geral, mas o Comitê Central desacreditou a sua intervenção. Os trabalhadores e os pequenos lavradores bem puderam ter tomado o poder daquela. As condições eram óptimas, mas o espartilho estalinista não lhes deixou dar ocasião de manobra. Esta aberta traição, pois vai bem mais alô dum grave e desgraçado erro, conduziu a uma ditadura atroz que custou milhares de vítimas entre os obreiros e os pequenos camponeses e o Partido Comunista dizimado e na clandestinidade, quando na Sobranie (Parlamento) dos 245 escanos 212 eram dos seguidores de Estamboliiski e dos 33 restantes, 16 eram dos comunistas.

[86] Vede: La tragedia del comunismo polaco entre las dos guerras mundiales, entrevista a Isaac Deutscher em Le Temps (1958), http://archivo.po.org.ar/edm/edm29/testimon.htm

[87] Para a rebelião estoniana vede: Unschlicht: La Insurrección de Reval, em La Insurrección Armada, págs. 72-89.

[88] “Em Reval, somente luitou a vanguarda do proletariado revolucionário. Deste modo, o PC da Estónia e, com ele, Zinoviev perpetraram não só um disparate, mas também uma traição” (Lenine, 1921 - A doença infantil do comunismo).
 A insurreição de Reval, com os seus milhares de mortos e presos e mutilados, não só entregou  Estónia por muito tempo ao terror branco e para uma reação sinistra, mas precipitou com isso a queda de Zinoviev e a chegada ao poder de Estaline” Erich Wollenberg em La Insurrección Armada, págs. 5-6.


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