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Ilka Oliva Corado

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Crónicas de uma inquilina

Rosario

Ilka Oliva Corado - Publicado: Quinta, 07 Mai 2015 16:37

Está machucada, o rosto dela está sangrando, não consegue distinguir com claridade... Quantos a violaram já? Golpearam-na e abusaram dela os narcotraficantes que fazem a custódia do armazém. Pedem um resgate de 20.000 dólares para a sua tia que vive em Nova Iorque.


Rosário é hondurenha, tem 13 anos, e é a mais velha de cinco irmãos. Foi embora da sua cidade natal, Comayagua, porque a mara Salvatrucha1 queria recrutá-la para os envios de pacotes de droga. Se não o fazia, a sua vida corria perigo. Quantos a violaram já?

Como se esquecer a noite em que caiu em cima dela a mara como castigo por se negar a ser mensageira? Quantos foram? Não se lembra, apenas tem a noção de quando se despertou em um hospital e lhe disseram que os bombeiros a tiraram inconsciente do fundo de um barranco.

Outra vez? Não quer pensar. Não quer sentir. Quer que a sua mente voe para longe desse lugar. Não quer sentir essa dor entre as suas pernas. Escutar a sua pele se resgar cada vez que a vulneram. Não quer se ver de novo cheia de sangue, encolhida em uma esquina do quarto. Gritar, para quê? Ninguém irá resgatá-la, o armazém está no meio do nada, em pleno deserto do Arizona.

Outro filho? Não. Outro filho produto do estrupo. Graças à parteira da cidade, ela pôde abortar quando foi violada pela mara, em Arizona ninguém podia ajudá-la, suplica à Virgem de Suyapa para que não fique grávida. Que esse pesadelo termine logo. 20.000 dólares? Onde a sua tia vai arranjar essa quantia?

Por que esse infortúnio? Por que esse destino? Ela só queria estudar e ser enfermeira. Por que a mara teve de colocar os olhos nela? Ela não queria emigrar. Ela não queria ir para os Estados Unidos. Ela queria estudar e ser enfermeira.

Por que os coiotes tiveram de sequestrá-la e exigir o resgate? Por que a estupraram? Não era já suficiente o abuso sexual cometido pelos policias em Naco, Sonora? Como dádiva foram entregues todas as meninas e adolescentes à policia que faz a custódia do deserto de Sonora, a qual as violaram durante três dias e, depois, as devolveram aos coiotes. Muitas não regressaram, dizem que não sobreviveram e que outras foram obrigadas a trabalhar em um bar. Quantas eram? Não se lembra, havia meninas de El Salvador, da Guatemala, de Honduras e da Colômbia. Onde estão?

Por que não morrem? Por que não a matam de uma vez por todas? A sua tia não tem todo esse dinheiro, apenas conseguiu 7.000 dólares, pede tempo para pagar o resto. Não lhe concedem este tempo.

Rosário é levada, junto com outras meninas e adolescentes, para o bar da rua Love. Não serão liberadas nunca, ali as suas vidas vão apodrecer. Entre torturas violações.

4 de maio de 2015

Estados Unidos

Notas de tradução

1O termo mara (em português, quadrilha) é usado na região centro-americana para se referir aos bandos latinos que, além do narcotráfico, roubam, extorquem, intimidam e sequestram e praticam o tráfico de pessoas. A mara Salvatrucha, ou MS13, é talvez a mais conhecida das maras e se estende por El Savador, Honduras, Guatemala, Belize, México, Estados Unidos, Canadá e, até mesmo, Espanha.

Tradução de Camila Lee para o Diário Liberdade.


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