1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 (1 Votos)
Ilka Oliva Corado

Clica na imagem para ver o perfil e outros textos do autor ou autora

Crónicas de uma inquilina

Imigração sem documentos, o inferno do plano Fronteira Sul e Maya-Chortí

Ilka Oliva Corado - Publicado: Terça, 07 Abril 2015 06:25

[Tradução de Camila Lee para o DL] Começa a vir à luz o engano político ao qual se uniu muito bem os meios de comunicação dos Estados Unidos, do México e da América Central. Estou me referindo àquela grande onda de verão, quando do nada explodiu como uma bomba que milhares de crianças e adolescentes centro-americanos(as) viajavam sozinhos para os Estados Unidos.


E é que tinha algo por debaixo do pano, pois há muito tempo milhares de crianças cruzam a fronteira sem a companhia de um adulto. Então, por que anunciar isto como uma urgência e alarme nacional? Havia algo aí, mas ainda não era possível vê-lo com clareza.

Não passou nem um ano e já vemos o resultado das oratórias de Obama em rede nacional e das suas reuniões com os presidentes da Guatemala, de El Salvador e de Honduras, bem como das reportagens exclusivas dos canais de televisão em castelhano nos Estados Unidos. Tudo era parte de um plano que hoje já está “mostrando as suas asas”.

O primeiro golpe veio em julho de 2014, com a implementação do Plano Fronteira Sul1 no México, ao qual descreveram como se tratasse de evitar o tráfico de pessoas, os sequestros e os desaparecimentos de imigrantes e lhes dar um tratamento digno. Falaram de vistos humanitários e de autorizações de traslado e de dar um forte golpe ao narcotráfico. Porém, tudo ficou no papel, pois o que ocorreu no México foi que os assassinatos se agravaram e os imigrantes em trânsito ficaram marginalizados.

Com este Plano Fronteira Sul, ordenado por Obama e financiado pelos Estados Unidos, as autoridades mexicanas (polícia, agentes de imigração e exército) são os principais assassinos de imigrantes. Os estupros de crianças, adolescentes e mulheres sucedem no próprio Instituto Nacional de Migración mexicano. São os policiais os que assaltam o trem La Bestia2 e cometem assassinatos e, ali mesmo, violam a quantas mulheres encontram nos vagões. E quem é que diz alguma coisa? Qual é a lei que os castiga? Nenhuma.

Estes sãos os mesmos que depois entregam as mulheres (as quais eles mesmos violaram) para o crime organizado, para que sejam destruídas no tráfico de pessoas com fins de exploração sexual e no tráfico de órgãos. São as autoridades mexicanas que sequestram os imigrantes e pedem o seu resgate aos familiares nos Estados Unidos.

O que é desprezível em tudo isto é que, quando este tipo de crime é denunciado, a impunidade e corrupção não permitem que os processos avancem. Além disso, estas autoridades terminam atacando aos que as denunciaram, na maioria dos casos defensores de Direitos Humanos que oferecem assessoria aos imigrantes em trânsito. Ir ao Ministério Público mexicano e fazer uma denuncia é atentar contra a própria segurança.

No México, para a sociedade civil apática ao drama humano e para os legisladores que promovem leis contra imigrantes em trânsito, estes são vistos como ladrões e estupradores. Um exemplo claro e doloroso, porém real, é o caso dos 43 estudantes de Ayotzinapa3; isto ocorre todos os dias no México com os imigrantes, são milhares os desaparecidos e centos de corpos são encontrados em fossas clandestinas. No entanto, como somos invisíveis, não há quem levante a voz por nós.

O Plano Fronteira Sul só deu luz verde para que o narco-estado mexicano faça o que quiser com os imigrantes em trânsito e Obama sabe muito bem disso, pois é o presidente que mais deportou pessoas sem documentos na história dos Estados Unidos. E é então quando surge a pergunta: é assim que ele pretende colocar um freio na imigração forçada, criminalizando os imigrantes?

As vidas das pessoas em trânsito não lhe importa nada. Por isso, a Patrulha Fronteiriça faz e acontece com elas nas fronteiras e nos centros de detenção. E, embora se façam denuncias, não há lei que proteja os Direitos Humanos de um “sem documento” nos Estados Unidos. E no México, muito menos.

Porém, Obama não se conformou com as carnificinas que está realizando o narco-estado mexicano e a Patrulha Fronteiriça no sul dos Estados Unidos. Agora, o que ele pretende é erradicar a imigração forçada desde a raiz centro-americana, através de financiamento dos governos ditatoriais da Guatemala e de Honduras para implementar o plano Maya-Chortí4, o qual também criminaliza aos hermanos centro-americanos na sua própria casa. Desde então, essa região vendo sendo uma extensão do que é o México atualmente.

É imoral e inumano que estes governos aceitem atentar contra os seus próprios cidadãos, lhes estigmatizando da mesma forma que o México. Que não nos pareça estranho que entre a Guatemala, El Salvador e Honduras comecem a aparecer fossas clandestinas e que ali se encontrem corpos de imigrantes. Que não nos surpreenda que o tráfico de órgãos de imigrantes comece desde a América Central. Que o tráfico de pessoas ao qual pretendem “atacar” seja a fonte de autos ingressos para os envolvidos no assunto de justiça e proteção de imigrantes.

Eram esses planos nefastos que se aproximavam quando os governos do país de origem, de trânsito e de chegada laçaram a bomba sobre as crianças imigrantes que viajam sozinhas; novamente se trata de um duplo jogo de Obama e das suas conversas de orador celestial. Não se pode criminalizar aqueles que saem fugindo do seus país porque os seus governos nãos lhes oferecem oportunidades de desenvolvimento. Pois, a extrema pobreza e a violência sistematizada e institucional são as formas com as quais os governos mantêm aos cidadãos em constantes estado de terror para o seu benefício exclusivo de tiranos saqueadores.

A imigração centro-americana aos Estados Unidos é e continuará sendo forçada. Ninguém arrisca a sua vida assim, sem mais nem menos. Todos nós que vamos somos párias. Se estivéssemos na Índia, com o seu sistema de casta, diria que nós, os imigrantes sem documentos, somo os shudrás5, os membros da quarta e última casta dos peões que trabalham por comida e teto. Os invisíveis de todas as causas sociais.

Mais uma vez Obama demonstra que não tem autoridade moral para falar sobre Direitos Humanos quando deporta milhares de pessoas, aprova e sufraga aos imigrantes em trânsito em países como o México e o triângulo norte da América Central. Continuamos sendo os “sem documentos”, os invisíveis e os que mais apanham no drama da imigração forçada. Para outro dia o assunto sobre a falácia da ação executiva de Obama e a sua falida reforma imigratória.

Ilka Oliva Corado. @ilkaolivacorado.

29 de março de 2015.

Estados Unidos.

Notas:

1O Plan Frontera Sur foi anunciado no dia 7 de julho de 2014 pelo presidente mexicano Enrique Peña Nieto.

2Trem que transporta mercadorias do sul do México até cidades da fronteira com os Estados Unidos e é usado como meio de transporte de muito imigrantes sem documentos que procuram uma vida melhor.

3No dia 26 de setembro de 2014, 43 estudantes da Escuela Rural Normal de Ayotzinapa, estado de Guerrero, México, foram sequestrados e assassinados por sicários, com o envolvimento da policia local e do prefeito da cidade.

4Com o mesmo sistema do Plan Frontera Sur, este plano abarca território guatemalteco e hondurenho.

5Casta que corresponde aos servos e obreiros na sociedade da Índia.


Diário Liberdade é um projeto sem fins lucrativos, mas cuja atividade gera uns gastos fixos importantes em hosting, domínios, manutençom e programaçom. Com a tua ajuda, poderemos manter o projeto livre e fazê-lo crescer em conteúdos e funcionalidades.

Microdoaçom de 3 euro:

Doaçom de valor livre:

Última hora

Quem somos | Info legal | Publicidade | Copyleft © 2010 Diário Liberdade.

Contacto: info [arroba] diarioliberdade.org | Telf: (+34) 717714759

Desenhado por Eledian Technology

Aviso

Bem-vind@ ao Diário Liberdade!

Para poder votar os comentários, é necessário ter registro próprio no Diário Liberdade ou logar-se.

Clique em uma das opções abaixo.