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ngelo Pineda

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Fundamentos do nojo

Nem tudo é engraçado, nem desprezível

ngelo Pineda - Publicado: Domingo, 21 Fevereiro 2010 23:51

Ângelo Pineda

O mais desesperante dos debates ideológicos e políticos na Galiza é que não acostumam a ser demasiado argumentativos. Uma lástima. Também não é um tema cômodo, somos um país pequeno: todos e todas conhecemo-nos. 


Assim que falarei em psicologia. Mais concretamente dum senhor que admirava por ser um psiquiatra vermelho, mas que envelheceu mal e antes de morrer acabou por defender não sei que línguas comuns. Como não quero deitar a água suja da cuba e lançar a criança que se banhava dentro, referir-me-ei a Carlos Castilla Del Pino com a admiração que lhe professava antano. 

Foi há quinze anos aproximadamente que o meu pai, aficionado à psicologia, regalou-me um livro que juntava o seu “hobby” e o meu: Psicoanálisis y marxismo. A leitura foi difícil porque a argumentação era complexa e eu dispunha na altura duns conhecimentos excessivamente rudimentares sobre as duas disciplinas que Castilla Del Pino queria sintetizar. Contudo, quase por dever militante, impus-me a sua compreensão. Com paciência descobri reflexões muito estimulantes que deixaram rastro no pensamento de quem sou eu agora.

Uma das partes daquele livro que lembro com mais clareza é a que se refere à  alheação. Para Del Pino, a alheação caracteriza-se pela objetivação do sujeito ou pela subjetivação do objeto. Sei, parece difícil. Mas a primeira é mais ou menos o que entendemos por alheação no sentido marxista do termo, como não ser dono de si ou pertencer a outrem. No entanto, a subjetivação do objeto refere-se à percepção da realidade como um tudo homogêneo sobre a que se projetam os conflitos interiores da pessoa.

O psiquiatra andaluz, se não lembro mal, exemplifica esta última questão com dois casos: o do hipercrítico e o do humorista. O primeiro vira a realidade em objeto da sua crítica desapiedada. Todo o que passar pela peneira do seu juízo severo merece um rechaço imediato. O segundo, o humorista, apanha a realidade como objeto da sua chacota. Tudo é motivo de piada, incluso ele próprio quando o seu humor transgredir os limites do permissível.

Ambos os casos são mostras duma atitude defensiva. O hipercrítico, após da sua condena geral, acocha a incapacidade para agir na realidade ultrapassando aqueles aspetos dela que forem reprováveis. Porque nem tudo na realidade é desprezível. Como também, nem tudo na realidade é engraçado. O humorista põe-se a salvo de qualquer implicação mediante a sua ironia, e assim evita expor-se à incerteza e eventuais decepções que todo compromisso social comporta.

O prognóstico é  muito duro: a solidão. O hipercrítico racionaliza de modo cáustico a sua inação e acaba ilhado no seu delírio paranóico apesar do futuro exitoso que se lhe prometia. O humorista paga o seu não-compromisso também só: inclina-se cara a hábitos evasivos, e o seu humor emerge de vez em quando como um amargo rastro do passado no que era centro de atenção.

A moral do assunto é que a realidade é complexa e, sobretudo dinâmica. Não  é desprezível nem engraçada. Naturalmente há questões de injustiça que merecem ser superadas de maneira séria e outras que requerem a gritos uma brincadeira que oxigenar o ambiente. Mas na realidade, estamos em situações concretas que se têm que encarar desde a máxima: faz o que deveres, dentro do que puderes. Suponho que isto vale tanto para o plano individual, como para o coletivo.

Mas eu falo em psicologia... hem?


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