Um jovem perseguido pela polícia criminosa de Pinochet precisava embarcar para o México em busca de um futuro incerto onde pudesse continuar a lutar por seus ideais. Sem qualquer recurso financeiro sua família aceitou que eu ajudasse com algum dinheiro para o início da nova vida.
Eu também precisei sair depois de conseguir que meus filhos seguissem em segurança com o pai para o Brasil. Desfiz-me da casa e de tudo que a compunha com tanto encanto e conforto, trocando os móveis da sala por uma jaqueta de couro de cabra, que podia vestir sentindo-me no ar do campo entre animais confiáveis enquanto preparava a documentação para viajar pelo primeiro avião que fizesse escala em Santiago.
Entre os dois voos possíveis, para a França ou o Perú escolhi o mais barato de onde poderia chegar por terra ou rio ao Brasil. Perdi contacto com os amigos chilenos, uns presos, outros mortos, os de melhor sorte emigrantes para qualquer parte do mundo.
Quarenta anos passados, minha neta encontrou o irmão daquele jovem que fora para o México e desaparecera sem deixar rasto. Contou que o pai fora preso e depois vivera clandestino e que a mãe não conseguiu entregar o dinheiro que eu lhe dera para o filho. Com ele comprou um tear e aprendeu a fazer tapetes. Foi a sua solução financeira para sobreviver e uma terapia para suportar a perda do jovem. Passou o resto da vida tecendo e chorando, às vezes com esperança que a razão da sua vida se justificasse com a volta do filho querido.
Outros amigos ajudaram o filho mais velho a conseguir uma bolsa de estudo e ele pode garantir a subsistência da família amenizando o sofrimento dos pais. Eu fiquei comovida por ter participado, sem saber, do cordão solidário que acompanhou aquela família e permanecido no coração e na história de vida deles.