Organizada pelo historiador britânico e marxista Eric Hobsbawm, os diversos volumes da “História do Marxismo” reúnem diversos ensaios historiográficos referentes às distintas fases da evolução do movimento comunista e das ideias de Marx. Talvez seja interessante fazer menção rápida aos recortes temáticos e cronológicos dos vários volumes da coleção. Os marcos temporais partem do marxismo no tempo de Marx, o marxismo na época da II Internacional, o marxismo na época da III Internacional e o “Marxismo Hoje”, havendo nestes últimos volumes reflexões mais gerais sobre a importância do pensamento marxismo nos estudos sociais contemporâneos e balanços e perspectiva desta corrente política e de pensamento.
O volume VI a que tivemos acesso aborda o período que vai da conformação do Comitern ou III Internacional, até a conformação das frentes populares de combate ao fascismo, fortalecida, ainda que sempre com algumas hesitações, a partir de meados dos anos de 1930. As reflexões de cada artigo irão abordar: a questão do partido leninista, a origem deste modelo partidário, seus reflexos na revolução russa e suas antinomias em relação aos modelos de organização dos mencheviques, de León Trótsky e de Rosa Luxemburgo; as correntes constitutivas do movimento comunista internacional e, especificamente, da III Internacional; o fenômeno do comunismo de esquerda e debates subjacentes como o problema do “putschismo” (golpismo) ou as distintas políticas leninistas e esquerdistas acerca do parlamento e dos sindicatos; discute-se a revolução socialista abortada na Alemanha, com especial ênfase na percepção daquele levante dentro dos círculos dirigentes soviéticos; a bolchevização dos partidos comunistas europeus, iluminando aqui os reais vínculos e tensões entre o centro do Comitern e as direções locais dos partidos comunistas; a política da internacional quanto ao problema camponês; as táticas do movimento comunista frente ao perigo de guerra que culminou na II Guerra Mundial; a importância da virada na política externa soviética e do Comitern a partir do VII Congresso da III Internacional; e um estudo sintético sobre a composição política das diversas forças republicanas no contexto da Guerra Civil Espanhola.
Um elemento constante na leitura destes artigos refere-se ao esforço científico dos autores no sentido, não de fazer uma história “neutra”, mas de buscar evidenciar a complexidade das situações por meio de uma vasta análise das fontes históricas. Pela vastidão de fontes e pela proposta de analisar as questões em suas complexidades podemos dizer que se trata de uma história crítica do marxismo. Trata-se de textos voltados ao debate historiográfico e que, à medida que aprofundam as análises, os autores conseguem desmistificar algumas passagens da história que são reiteradas sob bases parcialmente ou inteiramente falsas. Um exemplo nesse sentido é o estudo da composição política da terceira internacional e das relações entre o Comitern e as diversas seções nacionais partidárias. Estamos habituados a ler ou escutar como a III Internacional fora um mero instrumento de aplicação mecânica dos interesses soviéticos nas distintas realidades nacionais. Fala-se do monolitismo político da III Internacional e da subordinação dos interesses da revolução mundial aos interesses de estado da URRS.
Uma análise mais detida deste problema revela que, particularmente em seus primeiros anos, a III Internacional tinha uma composição bastante heterogênea. De fato, entre 1918-1919, Lênin elencou em cada nação movimentos, organizações ou partidos que teriam maior compatibilidade com a III Internacional. (Foram cerca de 20 ao todo). Certamente, estas organizações se diferenciavam do reformismo dos partidos social-democratas da II Internacional, muitos tendo origem justamente como cisão no momento em que os velhos partidos de esquerda da Europa capitulavam ante o chauvinismo, entrando em governos ou votando créditos para a I Guerra Mundial. Mas dentro deste espectro de oposição ao reformismo e ao chauvinismo da II Internacional, havia desde movimentos anarco-sindicalistas, até organizações comunistas locais que em muito pouco lembravam (no que se refere à organização, tática e estratégica) o modelo bolchevique.

Pesquisar a história do marxismo envolve estudar suas manifestações na história ora como corrente de pensamento (filosófico, político, econômico e sociológico) ora como movimento real dos trabalhadores em levantes, revoluções ou guerras civis. Buscar apurar o que há de mais avançado nesta corrente de pensamento, bem como avaliar os erros e acertos do passado certamente conduzirão os comunistas a intervirem na realidade de forma mais qualificada e segura. Daí a importância deste vasto trabalho de pesquisa da História do Marxismo.