Um ano é muito tempo, muitos milhares morrem, outros muitos milhares nascem, mudam-se as culturas, muda-se de vida. Em trinta anos, perde-se uma geração, ganha-se outra. Em trinta anos, no nosso País, ninguém ainda pensou como prevenir, como evitar, como reduzir, como tornar os incêndios que assolam o País nos verões de trinta anos, mais controlados. Em trinta anos, tudo se mudava! Mudava-se a forma de ver as florestas, a forma de replanear as aldeias, a forma de proteger as serras e os montes, a forma de combater os incêndios. Os incêndios não se combatem quando estão fora de controlo! Aí, quando muito, faz-se uma gestão de probabilidades, não é segredo; aguarda-se os aviões, protegem-se as casas quando possível e mentalmente vai-se deixando cair a noite, temperaturas mais baixas, baixas pressões. Os incêndios combatem-se ainda antes de eles acontecerem, estudam-se, prevêem-se, tomam-se medidas para que não aconteçam. Mas em Portugal isso não interessa. Em trinta anos, não houve interesse.
A razão é porém, fácil de entender.
Todos os anos o Estado gasta milhões de euros a combater incêndios. É uma conta-corrente anual. O Estado que o CDS-PSD tanto critica e de que o PS fez parte, serve o regime e o sistema, pagando e gastando em vez de ser racional e investir em medidas que reduzissem os gastos anuais, ano a ano, menorizando os sofrimentos das populações, defendendo os animais e as culturas agrícolas, a floresta que ainda resta neste País. É que planear custa muito e como é para futuro, não dá resultados imediatos. Por vezes as populações não entendem as mudanças, porque ninguém explica, porque não se educa nas escolas e porque não existem programas de esclarecimentos. O Estado abandonou as aldeias, votou-as á solidão e á desertificação, não pergunta o que está mal e qual a sugestão para se mudar. Não confia nas pessoas!
Escolheu, no entanto, investir no combate a incêndios, na compra de autotanques topos de gama, distribuindo jeeps e carros de apoio, com mapas e computadores, centrais nervosas que as televisões demostram em imagens de drama e espetáculo.
Usa e abusa de milhares de Bombeiros voluntários, homens e mulheres que pela sua abnegação e espírito de sacrifício, como uma forma de substituição ao que devia ser uma verdadeira força profissionalizada, adequada á demografia do País, sem estrangulamento de verbas, bem apoiada e com recursos que acompanhassem o planeamento da irradicação de incêndios florestais em Portugal. Claro que, ter Homens e Mulheres voluntários, torna a situação mais aceitável, não se paga salários a não ser nas épocas de incêndios, não se paga impostos sobre esses vencimentos, não se paga segurança social sobre esses vencimentos.
Os Bombeiros, associaram-se em sociedades privadas de serviço público, esse hibrido estado que o Estado criou para estes casos, dependem de verbas do Estado, uma espécie de compensação pelo esforço, um prémio de consolação, que nas mãos dos financeiros e economistas, sofre sempre de atrasos, reduções de verbas etc. etc.
É fácil de ouvir, durante o Inverno, corporações de Bombeiros com falta de dinheiro para pagar salários, combustível e reparações de viaturas. Mas não há problema! Lá vem o verão em que, a necessidade do Estado assim obriga, as contas são sempre pagas.E nestes trinta anos de incêndios, a coisa contínua igual, há sempre algo para esses Homens e Mulheres valorosos lutarem, um novo quartel, um novo autotanque, uma coisa desse género.
As populações criticam os Bombeiros, os aviões, os autotanques. Nas horas de tragédia e desespero, são estes Homens e Mulheres que estão na linha da frente, que ouvem os desabafos que amparam o choro, que aguentam as más palavras, os insultos.
São estes os Homens e Mulheres que são usados para iludir e disfarçar a falta de investimento nos planeamentos e prevenções, a falta de dever de cuidar que um Estado surdo e cego, impõe ao seu próprio povo, a falta de responsabilidade e de valor humano e ambiental, a falta de investimento no próprio território com uma reflorestação cuidada e planeada, com as espécies que realmente fazem parte da nossa fauna e flora.
São trinta anos que eu me lembre mas eu sei que são mais. São três décadas de abandono seletivo, de escolha da urbe capitalista e elitista das quintas da marinha em detrimento das populações e do povo. São trinta anos de uso a floresta para lucro fácil, sem grande risco e investimento, para untar a beiça da madeira barata sem preocupações ambientais, de ganancia criminosa, de doentes mentais abandonados pelos serviços de saúde e não monitorizados, apesar de na maioria das vezes ser do conhecimento geral.
Um dia, acordaremos, tenho a certeza! Um dia, quando a floresta definhar completamente, quando as pessoas se cansarem de darem o corpo e a vida para serem apenas um artifício do Estado, quando as populações exigirem medidas reais e práticas que as defendam das tragédias que todos os anos lhes batem á porta; quando o povo acordar, tudo irá mudar.
Um Estado que apresente um plano de dois ou três anos, com apoio dos militares e da engenharia, com o apoio dos técnicos agrícolas, com o apoio das populações, dos proprietários, etc., uma verdadeira luta nacional contra esse flagelo que nos leva a vida de todas das formas, um verdadeiro programa de reflorestação.
Um programa de educação preventiva, sessões de esclarecimento, limpezas de propriedades compulsivas, dar mais orçamento às Juntas de Freguesia para ter os seus próprios programas de prevenção de incêndios, criar zonas de interesse nacional e protegê-las, enfim, tanto mas tanto a fazer.
Imaginem se em três anos, reduzisse-mos os incêndios para não mais que zonas desertas com pouca área ardida, com um País mais preparado, com um País reflorestado, com zonas verdes, com florestas de castanheiros, carvalhos, nogueiras, oliveiras e outras espécies que fazem parte do nosso ecossistema. Não é pedir muito, ou será?Um dia, fomos para lá do mar, talvez ainda tenhamos alguma coisa que mostrar ao mundo!Não sei se serão precisos mais trinta anos ou não!
Oxford 10-07-2013