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Carlos Taibo

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Queda do império

Mesas de Convergência: Por que não assinei?

Carlos Taibo - Publicado: Quinta, 24 Fevereiro 2011 01:00

Carlos Taibo

Sabido é que no passado dia 19 de fevereiro se realizou em Madri uma concorrida reunião que pretendia ser o sinal de partida de um projeto ambicioso: as mesas de convergência.


São vários os amigos que me perguntaram se subscrevi a convocação correspondente, como são vários os que, sabedores de que não o tinha feito, desejaram conhecer minhas razões. Tento explicá-las a seguir, não sem antes expressar duas cautelas. Se a primeira me obriga a certificar que entre os promotores das mesas há gentes respeitáveis, pessoas ingênuas e carreiristas genuínos, a segunda reclama que sublinhe que meu juízo destas horas diz exclusivamente respeito ao sentido geral da convocação, e não prejulga o que esta, com o passar do tempo, possa dar de si.

1. Começarei assinalando que a proposta programática exposta na convocação que nos ocupa tem um não ocultado caráter social-democrata. Não aspira a nada mais que a reconstruir a regulação perdida e, com ela, a preservar nosso maltrecho Estado do bem-estar. Em tal sentido dá nas vistas que os promotores das mesas se autodescrevam com frequência como antineoliberais e eludam visivelmente o termo anticapitalistas. Com estes espasmos de moderação, esperam ganhar para a causa da mobilização muitos votantes socialistas ou será que, de maneira mais plana, não vêem nenhum horizonte fora do capitalismo? As pessoas que seguimos sublinhando que há que ir para além da contestação do neoliberalismo, é comum que se nos diga que somos uma vanguarda sem seguidores. Contornarei agora a réplica que a afirmação anterior merece para sublinhar a que surge é evidente: quem defende os termos resenhados estão nos lançando o mesmo argumento que os prebostes do PSOE utilizaram contra eles durante os três últimos decênios. Creio firmemente, de qualquer maneira, que um programa de mínimos não tem por que ser um programa social-democrata.

2. A condição hipermoderada do diagnóstico e da proposta apresentada nas mesas guarda muito estreita relação com a ausência, em um e em outra, de qualquer consideração, nem que fosse séria ou liviana, da crise ecológica. Que patético é, ao respeito, que a estas alturas os promotores dessa iniciativa continuem falando de desenvolvimento sustentável. Permita-se-nos sublinhar o que com o passar dos meses se irá fazendo a cada vez mais evidente: hoje é a constância da profundeza da crise ecológica o que promove em lugar principal --junto com a contestação, claro, da dimensão de exploração, exclusão e hierarquização do capitalismo-- uma contestação franca a inevitável deste último.

3. Num terreno mais conjuntural, o que mais destaca no argumentário que se fez valer para justificar a criação das mesas é uma surpreendente, e frequentíssima, tentativa de exculpar os sindicatos maioritários uma vez certificada sua conduta das últimas semanas. Devo confessar que neste caso me equivoquei quando, no final de janeiro, concluí que o acordo subscrito por esses sindicatos com o Governo espanhol tinha ao menos a virtude de deixar as coisas claras no que diz respeito à lamentável condição dos primeiros. Vejo agora que de  círculos antineoliberais, que lançam aos quatro ventos suas mesas num local de Comissões Operárias, se emitem opiniões que desmentem o bom sentido de meu apreciação. Aí estão as que assinalam que os sindicatos fizeram o que puderam, ou as que asseveran que ao cabo o acordo atingido --o pensionaço-- não é tão mau. Entre o catálogo de opiniões patéticas enunciadas há, com tudo, uma que salienta: a que sugere que os sindicatos maioritários não puderam fazer mais devido à sua escassa capacidade de mobilização. Como se esta última não fosse a consequência inevitável de muitos anos de renúncia à luta e à contestação, quase tantos como os que marcaram a submissão às políticas oficiais e a dependência relativamente aos recursos públicos (alguém tem conhecimento, já agora, da existência de demissões, nas últimas semanas, entre os quadros de CCOO e UGT?). Não faltou nestes dias, em soma, alguma estéril elucubração sobre o venturoso papel que têm de desempenhar no futuro as bases desses sindicatos. Há quem, ao que parece, prefira olhar para outro lado; é, evidentemente, mais cômodo que assumir uma autocrítica em toda regra.

4. Devo recordar, enfim, o que alguns parece que não sabem: entre os convocantes das mesas há pessoas que não duvidaram em apoiar de maneira franca o pensionaço. Que semelhantes pessoas não tenham nenhum problema em se somarem a esta iniciativa diz muito de sua condição, como o diz da de quem acolhe estas pessoas sem maior problema. A conclusão parece servida: um pode apoira o pensionaço e se manter cômodo, no entanto, dentro das hostes antineoliberais. Para calibrar que é o que pensam muitos de quem se opuseram ao acordo subscrito por Governo e sindicatos maioritários recomendo encarecidamente a leitura do foro que seguiu a uma entrevista a Fernández Toxo, difundida pelo diário Público. Não parece que a esmagadora maioria dos que participaram nesse foro possam sentir maior simpatia pelo que propõem os promotores de uma iniciativa que, ao menos em sua formulação inicial, se caracteriza por sua nula vontade de questionar de raiz as misérias que hoje nos assediam.

Fonte: Nuevo Desorden.

Tradução: Diário Liberdade.


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