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230313 a vida e bela cItália - PGL - [José Paz Rodrigues] É curioso, e contudo razoável, que na mesma data coincidam os dias da árvore, do começo da primavera e o dia da poesia. Os três temas têm muitos pontos em comum. Desde 2001, por proposta da UNESCO, celebra-se no mundo, todos os 21 de março de cada ano, o Dia Internacional da Poesia.


Para comemorar esta importante data, e fomentar entre os estudantes o amor pela poesia, educando a sua sensibilidade, escolhi um dos filmes mais poéticos de toda a filmografia mundial, «A Vida é Bela», realizado em 1997 por Roberto Begnini e premiado em numerosos festivais, ademais de obter três óscares. A poesia é, junto com a música e a plástica, uma das matérias mais importantes para educar a sensibilidade das crianças, dos adolescentes e dos jovens. À qual teríamos que dar muita mais importância nos currículos escolares e em todos os níveis educativos.

Já o temos comentado em anteriores ocasiões. Deveríamos preocupar-nos mais com as aprendizagens apreciativas, que são as que têm que ver com a afetividade, as emoções e os sentimentos. Estas aprendizagens são tão importantes, que configuram o meio e a motivação nos educandos para adquirir depois as outras, as racionais, associativas e psicomotoras. As áreas artísticas deveriam ter portanto muito mais peso, dedicando-lhes muito mais espaço e tempo nas aulas e estabelecimentos de ensino. Porém, infelizmente, acontece todo o contrário. Porque os desenhadores do currículo têm ausência da sensibilidade precisa e não são conscientes de que ao longo da história foram os grandes pedagogos e as suas escolas os que valorizaram na sua justa medida as artes. Por isso precisamente ficaram na memória pedagógica e nos manuais da história da educação. Estamos a pensar em Platão na cultura grega e nos pedagogos renascentistas como Vittorino da Feltre. Também nos pedagogos das escolas novas: Reddie, Geheeb, Cossio, Freinet, Tagore, Rodari...

Em pleno século XXI não deixa de surpreender que neste tema do cultivo da poesia fossem muito mais sensíveis as antigas culturas orientais como a chinesa, e a grega clássica ateniense. Na China antiga as matérias mais importantes do ensino eram a música, a cerimónia e... a poesia! Em Atenas música e poesia tinham grande importância, as leis ditavam-se cantando, as crianças tinham que aprender a tocar a lira e a recitar os versos homéricos. A beleza e a educação estética ocupavam, com justiça e razão, um lugar preeminente. Como deveriam ocupá-lo agora nos tempos atuais, tão necessitados daquilo que se alcança por meio do exercício das diferentes artes nas aulas de ensino infantil, primário e secundário. Por isso têm muita razão os docentes de secundária que se manifestam para que não sejam reduzidos os tempos escolares para estas áreas. As mães, pais, políticos da educação e a todos os cidadãos, queremos dizer-lhes bem em alto que as crianças quando brincam não estão a perder o tempo, que os rapazes da primária e ESO não perdem o tempo quando desenvolvem atividades relacionadas com a música, as artes e a poesia. Antes polo contrário, estas são as áreas mais importantes para a vida futura das pessoas, pois têm um alto valor de transferência, para conseguir outras aprendizagens.

Na casa, nas escolas, nos meios de comunicação, deve fomentar-se o amor e o apreço pola música, pola plástica e, especialmente, pola poesia. Como? Pois organizando recitais poéticos, festas e festivais de poesia. Em que tenham cabida os clássicos castelhanos e galego-portugueses como os jograis medievais, Garcilaso, Lope, Góngora, Bécquer, Rosália, Curros, Pondal, Camões, Pessoa, Teixeira, Torga, Drummond de Andrade, Cecília Meireles, Machado, Jiménez, Alberti, Gabriela Mistral, Neruda, Celso Emílio, Manuel Maria, Avilês... E entre os estrangeiros as traduções de Tagore de O jardineiro, A lua nova e Oferenda lírica, as obras de Dante e Petrarca e também Rimbaud, Whitman e Senghor.

Claro que muito mais importante é desenvolver a criatividade poética entre os rapazes. Para isso é necessário criar um clima apropriado para que todos possam expressar-se por meio da poesia. Organizando concursos, elaborando blogues no computador, publicando os jornais escolares e neles os poemas dos estudantes, e participando, por exemplo, com as suas coplas, na formosa festa popular dos Maios. Que, por desgraça, os nossos ilustrados políticos municipais tiveram a feliz ideia de mudá-la da data que lhe correspondia. E, por isso, agora são muito poucos os estabelecimentos de ensino a participarem na mesma.

 

 

Ficha técnica do filme:

Título original: La Vita é Bella (A Vida é Bela / La Vida es Bella).

Diretor: Roberto Benigni (Itália, 1997, 116 min., a cores).

Roteiro: Vincenzo Cerami e Roberto Benigni.

Música: Nicola Piovani. Fotografia: Tonino Delli Colli. Produtora: Melampo Cinematográfica.

Atores: Roberto Benigni (Guido), Nicoletta Braschi (Dora), Giorgio Cantarini (Giosué), Giustino Durano (O Tio), Sérgio Bini Bustrie (Ferruccio), Marisa Paredes (mãe de Dora), Horst Buccholz (Dr. Lessing), Lídia Alfonsi (Guicciardini), Giuliana Lojodice (A Diretora), Amerigo Fontani (Rodolfo), Pietro de Silva (Bartolomeo), Francesco Guzzo e outros.

Prémios: Óscar de 1999 ao melhor filme estrangeiro, melhor ator e melhor trilha sonora. Grande Prémio do Júri de Cannes (1998), «César» ao melhor filme estrangeiro (França, 1999), prémio Goya ao melhor filme europeu, Grammy de EUA, Academia Japonesa de Cinema (2000), melhor ator no BAFTA do Reino Unido (1999) e Prémio David de Donatello ao melhor ator, fotografia, figurino, diretor, filme, produção, cenografia e roteiro (Itália, 1998).

Argumento: Estamos em Arezzo no ano 1939. Na Itália durante a Segunda Guerra Mundial, Guido Orefice, um homem procedente da região toscana, com muita inocência, alegria e vitalidade, deixa a sua aldeia para procurar fortuna na cidade. O seu grande sonho é reger uma livraria. Nesta aventura está acompanhado polo seu amigo e poeta Ferruccio. Logo chega o amor ao coração de Guido. Ela é Dora, uma mestra da escola local que em seguida se converte na sua admirada princesa e esposa. Transcorrem cinco anos quando também na Itália entram em vigor as terríveis leis raciais nazis e descobrem que Guido é de origem judaica e, como consequência, o casal e seu filho de cinco anos, sem justificação alguma, são deportados ao inferno de um campo de concentração nazi. A partir deste momento, Guido, há tratar de salvaguardar a saúde e a integridade dos seus seres mais queridos, sua esposa e seu filho, por meio de um jogo e de brincadeiras, envolto numa fábula, produto da sua fantasia e criatividade que finalizará obtendo «um primeiro prémio» muito formoso e valioso: a Vida. A de seu filho e da sua esposa.

Poesia, vida, beleza, paz e amor num filme de grande sensibilidade:

O protagonista, e também diretor deste filme, comunica-se com os seus seres mais queridos não só por meio da expressão verbal, como também da não-verbal com gestos, olhares e acrobacias. Este filme tão sensível e extraordinário apresenta infinidade de valores humanos e sociais: o amor e apreço pela vida, a liberdade, o respeito, a tolerância, a dignidade, a generosidade, o diálogo, a amizade, a justiça, a poesia, a beleza das pessoas e da natureza, a paz, o amor em todas as suas facetas, a esperança, as relações humanas positivas, a alegria, o diálogo paterno-filial e materno-filial. Valores estes contra a desesperança, a violência, o racismo, o egoísmo, a incomunicação, o ódio, a intolerância, a miséria, o belicismo, a indignidade e a injustiça. As diferentes personagens que aparecem neste filme genial são verdadeiros paradigmas dos valores ou contravalores antes citados. Guido simboliza a liberdade, a generosidade, a autenticidade, a vitalidade, o amor, a dignidade, o sacrifício e a criatividade. O seu filho Giosué, reflete a infância, a alegria, a fantasia, a inocéncia, a pureza, o amor e a singeleza. Dora, mãe e esposa, representa o amor verdadeiro, a fortaleza, a luta, a entrega, a generosidade e o sacrifício. O tio de Guido amostra a elegância, a franqueza, a dignidade, o respeito, a integridade, a bondade e a tolerância. O prometido de Dora é o vivo exemplo da intolerância, a insolidariedade, a falsidade, a injustiça, a hipocrisia e o fanatismo fascista. O doutor alemão Lessing representa o interesse mesquinho, o egoísmo, o medo, a insegurança, a intolerância e o engano.

O filme tem duas partes bastante diferenciadas. Na primeira, a luta de Guido para conquistar seu amor Dora (interpretada curiosamente pela própria esposa do ator e diretor, na vida real) Na segunda a luta pela sobrevivência da sua família durante a guerra mundial. Guido é o típico emigrante, sonhador e empenhado em suas decisões, vindo do campo para a cidade. De uma forma pouco convencional conhece Dora, pela que começa a apaixonar-se, depois de vários encontros casuais, e outros não tão casuais, entre os dous, com momentos fantásticos quase próximos à magia. Esta primeira parte é realmente atrativa e muito gostosa de ver. Tudo acontece na Itália, com uma fotografia com cores fortes e vivas, mesmo pela noite. Dá detalhes da vida e de onde mora, aprofundando mais na apresentação da personagem. Ao final desta parte sabemos que Guido é judeu, o que acentua ainda mais o romance entre ele e a italiana Dora, a que carinhosamente chama «Princesa». Essa primeira parte acontece durante o ano 1939, antes de explodir a guerra e os judeus serem caçados pelas hordas do nazi alemão Hitler.

Na segunda metade o drama é muito mais intenso, e a ironia está mais presente. Com localização ainda na Itália e com a duração do período bélico, Guido e seu filho Giosué são levados à força a um campo de concentração nazista, junto também com seu tio. Guido tenta, de todas as maneiras possíveis, proteger o seu filho de tudo o que está acontecendo ao redor. Ele inventa uma história, uma fábula ou fantasia, para que o seu filho acredite que tudo o que está a passar-se é apenas um jogo, protegendo-o de toda a maldade que ronda uma guerra, e é em torno disso que se desenvolve esta segunda parte do filme. Tudo é uma fantasia, todas as cenas têm dous significados: o real e o inventado por Guido. Para criar sensações adequadas nesta parte a fotografia é mais escura, com menos colorido, pessimista, transmitindo a dor e o sofrimento, também pelas expressões faciais dos atores. Porém, mesmo assim, Guido continua com as suas fantasias e o toque de humor caraterístico, apesar da situação não ser precisamente romântica. Estamos perante um filme tão sensível e tão poético que realmente merece ser olhado por todos, por docentes e estudantes de todos os níveis.

No filme há sequências verdadeiramente sublimes, entre as que quero destacar as seguintes:

1.- Giousué: Papá, porque é que os judeus e os cães não podem entrar?

Guido: Pois porque aqui não querem judeus nem cães. Cada um faz o que lhe parece!... Aí há uma loja onde não deixam entrar nem cavalos, nem espanhóis...

Giousué: Mas, nós deixamos entrar a todos na nossa loja de livros!

2.- De caminho para um mundo imaginário (o campo nazi):

Giousué: Papá, aonde vamos?

Guido: Hoje é o teu aniversário. Não me contaste que querias fazer uma viagem fantástica? Custou-me muito organizá-la!

Giousué: Quando vai terminar o jogo, papá?

Guido: Há que chegar a mil pontos! Quem ganhar há levar como prémio um carro de combate!

3.- Perante o horror do campo nazi:

Giousué: Aonde foste?

Guido: Ah... já te contei, tinha que terminar a partida de bisca...!

Giousué: Fazem botões, e sabão... Queimam-nos a todos nos fornos...

Guido: Quem te contou isso?

Giousué: Um homem que se pôs a chorar e nos disse que fazem connosco botões e sabão.

Guido: Connosco... com a gente... fazem botões... claro, e com os russos fazem correias e com os polacos suspensórios!... Botões e sabão... Ouve, amanhã eu lavo as mãos com o Bartolomeu, abotoo o casaco com o Francesco e penteio-me com o Cláudio.

Giousué: Queimam-nos no forno!

Temas para fazer, debater e refletir:

Depois de ver este belo filme, organizar com os estudantes um cinema-fórum e debate-papo sobre os diferentes temas que se apresentam no mesmo, as personagens, os valores e contravalores humanos, os aspetos cinematográficos: espaço, tempo e movimento, os planos, os travellings, as panorâmicas horizontais e verticais e as diferentes mensagens que o diretor tenta transmitir-nos, depois de visionar o filme.

Organizar atividades lúdicas e artísticas nos estabelecimentos de ensino dos diferentes níveis, arredor do dia internacional da poesia: recitais poéticos (de poemas escritos pelos estudantes e de poemas de destacados poetas do mundo), murais com poemas escritos polos alunos, ilustrados com fotografias e desenhos, elaboração de coplas (por exemplo para a festa popular dos Maios), leituras públicas, dramatizações, diálogos e audições de poemas recitados por intérpretes e pelos próprios poetas, se for o caso. Levar aos diferentes estabelecimentos de ensino poetas locais vivos, para falar do seu labor e recitar as suas poesias.

Organizar uma dinâmica de grupos (por exemplo, o «Philips 66») para tirar conclusões do seguinte texto a ler de forma pública e a viva voz na aula:

«Bati à tua porta. Bati ao teu coração. Para ter uma boa cama, para ter um bom fogo. Porque não me aceitas? Abre-me irmão! Porque me perguntas se sou da África, se sou da América, se sou da Ásia, se sou da Europa? Abre-me irmão! Porque me perguntas sobre o tamanho do meu nariz, a grossura dos meus lábios, a cor da minha pele e o nome dos meus deuses? Abre-me irmão! Não sou preto, não sou vermelho, não sou amarelo, não sou branco, mas um homem! Abre-me irmão! Abre-me a tua porta! Abre-me o teu coração, pois sou um homem, um homem de todos os tempos, o homem que se parece contigo e todos juntos podemos fazer um mundo melhor».


José Paz Rodrigues é académico da AGLP, didata e pedagogo Tagoreano.


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