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ankaraTurquia - Diário Liberdade - [Alejandro Acosta] No dia 10 de outubro aconteceram dois brutais atentados terroristas, em Ankara, a capital da Turquia, a apenas três semanas das eleições nacionais.


Manifestação em memória das vítimas do massacre de Ancara. Foto: Jonny Dickens (CC BY-NC-ND 2.0)

Os atentados tiveram como alvo uma manifestação do Partido Democrático do Povo Curdo, o HDP. Dois terroristas suicidas detonaram poderosas bombas em duas saídas da principal estação de trens. O saldo de mortos ultrapassa os 130 e o de feridos supera os 200.

Esse atentado guarda bastante similaridade com o atentado que aconteceu no dia 20 de julho em Suruc, quando ativistas curdos se dirigiam em direção à cidade de Kobani, localizada na Síria, perto da fronteira, palco de fortes combates entre os curdos e o Estado Islâmico. Anteriormente, no mês de junho, em outra manifestação do HDP, que aconteceu dois dias antes das eleições nacionais de junho, um atentado similar aconteceu em Diyarbakir.

O atentado representa uma resposta à uma mudança da situação política. A Administração Obama passou do apoio aos “rebeldes moderados” sunitas para o apoio aos curdos. A solução Obama-Putin-Irã na Síria contraria os interesses da Turquia, em primeiro lugar, e da Arábia Saudita e dos sionistas israelenses a seguir, estes últimos aliados estreitos da extrema-direita norte-americana.

A aviação turca não consegue mais dar cobertura aérea ao Estado Islâmico e aos demais “rebeldes” devido à interferência russa. Existe a perspectiva da derrota do AKP (Partido da Justiça e do Desenvolvimento) nas eleições que acontecerão em novembro.

As monarquias do Golfo Pérsico e os sionistas israelenses tentam chegar a um acordo para impedir que a situação saia de controle. Netanyahu já manteve um encontro com Putin, colocando como linha vermelha o repasse de armas russas à milícia libanesa Hizbollah. Reuniões de alto nível aconteceram entre Putin, e as monarquias dos Emirados Árabes Unidos e da Arábia Saudita.

Qual foi o objetivo dos ataques?

O primeiro-ministro turco, Recep Tayyip Erdogan, chamou novas eleições após não ter conseguido a maioria necessária para estabelecer um governo forte nas eleições de junho. O partido oficial, o AKP, perdeu votos principalmente para o HDP curdo, que obteve mais de 12%, e para a direita turca.

Com o objetivo de “estornar” esses votos para o AKP, Erdogan ordenou a quebra da trégua com o PKK (Partido dos Trabalhadores), a milícia curda que luta pelo direito à autodeterminação desde a década de 1980. O PKK tinha participado ativamente, junto com o YPD (as milícias dos curdos sírios) os pershmengas (os curdos iraquianos) e a aviação norte-americana, na derrota do Estado Islâmico na cidade de Kobani.

O cálculo da liderança do AKP ao atacar o PKK era reduzir o apoio ao HDP, que tinha concentrado também parte dos votos de setores da esquerda turca, e da extrema-direita que tinha crescido em cima da campanha contrária aos acordos de paz promovidos por Erdogan. O governo de Erdogan, ao mesmo tempo, aderiu à frente única da Administração Obama, permitindo o uso de bases aéreas na Turquia e promovendo o ataque a alvos do Estado Islâmico, e também curdos, pela própria aviação. Essa política tinha como objetivo reduzir o papel dos curdos e minimizar o potencial do apoio da ala “esquerda” do imperialismo (Obama, Merkel, Hollande) à formação de um estado curdo.

As contradições do governo Erdogan têm aumentado não somente com os curdos, mas também com o Estado Islâmico, com quem mantinham uma relação incestuosa, assim como com as monarquias do Golfo Pérsico. O fortalecimento da presença russa e o início dos bombardeios pela aviação russa, colocaram em xeque a política de Erdogan de “criar uma zona buffer (alívio)” na região fronteiriça, nos moldes do que tinha sido feito na Líbia. Os russos alocaram os mísseis S-300 na Síria para impedir os “excessos” da aviação turca e sionista.

O ataque terrorista do Estado Islâmico coloca em xeque o próprio partido de Erdogan, o AKP, cujos militantes têm atacado as sedes do HDP acusando-o de terrorismo. O objetivo do AKP era restringir as votações nas regiões curdas alegando ameaça de confrontos com o PKK, inclusive com o eventual remanejamento de urnas.

Os "instáveis" aliados turcos

A política de Erdogan para o Oriente Médio ficou ameaçada principalmente após 2013, quando mudou a tradicional “neutralidade” turca para buscar a deposição de al-Assad na Síria.

A Turquia representa uma potência regional de primeira ordem no Oriente Médio. Mas as contradições existentes entre os próprios interesses e os das demais potências regionais e imperialistas têm provocado o acirramento das contradições e o vaivém da política turca. Isto pode ser observado principalmente em relação à Rússia e ao Irã, a Israel e à Arábia Saudita. As contradições com os chineses também têm aumentado devido às relações e ao apoio do governo Erdogan a vários grupos “rebeldes” na região norte da Síria, como os grupos guerrilheiros islâmicos provenientes da Ásia Central e os Uyghur, da instável província ocidental da China.

O que resta ser analisado, e depende da análise posterior da evolução da situação política, é se o atentado foi apenas uma ação do Estado Islâmico, ou se houve o envolvimento de algum dos outros apoiadores desse grupo que tinha interesse em debilitar a Turquia e fortalecer a extrema-direita. A Arábia Saudita e a extrema-direita norte-americana aparecem como os suspeitos número um, mas ainda é cedo para afirmá-lo. Há o interesse em comum de desenvolver o lucrativo gasoduto Qatar/ Arábia Saudita/ Síria/ Turquia em direção à Europa, o que inclusive está na base da intervenção dessas potências regionais na Síria.

A Turquia está se transformando em mais um ponto fraco na desestabilização do Oriente Médio, e se trata de um país membro da OTAN, que detém armas atômicas e que conta com uma posição estratégica de primeira ordem. Depende do acordo entre a Administração Obama e as monarquias do Golfo aumentar a pressão sobre o governo Erdogan suspendendo o financiamento de US$ 60 bilhões anuais do déficit público anual e os US$ 300 bilhões da dívida externa turca.

Alejandro Acosta é cientista social, colaborador do Diário Liberdade e escreve para seu blog pessoal.


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