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15024486408 13e1831337 zPaísos Cataláns - Diário Liberdade - [Alejandro Acosta] Qual é o significado da declaração de independência da Espanha pelo Parlamento Catalão?


Foto: SantiMB.Photos (CC BY-NC-ND 2.0)

No dia 9 de novembro, o Parlamento da Catalunha aprovou, por 72 votos a favor que venceram os 63 contrários, uma resolução que proclamou o início do processo na direção da independência, a decisão de desobedecer as instituições do Estado espanhol, a começar pelo Tribunal Constitucional. A Generalitat deverá obedecer somente as leis aprovadas pela Câmara autonômica.

O direitista PP (Partido Popular) e o novo direitista reciclado, o Cuidadanos, tentaram impedir a sessão no Tribunal Constitucional, mas não o conseguiram.

A reação do governo espanhol foi a petição do parecer jurídico do Conselho do Estado. Um Conselho de Ministros Extraordinário deverá aprovar a inconstitucionalidade do processo. Em resposta, o governo de Artur Mas e os dois partidos que formam a base de apoio, o Junts pel Sí e a Cup, buscam aprovar três leis, no prazo de um mês, para se contrapor ao governo da Espanha: a do processo constituinte, a da Seguridade Social e a da Fazenda Catalã.

O processo aberto pode conduzir à declaração da independência em 18 meses.

O enfraquecimento do imperialismo espanhol provavelmente lhe impedirá de ir muito longe nas medidas punitivas, como suspender a autonomia da Catalunha ou tomar o controle direto do governo comunitário, o que poderia ser feito com a Constituição imperialista em vigor. Essas medidas poderiam exacerbar ainda mais as tendências separatistas na Espanha e, ainda mais, na Europa.

A política mais provável deverá ser a imposição progressiva de sanções econômicas com o objetivo de fazer colapsar o governo. O governo da Catalunha enfrenta um déficit de 2,3 bilhões de euros e pediu um empréstimo ao governo central. De acordo com o Ministério da Economia, o governo central emprestou ao governo da Catalunha 37 bilhões de euros desde 2012. E a crise e o endividamento público continuam aumentando.

Um parlamento independentista

As eleições do dia 27 de setembro foram muito influenciadas pelas gigantescas manifestações independentistas do dia 11 de setembro, a “Diada Nacional de Catalunya”. Os independentistas obtiveram 47,86% dos votos e 72 vagas no Parlamento (62 de Junts pel Sí e 10 de CUP) contra 39,08% e 52 vagas para o voto pró-imperialista (25 de Ciudadanos, 11 do PP e 16 do PSC). A CUP, que participa da chamada esquerda anti-capitalista, foi quem mais cresceu, de 3 para 10 deputados, com 8,21% dos votos, é a força que garante a maioria absoluta independentista no novo Parlamento da Catalunha, e a base de apoio do governo de Mas.

O papel de Podemos (CatSíqueesPot), o Syriza espanhol, tem ficado a reboque do imperialismo, mas com um peso muito pequeno. Apenas conseguiu eleger 11 vagas em aliança com a Iniciativa per Catalunya (a Izquierda Unida catalã).

O papel do Ciudadanos foi reciclar a direita neoliberal e se transformou na principal força conservadora com 25 deputados. O PSC (social-liberal), perdeu quatro deputados e ficou com 16. O PP, do primeiro-ministro Mariano Rajoy, perdeu sete deputados, ficando com 11.

A convocatória de um plebiscito específico não foi permitida pela Espanha.

Crise do imperialismo espanhol, crise do imperialismo europeu

O processo independentista na Catalunha tem aberto uma crise enorme no decrépito imperialismo espanhol e também para o imperialismo europeu. Cria um precedente crítico no Estado espanhol e na Europa onde a opressão das minorias e o movimento independentista têm escalado por causa do aprofundamento da crise capitalista. As burguesias nacionais estão perdendo dinheiro e, por isso, impulsionam o separatismo. O imperialismo tenta conter os movimentos separatistas, mas, com pouca “bala na agulha”, a contenção fica muito mais difícil.

A economia do Estado espanhol se encontra muito débil nos últimos seis anos. O desemprego tem atingido 26% e se mantido acima dos 20% nos últimos anos, mas os novos empregos são cada vez de pior qualidade. A qualidade da vida está piorando enquanto avançam as políticas de austeridade.

O PP (Partido Popular), do primeiro-ministro Mariano Rajoy, não conseguiu maioria em nenhum dos parlamentos autonômicos e na maioria das assembleias municipais, nas últimas eleições locais. O bipartidarismo entrou em colapso e agora a burguesia enfrenta muito mais dificuldades para controlar o regime político.

No centro da política dos governos autonômicos para o próximo período foram colocados os planos de austeridade, os cortes de despesas no setor público, os despejos, o aumento dos impostos. O aprofundamento da crise capitalista está colocado, assim como o repúdio da esmagadora maioria da população a essas políticas que levaram ao completo sucateamento das condições de vida: 23% de desemprego (oficial), queda dos salários e aposentadorias, piora dos serviços públicos, emigração em massa.

A certa “estabilização” obtida por meio dos gigantescos repasses do BCE (Banco Central Europeu) aos bancos espanhóis e europeus está com os dias contados. Ela já fracassou nos Estados Unidos e na Grã-Bretanha, e no Japão, onde a economia segue no chão. Os crescentes déficits e o governo fraco são os ingredientes para a União Europeia aumentar os apertos contra o Estado espanhol, o que somente pode conduzir a novas e mais profundas crises. Os novos trilhões de euros são direcionados para a especulação financeira por meio das conhecidas medidas ultra podres de QE (quantitative easing ou alívio quantitativo).

Uma eventual implosão do bipartidarismo poderá revelar claramente os problemas que lhe são inerentes, como a corrupção generalizada, a incapacidade de resolver os gravíssimos problemas que atingem o Estado espanhol e o crescente esgotamento dos colchões de controle social, entre outros.

O bipartidarismo espanhol atual foi criado no final da ditadura de Francisco Franco, na década de 1970. A fragmentação parlamentar e dos novos governos reflete o fracasso das políticas de austeridade. A evolução da situação política revela que a crise tem como tendência se acentuar.

Ascenso do nacionalismo, crise do imperialismo

O ponto de partida para entender o significado do resultado das eleições na Catalunha passa pela análise na perspectiva da crise geral do regime político burguês, na Espanha, nos países imperialistas e em escala mundial.

O avanço dos movimentos separatistas representa a ponta do iceberg do problema, a partir do colapso capitalista de 2007-2008. Eles são promovidos a partir de uma tendência revolucionaria por baixo.

A burguesia local busca melhores condições de negociação com o imperialismo espanhol e europeu, pois percebe que lhe será impossível conter as massas por causa do aprofundamento da crise capitalista e dos apertos promovidos pelos planos de austeridade.

As sucessivas derrotas da direita europeia e mundial representam a crise das possibilidades eleitorais, a rejeição no plano eleitoral devido ao movimento geral de desagregação e desintegração da Europa imperialista, como um dos aspectos chave da crise geral. Fatos similares somente aconteceram pela última vez no século XIX, após as revoluções de 1848, quando começaram a se desenvolver os movimentos nacionais, o que dá uma ideia do tamanho da crise.

A partir de uma análise impressionista, uma parte significativa da esquerda conclui que a democracia é forte e que a esquerda está se fortalecendo enquanto a direita está em franco declínio. Essa visão coloca somente uma parte do problema.

A direita, perante a rejeição eleitoral, está se deslocando para o plano extra-eleitoral, onde ela tem promovido uma série de medidas na direção do fascismo. Os grupos de extrema-direita têm crescido não somente na Europa, mas também no mundo todo. Onde a crise tem se aprofundado, a movimentação toma matizes muito evidentes, como pode ser visto com muita clareza na Grécia ou na França, por exemplo. Na América Latina, temos os golpes de Estado brancos de Honduras e do Paraguai, grandes mobilizações direitistas na Venezuela, Bolívia, Equador, Argentina e Brasil. A contenção da histeria direitista promovida pela Administração Obama é temporária e deverá ser retomada conforme a crise capitalista continuar se aprofundando.

A tendência política pode ser avaliada inclusive pela revolução espanhola. A direita tentou conter a crise com a ditadura de Primo de Rivera. Quando não o conseguiu mais, o golpe militar apareceu como a única alternativa e acabou se concretizando numa das mais sanguinárias ditaduras que o mundo já conheceu, o Franquismo.

As tentativas de atacar as massas em larga escala, pela direita tradicional, estão enfrentando crescente oposição e enormes dificuldades para avançar, no Estado espanhol e em escala mundial. Mas a burguesia não tem nenhuma outra política a não ser atacar as massas.

A diferença entre um governo da ala esquerda da burguesia imperialista, como o governo francês, por exemplo, e um governo de direita, como o espanhol, é que o primeiro ataca as massas de maneira confusa, enquanto a direita promove os ataques de maneira organizada, mas tanto um quanto o outro refletem a crise do regime político. Essa crise representa o fim de uma era, a derrota do neoliberalismo, a desmoralização da direita no terreno eleitoral, que também acontece com a esquerda.

O esgotamento do neoliberalismo de maneira definitiva após o colapso capitalista de 2008, mostra, em termos políticos, a inexistência de outra política, alternativa ao “neoliberalismo”, além de “mais do mesmo”, e a inviabilidade de impô-la por meios parlamentares. Por esse motivo, a direita, ao estilo do Tea Party republicano nos Estados Unidos, o Aurora Dourada na Grécia, e o movimento Acqua Marine na França, está se organizando e crescendo em todo o mundo.

Além da Catalunha

A Constituição de 1978, base do atual regime, foi estruturada em cima do apoio do PSOE, do PCE (partido eurocomunista), da burocracia sindical da UGT e das CCOO, da direita pós-franquista e até das burguesias nacionalistas basca e catalã, que, principalmente a partir dos anos de 1960, se integraram à ditadura franquista, – o chamado “Estado das Autonomias”. Para conter os movimentos nacionalistas, o imperialismo espanhol outorgou alguns direitos a mais (até regime fiscal autônomo), principalmente para o País Basco, mas tentou debilitá-lo segregando Navarra.

A Catalunha sempre foi, desde a Idade Média, a região mais rica da Espanha. Com uma população de 7,3 milhões de habitantes, sobre um total de 46 milhões, e um PIB per capita 18% superior à média nacional, é responsável por 20% das exportações e a metade delas relacionadas com tecnologia de ponta; é um importante centro cultural e um dos maiores centros do movimento operário, que, em 1936, bloqueou o golpe do general Francisco Franco de maneira contundente.

A partir da década passada, os lucros das burguesias catalã e basca têm caído e, por esse motivo, têm mobilizado a população local com o objetivo de ampliar a autonomia. O Plano Ibarretxe basco, promovido pelo PNV (Partido Nacionalista Vasco), da direita nacionalista, e a tentativa de reforma estatutária, promovida pelo PSC, ERC e ICV na Catalunha, acabaram sendo derrotados em 2007 pelo PP-PSOE, mas isso aconteceu antes do colapso capitalista de 2008. O PNV foi derrotado nas eleições de 2009 pela aliança do PP-PSOE e a CiU tornou-se porta-bandeira dos planos de austeridade na Catalunha. A crise política começou a escalar novamente a partir de 2012, quando os mecanismos de contenção da crise apresentaram rachaduras.

Além da Espanha, movimentos nacionalistas similares têm crescido na Grã-Bretanha (Escócia, Irlanda), no Flandes belga, na região alpina do Tirol do Sul, na Itália, e em várias outras regiões na Europa. A Aliança Livre Europeia, uma coalizão formada por mais de 40 grupos autonomistas, soma movimentos da Alsácia e Córsega, da França, frísios da Holanda, italianos da Croácia, poloneses da Lituânia, e vários outros. No Balcãs e na Europa Central, os movimentos nacionalistas são dos mais variados possíveis. A movimentação separatista tem se tornado a norma e representa um dos fatores de desagregação do controle do mundo pelo imperialismo.

Alejandro Acosta é cientista social, colaborador do Diário Liberdade e escreve para seu blog pessoal.


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