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221015 netaPalestina - Esquerda - [Kevin Ovenden] Num momento em que a extrema-direita avança na Europa, o primeiro-ministro de Israel disse que o Holocausto não foi produto de forças europeias, como o fascismo e Hitler. É o árabe, o muçulmano quem é culpado.


"Nem mesmo os mortos estarão a salvo do inimigo se ele vencer…"

As tipicamente proféticas palavras de Walter Benjamin vêm à mente ao ouvir a última blasfémia de Benjamin Netanyahu.

Existe há muito tempo um revisionismo histórico lunático e de direita radical da história do Holocausto. Nele, um líder palestiniano sem nenhuma autoridade, nenhum Estado, nenhum exército e longe dos centros de extermínio da Europa Oriental é tido como tendo sido de alguma forma co-responsável pela tentativa de aniquilação de todos os judeus sob o Terceiro Reich desde o fim do Verão de 1941 até a libertação dos campos e o colapso do regime em 1945.

É então possível encontrar em "enciclopédias" do Holocausto meia dúzia ou mais de páginas dedicadas ao diabólico "Grão Mufti de Jerusalém", e talvez uma página dedicada a Adolf Eichmann ou qualquer um dos outros arquitetos reais do genocídio.

A história irrefutável – segundo todos os historiadores respeitáveis, todos – é, obviamente, que o Holocausto foi um genocídio europeu, cometido na Europa, por europeus, pelo Estado mais poderoso da Europa, organizado por uma ideologia e forças políticas impecavelmente europeias, implementando de uma forma particular e concentradamente virulenta métodos que, tendo sido desenvolvidos por potências europeias nas suas colónias, fluíram de volta para o continente que os gerou – sob a cobertura de uma guerra geral europeia. Tudo na Europa. Por europeus. Contra europeus.

Aqueles que defendiam que Hitler era ou alheio a esse maior dos crimes ou que estava pessoalmente em desacordo com os excessos dos seus subordinados encontravam-se, até agora, em dois campos – velhos e grotescos historiadores antissemitas "revisionistas" e grotescas e muito perigosas encarnações modernas da ideologia fascista e do programa político que executou o Holocausto.

Até agora. Até o atual primeiro-ministro de Israel, Netanyahu. Segundo Netanyahu, Hitler, aparentemente, não tinha a intenção de destruir fisicamente o povo judeu. Ele foi levado a fazê-lo por um árabe, qual Svengali: Hajj Amin al-Husseini, o Grão Mufti de Jerusalém.

Não é necessário contribuir aqui para a torrente de refutações à absolvição feita por Netanyahu do fascismo alemão, de Hitler, do Terceiro Reich... da sua proximidade com David Irving, Robert Faurisson e outros charlatães intelectuais da extrema direita. Absolutamente todos os que desenvolveram qualquer estudo do Holocausto estão a fazê-lo – incluindo a instituição de Israel interpretativa oficial do genocídio, Yad Vashem.

O que é escandalosamente claro agora, com Netanyahu não só recusando recuar como sendo acompanhado por outros apoiantes do seu núcleo duro, é que o primeiro-ministro de Israel demonstrou algo que lembro-me ter achado, quando o ouvi ser dito pela primeira vez mais de 30 anos atrás, um exagero, uma provocação com conotações potencialmente perigosas, uma polémica desnecessária.

Não se trata apenas de uma violação da história, por parte do homem que é rotineiramente referido como sendo de alguma forma o líder de todos os judeus – não importa onde no mundo eles vivam ou qual seja o seu pensamento e ponto de vista político –, a fim de defender que aqueles cuja terra Israel ocupa são, em certo sentido, responsáveis pelo enorme crime ocorrido na Europa na década de 1940. Não devemos ficar surpreendidos com isso: este tem sido o modo de operação não apenas dos líderes israelitas anteriores, mas do próprio Estado de Israel.

Outra coisa que aconteceu hoje. Numa altura em que decorre o julgamento da Aurora Dourada na Grécia, em que forças cercadas combatem contra o fascismo na Hungria (que continua a ter na base da sua mundivisão o antissemitismo nazi) e em que os – longe de reconvertidos – fascistas camaleónicos da Frente Nacional em França continuam o seu avanço, o primeiro-ministro de Israel disse que o Holocausto não foi produto de forças europeias, como o fascismo e Hitler na época. É o árabe, o muçulmano quem é culpado. Ele veio a terreiro como advogado do nazismo.

Aqueles que já estão do lado dos palestinianos estão não apenas indignados, mas confiantes no modo como se expressam esta noite. Isso é bom. Não devemos, no entanto, simplesmente sentir-nos contentes na nossa indignação. As pessoas mais felizes hoje à noite são as forças desenvolvidas do fascismo europeu. Receberam um generoso presente de Tel Aviv.

E as pessoas mais confusas esta noite serão aquelas que, estando genuinamente opostas à extrema-direita e ao racismo, julgavam que, não obstante os seus excessos em relação ao povo palestiniano, o Estado de Israel era, pelo menos, um aliado.

Não o é. Netanyahu demonstrou que a memória do Holocausto não está segura nas mãos do Estado de Israel. Apenas o está nas mãos dos que lutam pela justiça universal. E, na nossa denúncia da total falência moral de um dos obstáculos para alcançar tal justiça – o estado de apartheid de Israel –, não ignoremos esta noite o que Netanyahu fortaleceu.

Ele forneceu um enorme impulso ao antissemitismo de estilo nazi (também a forças niilistas e sectárias como o ISIS – mas estes, ao contrário do Nazismo e fascismo europeus, não estavam necessitados de tal impulso).

O revisionismo nazi ainda não é dominante. Mas hoje centenas de milhares de pessoas que gravitam em torno da direita fascista europeia ouviram que uma das inibições que ainda impedia muitas delas de se juntarem a forças como a Aurora Dourada e semelhantes é um mito: ouviram que a persecução de "ordem" e "orgulho racial" pela Alemanha na década de 1930 não conduziu ao Holocausto. Isso foi culpa do trabalho de outros, do Outro desprezado de hoje: o muçulmano.

E ouviram este estrondo de revisionismo do Holocausto – que no seu sentido próprio, mais do que policiar a esquerda, sempre teve como intuito banalizar o genocídio ou negar as linhas de responsabilidade – da boca do primeiro-ministro do Estado de Israel.

Kevin Ovenden é jornalista, escritor e ativista há 25 anos. É dirigente nacional da Coligação Stop the War do Reino Unido, e ativista da causa palestiniana. Dirigiu cinco bem-sucedidas caravanas de ajuda para romper o cerco a Gaza e estava a bordo do navio que foi atacado por comandos israelitas, matando dez pessoas, em maio de 2010.

Tradução da Sadiq Habib para o Esquerda.net


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