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090814 rusRússia - Resistir - [Jorge Figueiredo]  O governo Obama conseguiu arrebanhar os relutantes governos da União Europeia e obrigou-os a imporem sanções contra a Rússia.


Contrariando os interesses dos seus próprios países, os governos da UE acataram servilmente o diktat estado-unidense. Assim, no fim de Julho, após longas negociações para o estabelecimento de "consenso", estes acordaram um esquema de sanções em Três Níveis : acesso ao mercado de capitais; embargo ao comércio de armas e bens que possam ser utilizados para fins militares; e acesso a tecnologias de produção e exploração de petróleo.

Imprensa amarela. Neste artigo será analisado este último "nível", passando por cima do pretexto absurdo alegado pelos EUA/UE para aplicar as referidas sanções. Acusar a Rússia de um crime cometido pelos fantoches ucranianos dos EUA é uma monstruosidade. A verdade vem sempre ao de cima e hoje já está claro que o avião malaio foi derrubado por caças do regime de Kiev – mas a máquina mediática prostituída, orquestrada pelo imperialismo, continua a insinuar a "culpa" russa e/ou das Repúblicas Populares de Donetsk e Lugansk. Tal como na fábula do lobo e do cordeiro, o primeiro diz: "Não importa que você não tenha sujado a água do meu rio, se não foi você foi o seu pai ou seu primo e vou aplicar-lhe sanções". Este cinismo descarado é um indício do desespero da elite estado-unidense diante da perspectiva (próxima?) do fim da hegemonia do dólar. Ela tem de inventar crises políticas e militares a fim de fazer esquecer a crise da sua moeda. E os governantes europeus, tal como prescreveu a Sra. Nuland ("Fuck the UE"), abanam o rabo.

Entretanto, abstraindo aspectos conjunturais do caso, será mais interessante examinar as consequências a médio longo prazo no domínio da energia desta viragem nas relações internacionais. Tudo indica que a nova Guerra Fria agora iniciada poderá ter consequências profundas quanto aos hidrocarbonetos. O mundo – a Europa em particular – poderá ter de pagar um pesado preço pela guinada de Obama na política externa.

Capa de 'The Economist'. Os media corporativos, bem amestrados, desencadeiam agora uma histeria anti-russa. Até The Economist, considerada respeitável, já se comporta como imprensa amarela e publica uma foto de Putin com uma uma teia de aranha ao fundo. Pretendem eles que a Rússia seria severamente atingida pelo embargo a exportações de "tecnologias sensíveis" para a exploração e produção de petróleo. Mas não é verdade e é bem possível que o governo Obama tenha marcado um auto-golo.

Uma análise recente da Reuters apresenta três conclusões principais: a) a Rússia tradicionalmente dependeu da tecnologia ocidental por uma questão de comodidade, mas agora será obrigada a tomar outro caminho e desenvolver tecnologias por si própria, o que levará a uma gradual erosão do monopólio ocidental sobre as mesmas (no deep offshore, no Árctico, etc); b) a China aproveitará a situação e em última análise pode tornar-se a vencedora – já se fala no petro-yuan ; c) as sanções podem significar o fim da liderança tecnológica ocidental no sector do petróleo.

Há muitos peritos que questionam o bom fundamento da política alardeada por Obama. Vale a pena citar a opinião da Peak Oil News:

"Os convencidos que elaboram a política externa no Departamento de Estado talvez não entendam que a produção de petróleo russa acaba de alcançar um pico pós-URSS e de qualquer forma terá de entrar em declínio. O efeito das sanções (dos EUA e UE) será acelerar o declínio [da produção] da Rússia, forçando em alta os preços mundiais do petróleo assim que o escasso petróleo dos EUA atingir o seu máximo e entrar na sua inevitável queda livre por volta de 2017-2020. A Rússia, nessa altura, ainda será um exportador de petróleo e beneficiará de preços mais elevados (talvez o suficiente para compensar a perda de produção resultante das sanções). Mas os EUA, que ainda continuarão a ser um dos principais importadores mundiais de petróleo, enfrentarão então uma repetição do choque petrolífero de 2008 que contribuiu para o seu crash financeiro.

"Não há dúvida de que os peritos do Departamento de Estado acreditam sinceramente na recente jactância da América como uma nova super potência energética capaz de abastecer a Europa com petróleo e gás para substituir as exportações da Rússia. Talvez os europeus tenham sido suficientemente loucos para caírem também nesta ilusão. Mas isto demonstrar-se-á serem apostas altamente arriscadas. Só se pode esperar que todos os actores acordem destas alucinações antes de o jogo se tornar realmente feio".

Assim, tudo indica que o Departamento de Estado e o governo dos EUA estão a acreditar na sua própria propaganda da "revolução" do shale oil e shale gas. Correndo o risco de repetições, convém recordar que a dita "revolução" tem pernas curtas pois 1) os custos de extracção do shale são elevados; 2) o esgotamento dos furos efectuados dá-se num prazo brevíssimo (pouco mais de um ano); 3) para manter os níveis de produção desejados é preciso estar constantemente a fazer novos furos; 4) a tecnologia exige grandes extensões de terra com baixa densidade demográfica; 5) os desastres ecológicos (poluição de lençóis freáticos) e sísmicos estão bem demonstrados. Assim, pode-se afirmar que dentro de poucos anos a tecnologia do shale será considerada passado, uma moda que não deu certo (a Shell já abandonou a sua pesquisa nos EUA, depois de mais de dez anos de esforços).

A dependência da Europa em relação ao gás russo. Na verdade, a auto-suficiência em petróleo dos EUA não passa de um mito e a auto-suficiência em gás natural é conjuntural. Quanto à possibilidade de um boom exportador americano de gás natural, trata-se de uma balela difundida pelo governo Obama e propalada por jornalistas ignorantes: a escassez de instalações de liquefacção e de terminais metaneiros de exportação veda tal possibilidade. Demora pelo menos oito anos a construção de cada uma destas instalações – e possivelmente antes disso já terá declinado a "moda" do shale. Além disso, nos países receptores também seria preciso construir terminais metaneiros em quantidade suficiente (a Ucrânia, por exemplo, não dispõe de nenhum). Assim, do ponto de vista europeu, chega-se à conclusão de que não há nada que possa substituir o gás russo.

Ao aplicar sanções selectivas contra a Rússia – tentando cuidadosamente excluir o gás natural – a UE na verdade deu um tiro no seu próprio pé. Submeteu-se ao diktat imperial e abandonou quaisquer veleidades de autonomia. Ora, isto significa uma quebra de confiança entre parceiros comerciais, o que não pode deixar de trazer consequência (sem mencionar a ruptura com os tão apregoados princípios do livre comércio e com as disposições OMC). Tal quebra de confiança leva a Rússia a uma grande comutação, à procura de outros mercados. O recente acordo de longo prazo com a China, cujas negociações se arrastavam há anos, já é uma consequência da hostilidade europeia. E o mais importante neste acordo é que o dólar e o euro estão dele excluídos: as vendas do gás natural serão em rublos ou em yuan. Isto tem consequências no panorama energético, político e monetário mundial. Mas os aprendizes de feiticeiro que fazem a História nem sempre percebem o que estão a fazer. Isso é verdadeiro tanto para o Sr. Obama como para os seus pobres serviçais da Comissão Europeia.


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