A Reserva Federal, assim como os demais bancos centrais, não podem inundar o mercado com a velocidade “necessária” sob o risco de provocar a disparada da inflação. Foto: Wikimedia Commons (CC BY-SA 2.5)
Os gigantescos volumes de recursos repassados pelos governos são próprios criados a partir do ar, sem lastro produtivo. O requerimento de colaterais supera os US$ 12 trilhões segundo o TBAC.
Leia também:
Os derivativos financeiros: a roleta-russa capitalista
2008: A nova escalada da especulação
A inevitável queda da taxa de lucro
A criação de colaterais não tem condições de ser viabilizada pelos monopólios, pelo setor privado, devido à economia ter entrado em recessão e os investimentos privados terem sumido do mapa. Por esse motivo, a “saída” tem sido os obscenos programas de transferência de recursos públicos, como os denominados QEs (quantitative easing, ou alívio quantitativo). Os QEs viabilizam os colaterais enquanto os empréstimos ilimitados a taxas próximas a 0% (os chamados ZIRP – zero interest rate program) viabilizam a geração praticamente ilimitada de derivativos financeiros. Ilimitada até o abismo, obviamente.
A esmagadora maioria das grandes empresas estão direcionadas para a especulação financeira, com o foco de favorecer os grandes acionistas – repasse de dividendos, recompra de ações e outras transações especulativas a curto prazo. Os títulos financeiros gerados são de baixa qualidade e, por isso, não podem ser usados como colaterais HQC (de alta qualidade). O “estelionato”, que é próprio do estágio atual do capitalismo, é que esses títulos semipodres são comprados pelos bancos centrais pelo valor cheio, que os adicionam à falida corrente denominada “fractional reserve repo”, que não passa do acúmulo de títulos podres, transformando colaterais depreciados em dinheiro vivo para as grandes empresas. Um excelente negócio para os monopólios imperialistas.
Leia ainda:
A especulação com as taxas de juros
O "Far West" das "regulamentações"
Para manter esses mecanismos funcionando, além das emissões de moeda podre, em cujas operações os chamados primary dealers (compradores no atacado) abocanham grandes lucros, têm proliferado as operações “ilegais”, como as lavagens do dinheiro do tráfico de drogas e outros (tem acontecido inúmeros escândalos nos últimos anos), a manipulação de índices, os paraísos fiscais, a aterradora depredação ambiental (gás e petróleo a partir do xisto pela fratura hidráulica, exploração no Ártico etc) e a superexploração dos trabalhadores (queda acentuada da qualidade de vida em todos os países desenvolvidos, arrocho salarial, trabalho escravo etc).
Qual é o impacto do “déficit” de colaterais para o sistema financeiro?
Em 2008, a quantidade de dinheiro podre (shadow money) no sistema bancário norte-americano foi estimada em US$ 21 trilhões. Hoje em dia, a quantidade está estimada em US$ 30 trilhões, dos quais a metade não está suportada por colaterais. O déficit de mais de US$ 11 trilhões em colaterais levará à queima de um volume de capitais fictícios muito maior que o de 2008, simplesmente considerando uma situação similar. O buraco teria que ser coberto pelo Estado. Mas como fazê-lo com os volumes de endividamento atuais?
A Reserva Federal, assim como os demais bancos centrais, não podem inundar o mercado com a velocidade “necessária” sob o risco de provocar a disparada da inflação. O coração do sistema capitalista se direciona aceleradamente a engripar, da mesma maneira que aconteceu no início da década de 1930, quando ainda existia o padrão ouro, mas em condições mil vezes mais explosivas.
Alejandro Acosta é cientista social, colaborador do Diário Liberdade e escreve para seu blog pessoal.