1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 (1 Votos)

040316 amEstado espanhol - O Diário - Nesta entrevista Ángeles Maestro analisa o actual momento político no Estado espanhol, constacta a falta de credibilidade das forças políticas institucionais e o início do ocaso de Podemos.


E depois de afirmar o recrudescimento do activismo social no Estado espanhol, com a crescente consciência que nenhuma «força política institucional tem verdadeira vontade de resistir», nem tem condições para ser uma referência da luta da classe operária e das camadas populares em Espanha, conclui:
«A construção de um referente político das lutas populares é condição indispensável para a acumulação de forças, e deve acompanhar todo o processo de organização e desenvolvimento das lutas e mobilizações.
Destacar esta prioridade como elemento central aglutinador, não nega mas abre o caminho à construção de um programa político que será o resultado de debates…» 

Insurgente (INS): Qual o cenário desenhado pelas eleições gerais de 20 de Dezembro?
Ángeles Maestro (AM)
: Desde a Transição, há quase quatro décadas, que alternavam no governo as duas forças políticas, PSOE e PP, que – com matizes – expressavam a continuidade da Ditadura, a começar pelo apoio inquebrantável à sua herdeira, a Monarquia.

Por trás das sucessivas mudanças de caras, nos diferentes departamentos ministeriais (com excepções chave como Eduardo Serra [1]) aplicavam-se displinadamente as mesmas políticas que asseguravam os interesses das oligarquias, daqui e de fora. Tudo isto, sem que a permanência de figuras do franquismo nas altas estruturas do Estado (e nas suas cloacas como os GAL) fosse alterada por qualquer depuração, ao mesmo tempo que se intensificava a subordinação, a qualquer preço, às políticas da UE e da OTAN. As cada vez mais agudas contradições inter-imperialistas não modificavam a atitude lacaia dos diferentes governos.

Mesmo assim, e apesar da progressiva dureza anti-operária executada através das sucessivas contra-reformas laborais de «paz social», até 2011, apenas foi alterada por greves gerais que nunca transbordaram os limites do guião marcado pelo poder. Ainda que cada vez fosse mais forte a repressão, dentro e fora das empresas.

As eleições de 20 de Dezembro reforçam o quadro que começou a perfilar-se nas eleições europeias de 2014 [2], quando se deu o primeiro safanão, com a espectacular queda do PP e do PSOE. As subidas fulgurante do Podemos e a menor da Esquerda Unida (ainda que neste caso fosse mais o canto do cisne) deram-se depois de mobilizações populares muito importantes, iniciadas em 2011 com o 15 de Março e continuadas com as Marchas pela Dignidade, conseguiram uma inédita unidade em todo o Estado espanhol fora das estruturas institucionais, políticas e sindicais, foram um salto qualitativo, tanto do ponto de vista organizativo como pragmático com o inquietante – para o poder – emblema do Não Pagamento da Dívida.

A instabilidade política trazida pelos resultados eleitorais, marcados pela queda a pique dos votos no PP, no PSOE, na Esquerda Unida (E.U.), na Euskal Herria Bildu (BILDU), no Bloco Nacional Galego (BNG) e, fundamentalmente, na subida de Podemos e de Ciudadanos não se explica pelo «esgotamento» nem sequer principalmente pela corrupção. Acima de tudo é o resultado das brutais políticas de destruição de direitos laborais e de serviços públicos aplicadas por governos mandatados pela Troika, no quadro de uma crise geral do capitalismo de que já se prevê o grande abanão seguinte. Como dizia Jean Claude Juncker, actual presidente da Comissão, «sabemos perfeitamente o que temos de fazer. O que não sabemos é como fazê-lo e que continuem a votar em nós».

No entanto, ainda que o espantalho protagonizado pelo SYRIZA no Verão passado tenha deixado bem claro que não havia filigrana política alguma que permitisse suavizar as criminosas exigências da Troika, nenhuma das forças políticas que aparecem nas passerelles das diferentes coligações governamentais colocaram qualquer estratégia para enfrentar os seus diktats.

Sabem perfeitamente que nenhuma das suas promessas de reversão dos cortes, nem sequer o menor plano de emergência social – como vimos há pouco na Grécia – são possíveis quando se aceita o quadro legal da Eurozona (Tratado sobre a Estabilidade, Coordenação e a Governação – TSCG – 2012), que foi transcrito para as legislação espanhola.

Os oligarcas europeus não deixam a mais pequena dívida sobre o que deverá fazer o próximo governo. Seja qual for as cores que o pintem, deverá deixar como um «social-democrata» o mesmíssimo Rajoy. A «flexibilidade» no cumprimento do deficit – com o consequente corte na despesa pública que este ano foi de 9.000 milhões de euros – fará parte de todos os programas de governo recebeu e já um sonoro bater com a porta, antes mesmo de ser colocado formalmente: «A Espanha deve cumprir com as suas obrigações e para isso o novo governo terá que actualizar o orçamento e aplicar novas medidas de ajustamento» [3].

O confronto com as instituições europeias é o único caminho operante possível que abre a reivindicação de qualquer reforma, por mínima que seja.

Termino com o parágrafo final do editorial da revista Red Roja: «dados os cenários que se avizinham, temos de advertir por «antiquado» que pareça, que a luta de classes não perguntará se a reconhecemos para fazer a sua aparição com toda a crueza. E fá-lo-á com tanta ou mais impunidade reacionária, na medida em que instabilidade política para os de cima seja acompanhada pela persistência de ilusões impossíveis entre os de baixo. Cabe-nos superar as nossas «divisões». Das que nos sobram e das que nos faltam» [4].

INS.: 2015 foi um ano de uma enorme baixa da intensidade das lutas e reivindicações populares nas ruas… Por quê, como se ultrapassa esse momento? Que papel se prevê para as CC.OO e a UGT?
A.M.
: Após quatro anos de fortes mobilizações e lutas populares crescentemente radicalizadas mas ainda impotentes para alterar qualquer coisa de substancial dá-se uma mudança da tendência. Sem ignorar as rigorosas análises recebidas pelos «emergentes» Podemos e Ciudadanos, a Red Roja vem sustentando que não é útil falar de conspirações que mascarem o imprescindível conhecimento dos processos de fundo que se verificam nas massas. E as pessoas tinham decidido tomar o poder para lançar «a casta» no caixote do lixo da história. E decidiu fazê-lo da forma mais cómoda: votando em organizações novas, com uma linguagem e com uma roupas diferentes, mas com programas que falavam de tudo e não se comprometiam com nada.

É verdade que, como se demonstrou com o SYRIZA na Grécia – que em seis meses tinha atirado pela borda fora toda e qualquer expectativa de mudança – as ilusões foram-se desvanecendo. Os votos no Podemos não só baixaram quantitativamente, como se foram evaporando as ilusões de mudança de poder mudar votando neles.

A superação da desmobilização vai chegar da grande aliança estratégica dos que defendemos a necessidade imperiosa de destruir o capitalismo e construir o socialismo: a própria realidade numa grave situação de crise geral crescente e irreversível.

E os tempos correm rápido. A tragédia grega de Varoufakis raivosamente despedido pela Troika rapidamente se verá aqui como farsa.

A diferença é que aqui muitas foram as pessoas que aprenderam e já sabem o final desse guião. As estruturas organizativas das Marchas da Dignidade, do novo movimento operário do tipo «Unificando as lutas», dos «Bairros em pé» e das mil formas que foram adoptadas pelo movimento popular, se bem que debilitadas, permanecem. E continuam a reunir-se, a analisar e a fortalecer a vontade de coordenação.

As Marchas da Dignidade já estão, por exemplo, a preparar grandes mobilizações descentralizadas para 28 de Maio, e uma grande manifestação em Madrid no Outono. E o que é mais importante, trabalha-se organizando e unindo a partir baixo, desde cada bairro, do povo, com o sindicalismo alternativo, com a classe operária imigrante, com a juventude precária e estudantil, com as lutas das mulheres… Além disso, a cada passo reforçam-se as suas linhas programáticas de Não Pagar a Dívida e enfrentar a Troika, que em 2014 ainda permaneciam duvidosas em algumas organizações, mas que hoje são indiscutíveis.

O papel das CC.OO. e da UGT é muito variado. Em lutas como as da Coca-Cola ou da Airbus os camaradas destas organizações incorporaram-se com toda a naturalidade e são bem-vindos às Marchas e a outras estruturas unitárias. Em geral, o desprestígio daquelas centrais é directamente proporcional ao abandono ou à traição das diferentes lutas, sobretudo as da classe operária precária e imigrante. Creio que continuarão a ter um papel importante nas convocatórias de greves gerais, porque é inegável que têm a estrutura e os recursos de que os restantes carecem, mas espero que – como sucede cada vez mais – sejam na prática superados e que se saiam, deixando de ser um obstáculo para a luta.

INS.: Foste militante e vereadora do PCE e deputada pela Esquerda Unida, como vês a situação dessas duas organizações?
AM
.: Há muito tempo que ambas estão a sofrer um intenso processo de decomposição,

Não vou entrar na história do PCE, que em boa medida é a história – até ao começo da Transição – do movimento revolucionário no Estado espanhol. Mas quero dizer que, apesar dos erros cometidos, que são também nosso património porque com eles devemos aprender, sinto-me orgulhosa e considero-me herdeira da luta heróica dos e das comunistas do Partido Comunista de Espanha.

A análise crítica do papel do PCE e das CC.OO. na Transição já a fiz em diferentes artigos [5].

No que respeita ao PCE, o seu processo de degeneração, muito complexo, radica no abandono da estratégia consequente de acabar com o capitalismo e destruir o Estado como o instrumento fundamental de dominação da burguesia. Começou com o Eurocomunismo, mas não terminou com a saída de Carrillo. Como dizia Manuel Sacristán, o problema não é reconhecer que num determinado momento a correlação de forças exige dar um passo atrás, o grave é tentar vender essa alteração táctica como a via para o socialismo.

O penoso papel do PCE na Transição culmina com o desastre de 1982, quando o PCE baixa de 23 para 4 deputados e o PSOE consegue maioria absoluta. O lema eleitoral do PCE foi: «Juntos podemos».

Comecei a militar no PCE em 1973 em Madrid, na clandestinidade portanto, e na base da organização. A luta era dura e, no que eu conheci, havia uma militância sã. Vivi em Talavera de la Reina desde a legalização em 1977 até 1988, estive ausente das purgas de Carrillo e do processo de decomposição que sofreu Gerardo Iglésias. Não fiz parte da direcção do PCE até 1991. Em 1995 encabecei, com Marcelino Camacho em nº 2 e pela primeira e única vez na história do PCE uma lista alternativa, com Teses que defendiam a saída do PCE da Esquerda Unida, para reconstruir um projecto revolucionário comunista, fora das clientelas da Esquerda Unida e do PSOE. Conseguimos 42,5% dos votos num Congresso estatal e pouco depois saí do PCE convencida de que para continuar «a ser e actuar como comunista tinha de sair do PCE».

A história é complexa e não cabe aqui.

Quero recordar duas coisas importantes relativas à Esquerda Unida:

1º Desde 1990 participei directamente na criação da Plataforma de Esquerda da E.U. que em 1991 ganhou o Congresso da federação madrilena a Ángel Pérez. A lista encabeçada pela camarada Susana López exigiu as contas da organização que foram negadas pela direcção cessante, apesar de ter recorrido a todas as instâncias regionais e estatais da Esquerda Unida. Já eram contas de «saco», que depois seriam também contas do cartão Black. A camarada demitiu-se com o total desamparo da direcção da Esquerda Unida, que já era encabeçada por Julio Anguita.

2º Quando Corriente Roja (sucessora da Plataforma de Esquerda, já no âmbito estatal) decide sair da Esquerda Unida, depois da demissão de Julio Anguita em 1969 e depois do vergonhoso pacto pré-eleitoral Esquerda Unida-PSOE, encabeçado por Francisco Frutos e Joaquín Almunia, fá-lo denunciando a corrupção e a correspondente falta de democracia interna. Abandonou a organização, não tanto pelas diferenças políticas – que as havia e grandes – mas pela impossibilidade de defendê-las numa organização em que os interesses económicos ligados a práticas especulativas faziam que os que detinham postos de poder estivessem dispostos a fazer – e faziam-no – o que fosse possível para os manter [6].

A decadência, na minha opinião irreversível, continuou inexorável, apesar de haver militantes honestos em ambas as organizações. Os grupos que hoje se enfrentam, o de Zamora e o de Alberto Garzón não representam mais do que tentativas diferentes de procurar um lugar ao sol… para os seus dirigentes. Passou-se de procurar como única opção os governos do PSOE, como na Andaluzia, a tentar desesperadamente um lugarzito nas coligações de governos, agora como aguadeiros de Podemos. Curiosamente, todos se acotovelaram para aparecerem – tal como Podemos – o mais próximo possível de Tsipras. Ninguém dentro da Esquerda Unida denunciou o espantalho do SYRIZA – e do resto do grupo do PEE no Parlamento Europeu a que pertencem – tentar «suavizar» os ditames da Troika. Nisso, continuam a fazer como se houvesse democracia e como se os povos pudessem exercer a sua soberania votando numas eleições, apesar de irem directamente a bater e a fazerem-nos bater com a cabeça numa parede.

Como escrevi num artigo recente [7], o essencial é saber que o jogo político termina. Que a crise acelera os tempos políticos, e o que vamos ver nos próximos tempos é que as contradições se agudizam e que desaparecem as formas intermédias. Quando se aproximam períodos álgidos da luta de classes é preciso – primeiro que tudo – dizer verdade à classe operária e ao povo e, imediatamente, convocar e organizar a resistência para uma época de confrontação dura e longa.

INS.: A ilusão criada com Podemos em milhões de pessoas que panorama pode deixar no futuro próximo?
AM:
No momento mais alto de Podemos, nas eleições europeias, as esperanças depositadas na sua capacidade para resolver os problemas do povo eram enormes. E, por um lado a impossibilidade material de cumprir as promessas, e por outro a inexistência de uma referência politica alternativa capaz de organiozar a resistência, o risco de que o fracasso de Podemos abra o caminho a posições de extrema-direita, que noutros países vão no caminho para serem hegemónicos, era muito grande.

Sem desdenhar a importância desse risco, vários factos contribuíram para que a «ilusão» de Podemos se tenha ido desvalorizando, precisamente pela crítica a partir da esquerda.

O primeiro elemento foi retumbante: um governo com larga maioria como o SYRIZA teve, com mais experiência e posições mais firmes que Podemos, vergou-se como o mais infame dos lacaios às posições da Troika. Esse exemplo permitiu revelar rapidamente como eram vãs as ilusões de muitos e muitas militantes deslumbrados pela novidade e pela possibilidade de um triunfo imediato.

Segundo foi a própria evolução de Podemos que foi demonstrando que há muito pouca consistência por trás das fantasias mediáticas, e muito da velha politiquice, incluindo as arreigadas divisões internas.

Terceiro foi a manutenção das estruturas do movimento popular, concretamente das Marchas da Dignidade – diferentemente do que ocorreu em ocasiões anteriores como o movimento antiglobalização ou o 15M. As organizações de base, que quase ficaram vazias com as pessoas que foram atraídas pelos Círculos de Podemos, regressaram. Em 22 de Outubro foram capazes de convocar – em pleno período pré-eleitoral – mobilizações muito dignas com a sua reivindicação dirigida «a quem governe» de priorizar a satisfação das necessidades sociais em relação aos objectivos do deficit e do pagamento da dívida. Um elemento chave foi o forte conteúdo de classe das Marchas e a presença comprometida nas mesmas do sindicalismo combativo.

O quarto elemento e politicamente o mais importante foi a assunção por parte das Marchas da Dignidade de reivindicações como Não Pagar a Dívida, enfrentar a Troika ou sair da OTAN. O facto destes objectivos, que ganham maior importância à medida que a crise avança e os povos percebem quem impõe as medidas de austeridade, tem uma importância transcendental e foram elaboradas no Estado espanhol, e constituem a maior glória da oligarquia europeia (e da nacional, evidentemente).

Perante a exaltação nacionalista, racista e xenófoba da extrema-direita, o confronto com a UE é aqui desencadeado pelo movimento operário e popular mais combativo. E, precisamente, quando nenhuma das opções políticas, nem as velhas nem as novas, se atrevem a defendê-lo.

Um dos sinais dos tempos é aceleração dos processos históricos. A própria instabilidade política é disso mesmo exemplo. E é mais provável que seja qual for a composição do governo, este tenha uma vida curta. O decisivo é que, no meio da mobilização – e não há outra maneira – se avance com a organização operária e popular e se vá definindo o imprescindível referente político de massas.

INS.: Qual o desafio fundamental que se coloca neste complexo momento político ao que a Red Roja chama Linha de Intervenção Revolucionária na sua relação com o movimento operário e popular?
AM.
: Após de uma etapa em que depois de grandes mobilizações populares a indignação se encaminhou na via reformista e eleitoral, vai-se alargando em amplas camadas do activismo social uma dupla percepção:

• Que nenhuma força política institucional tem verdadeira vontade de resistir – e de organizar a resistência consequente – às pressões das oligarquias europeias que vão impedir qualquer programa de melhoria das condições de vida dos trabalhadores e das camadas populares; isto é, que aqui se irá viver a versão farsa do que aconteceu com o SYRIZA na Grécia.

• Que não existe nenhuma organização que esteja hoje em condições de cumprir o papel de referência política da mobilização popular.

Como a Red Roja tem vindo a analisar, a opção eleitoral – fundamentalmente concentrada no Podemos, mas não só – pretendia ser para as pessoas uma opção de poder. Tratava-se de alcançar pela via dos votos o que não se conseguia através da mobilização.

Era uma aposta impossível, porque o capital na crise galopante carece de margem de manobra para fazer «reformas» e não tem a menor intenção de flexibilizar as regras do jogo para adiar o pagamento da Dívida ou os objectivos do Deficit. E porque – como ficou demonstrado na Grécia – tem mecanismos de extorsão suficientes para vergar os governos «progressistas», sem um povo informado e organizado por trás, que tenha claros os seus objectivos.

Mas o desenvolvimento das contradições segue o seu caminho e as pessoas aprenderam muito. Situaram com clareza o objectivo do poder político pela via eleitoral e, pouco a pouco, nos sectores com mais elevado nível de consciência perceber-se-á que, depois do fracasso das suas expectativas, se trata agora de enfrentar a questão do poder da classe operária e do povo, orgânica e directamente. Necessidade que se tornará progressivamente mais evidente à medida que se for percebendo – e pode acontecer muito rapidamente – que as caras podem ser mais jovens, mas as políticas são as mesmas de antes.

Nesse caminho de tomada de consciência da falsidade das suas ilusões é preciso que o povo trabalhador interiorize a irreversibilidade da crise, a confiança nas suas formas de organização e a necessidade de construir o seu próprio poder. É prioritário ir estabelecendo a necessária correspondência entre esta percepção e os objectivos e a natureza da mobilização.

Neste objectivo é preciso identificar quem enfrentamos. Há que identificar a chave da abóboda, o principal factor do poder ao qual se submetem todos os outros e sem o qual todo o «programa» é um bem-intencionado louvor ao sol.

Esse eixo estrutural que além disso deve ter a qualidade de permitir que as pessoas estabeleçam facilmente o nexo de união entre este e as suas reivindicações concretas é, sem dúvida, a oposição ao pagamento da Dívida e a qualquer tipo de «resgate», propondo a saída do Euro e da UE.

Essa oposição permanente aos «cortes» de todo o tipo, fortalecendo a resistência contra a Troika, permite também mostrar o núcleo central da estrutura do poder com que nos confrontamos, e assinala as reivindicações de impossível assunção pelo poder.

A construção de um referente político das lutas populares é condição indispensável para a acumulação de forças, e deve acompanhar todo o processo de organização e desenvolvimento das lutas e mobilizações.

Destacar esta prioridade como elemento central aglutinador, não nega mas abre o caminho à construção de um programa político que será o resultado de debates, mas que, na opinião da Red Roja, deve incluir: a ruptura com o Regime de 1978 (República(s), direito à autodeterminação, amnistia, derrogação de leis antiterroristas, etc.; saída da OTAN e desmantelamento das Bases; derrogação das reformas laborais e poder operário nas empresas; propriedade pública e gestão democrática de empresas estratégicas e serviços públicos; igualdade real das mulheres e plena soberania sobre o seu corpo; reforma agrária e propriedade social dos recursos naturais, etc..

Naturalmente, este programa implica um processo constituinte que será o resultado de uma nova correlação de forças favorável ao povo, ou não o será.

Quero dizer que por vezes se atribui um valor quase mágico à reivindicação de um «processo constituinte» sem ter suficientemente em conta que, como forma jurídica, a elaboração de uma nova Constituição – isso sim, de forma mais ou menos participativa – o que definitivamente se sanciona são as alterações reais nas relações de poder.

Em qualquer caso, o que quero deixar claro é que o prioritário neste momento é desenhar um caminho de debate e de confluências que vá configurando – no calor da luta de massas – o referente político que a potencie e a sirva, em relação com o objectivo da conquista do poder.

/strong>Notas:
[1] Eduardo Serra foi subsecretário da Defesa com a UCD, secretário de Estado do mesmo Departamento com o PSOE (durante todo o período de integração na OTAN) e ministro da Defesa com o PP. Foi uma figura chave em todas as compras de armamento aos EUA, a mão direita do rei Juan Carlos. Actualmente preside à influente Fundação Everis, responsável do relatório «Transforma Espanha», apresentado ao rei, a Zapatero, Fidalgo (ex-secretário geral das CC.OO.) e altos responsáveis das principais empresas do IBEX.

[2] O panorama político aberto depois das eleições europeias de 2014 foi por mim analisado em artigo: http://redroja.net/index.php/noticias-red-roja/opinion/2789-las-tareas-de-la-izquierda-revolucionaria-ante-podemos-y-otras-opciones-electorales

[3]http://economia.elpais.com/economia/2016/02/11/actualidad/1455221065_790169.html

[4] http://redroja.net/index.php/noticias-red-roja/noticias-cercanas/3852-inestabilidad-e-ilusiones-de-divisiones-va-la-cosa

[5] A força da memória e o poder constituinte do NÃO na reconstrução da esquerda revolucionária no Estado espanhol (2006)
http://www.rebelion.org/noticia.php?id=28710.

[6] http://www.lahaine.org/est_espanol.php/corriente-roja-abandona-iu-ante.
http://www.cubadebate.cu/opinion/2007/04/13/entrevista-con-angeles-maestro-dirigente-de-corriente-roja/#.VsDJY98xhD8

[7] http://salirdeleuro.net/wp-content/uploads/2015/10/ANGELES-MAESTRO.pdf
http://www.lahaine.org/est_espanol.php/podemos-ha-ido-mostrando-la

* Esta entrevista foi publicada em insurgente.org/ :
http://www.insurgente.org/index.php/mas-noticias/ultimas-noticias/item/20198-ángeles-maestro-red-roja-podemos-ha-ido-mostrando-que-hay-muy-poca-consistencia-y-coherencia-detrás-de-los-oropeles-mediáticos

Tradução de José Paulo Gascão

* Ángeles Maestro, amiga e colaboradora de odiario.info, integra a Red Roja


Diário Liberdade é um projeto sem fins lucrativos, mas cuja atividade gera uns gastos fixos importantes em hosting, domínios, manutençom e programaçom. Com a tua ajuda, poderemos manter o projeto livre e fazê-lo crescer em conteúdos e funcionalidades.

Microdoaçom de 3 euro:

Doaçom de valor livre:

Última hora

Quem somos | Info legal | Publicidade | Copyleft © 2010 Diário Liberdade.

Contacto: info [arroba] diarioliberdade.org | Telf: (+34) 717714759

Desenhado por Eledian Technology

Aviso

Bem-vind@ ao Diário Liberdade!

Para poder votar os comentários, é necessário ter registro próprio no Diário Liberdade ou logar-se.

Clique em uma das opções abaixo.