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160210_rua.jpgMario Osava (Terramérica) - Uma pesquisa acadêmica comprovou, no Brasil, que respirar o ar urbano carregado de partículas sólidas potencializa o risco de contrair doenças cardiovasculares. 


Controlar não garante a saúde cardiovascular em cidades poluídas como São Paulo, pois as partículas suspensas no ar alteram a composição molecular do LDL, o “colesterol ruim”, deixando-o mais perigoso. A estrutura alterada do LDL (lipoproteína de baixa densidade) facilita o acúmulo de gordura nas artérias, isto é a arteriosclerose, cujo agravamento obstrui a circulação sanguínea e pode prejudicar órgãos vitais como coração e cérebro. O estudo que comprovou esse risco é a tese de doutorado da biomédica Sandra Castro Soares, na Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP).

A pesquisa foi feita com ratos, como de costume, mas colocando-os pela primeira vez no ambiente real, respirando o mesmo ar que as pessoas, perto de uma agitada avenida dessa superpovoada cidade. Um grupo de animais foi exposto a essa contaminação de rua, principalmente causada pelo tráfego de veículos, durante seus quatro primeiros meses de vida, que correspondem a 40 anos nos seres humanos, idade em que costumam acontecer os infartos. Outro grupo de cobaias foi mantido em câmaras com ar filtrado.

O primeiro grupo terminou o período de testes com as parede arteriais mais grossas, o LDL alterado e anticorpos contra essa modificação. Tudo aponta para maior risco de infarto. O problema são as micropartículas que “atravessam as barreiras nasais e pulmonares, entrando na circulação sanguínea”, explicou a biomédica ao Terramérica. “Não alteram a quantidade de gordura, mas sua qualidade” de aderir às paredes das artérias, acrescentou. A alteração atrai mais anticorpos, o que, por sua vez, atrai mais LDL, agravando o quadro.

Nas últimas décadas, São Paulo conseguiu reduzir pela metade a quantidade de partículas contaminantes em sua atmosfera. Mas a pesquisa revelou que esse ar ainda não é saudável, embora hoje tenha a qualidade recomendada pela Organização Mundial da Saúde, com uma concentração inferior a 50 microgramas de partículas por metro cúbico de ar, disse Lúcia Garcia, orientadora da tese de Soares no Laboratório de Poluição Atmosférica da FMUSP. As partículas são oxidantes e o LDL oxidado intensifica a arteriosclerose, aumentando os riscos de doenças vasculares para quem vive nas grandes cidades do mundo. Correr pelas ruas poluídas pode ser muito prejudicial para a saúde, advertiu Garcia.

De fato, há numerosos e variados efeitos da poluição urbana, revelados por estudos recentes em São Paulo. Nascem mais meninas do que meninos, aumentam os partos prematuros ou com peso inferior ao normal, bem como a infertilidade masculina e as mortes por doenças respiratórias. O câncer infantil e o hipotiroidismo são outras consequências possíveis. Nascer com baixo peso não é apenas uma questão de tamanho. Trata-se de “um feto mais imaturo”, com órgãos sem desenvolvimento total, o que pode deixar sequelas e inclusive causar morte precoce, explicou o médico Paulo Saldiva, que coordena o Laboratório de Poluição.

A Universidade de São Paulo está “entre as cinco do mundo que produzem mais conhecimentos na área” que relaciona saúde e meio ambiente, se orgulha Saldiva, lamentando que as descobertas tenham pouca influência nas políticas públicas brasileiras. A poluição como uma grave questão de saúde pública não mobiliza as autoridades sanitárias, mais preocupadas em combater doenças infecciosas como a gripe A, o HIV (vírus da deficiência imunológica humana, causador da aids) e a dengue, queixou-se. Além disso, as autoridades ambientais e os ecologistas dão pouca atenção à saúde dos seres humanos, acrescentou.

Por outro lado, a indústria do tabaco parece contente com as conclusões sobre os malefícios causados pela poluição urbana, pois pretende ganhar argumentos para relativizar os efeitos do cigarro, como o câncer de pulmão. Mas, de todo modo, “o cigarro é pior do que o ambiente contaminado”, destacou o pesquisador. O grande problema é que, enquanto o tabaco afeta apenas os que decidem fumar ou convivem com fumantes, da poluição do ar “ninguém escapa”. Além disso, “os mais pobres estão mais expostos”, por viajarem horas em ônibus que trafegam por ruas congestionadas, enquanto os ricos dispõem de automóveis fechados, com ar condicionado, disse Salvida.

A desigualdade social coincide com a injustiça ambiental, já que os mais pobres vivem em lugares inadequados, vulneráveis a inundações e deslizamentos, com escassez de água e maior contaminação, acrescentou Saldiva. A situação tende a piorar em São Paulo, onde milhares de automóveis se somam a cada dia aos seis milhões de veículos que já circulam pela cidade. Isto deixa lento o trânsito e obriga a população a respirar por mais tempo o ar carregado de resíduos, aumentando as possibilidades de contrair doenças vinculadas, disse.

As pesquisas do Laboratório de Poluição se concentram agora em examinar os efeitos nas pessoas que passam mais tempo nos lugares mais poluídos de São Paulo, como os controladores de trânsito nas avenidas mais congestionadas. O material em partículas e “talvez o ozônio” são os elementos que mais preocupam em termos de saúde, concluiu Saldiva.


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