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Juliano Medeiros

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Novas eleições e a tentação do voluntarismo

Juliano Medeiros - Publicado: Terça, 12 Abril 2016 05:40

Nas últimas semanas ganharam força as propostas de novas eleições presidenciais e de eleições gerais antecipadas. Como essas propostas tem tido a adesão de atores sociais de peso à esquerda e à direita considero importante desenvolver uma breve reflexão sobre o tema. Mas antes, é necessário definir com precisão cada uma das propostas.


A proposta de antecipação das eleições presidenciais, defendida por Marina Silva, só poderia ser viabilizada pela cassação da chapa Dilma/Temer pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Há uma ação movida pelo PSDB com esse objetivo, alegando uma série de crimes cometidos no decorrer da eleição de 2014. Caso seus argumentos fossem aceitos pelo TSE, seriam convocadas eleições presidenciais em até noventa dias, período no qual o país seria governado por Eduardo Cunha. Mas se o TSE cassasse os mandatos de Dilma e Temer depois de transcorridos dois anos de mandato (a partir de janeiro de 2017) então a eleição seria feita de forma indireta pelo Congresso Nacional.

A proposta de eleições gerais é ainda mais complexa. Não há nenhum embasamento jurídico para a medida defendida por Renan Calheiros, Valdir Raupp, PSTU e um setor minoritário do PSOL. Até agora a única alternativa apresentada seria a aprovação de um Projeto de Emenda à Constituição (PEC) que instituísse a revogabilidade de todos os mandatos: presidente, governadores, senadores, deputados federais e deputados estaduais. Segundo a proposta esboçada pelo PMDB no Senado Federal, a aprovação da PEC viria acompanhada ainda de um plebiscito ou referendo. Não há maiores informações sobre a proposta que, ademais, poderia ser alvo de questionamento no Supremo Tribunal Federal sob o argumento de ferir princípio da não-retroatividade[1].

Contra ambas as propostas se insurgiram Aécio Neves, Michel Temer e a própria Dilma Rousseff. Como se vê, o tema favorece alinhamentos dos mais improváveis. Por isso mesmo, é necessário ir um pouco além das palavras de ordem e perceber o que está por trás de cada uma dessas saídas.

Não precisa ser um gênio da política para saber que ambas as propostas podem se tornar bandeiras tanto da direita quanto da esquerda. Explico: se o processo de impeachment tiver um desfecho favorável a Dilma, é muito provável que a oposição demo-tucana empalme no dia seguinte a proposta de novas eleições, seja pela cassação da chapa Dilma/Temer, seja pela convocação de eleições gerais. Nesse caso, os defensores dessas propostas podem se tornar, do dia pra noite, caudatários de Aécio Neves, Michel Temer et caterva. Mas se a proposta de impeachment alcançar os 342 votos na Câmara dos Deputados e o afastamento de Dilma for confirmado pelo Senado Federal, que alternativa terá a esquerda senão reivindicar a realização de novas eleições diante do ilegal e ilegítimo governo Temer?[2]

Portanto, quem tiver um mínimo de juízo não pode hostilizar a priori a proposta de novas eleições. A prudência, porém, recomendaria não abraça-la de forma tão convicta. Diante das incertezas da conjuntura, considero totalmente precipitado aderir a uma saída dessa natureza. Não posso deixar de reconhecer que há gente séria defendendo essas propostas com base no princípio sagrado da soberania popular. O próprio PSOL defendeu, no bojo das discussões sobre a reforma política, a introdução de mecanismos de revogação dos mandatos, como os que existem na Bolívia e Venezuela. Mas essa não é a motivação de todos os que, agora, defendem a convocação de novas eleições. No caso de Marina Silva, por exemplo, é claro que ela advoga em benefício próprio: num cenário de novas eleições presidenciais ela seria um dos nomes mais competitivos. Para outros, a antecipação/convocação de novas eleições representará tão somente o segundo round na luta para derrubar o governo Dilma caso o impeachment seja derrotado na Câmara dos Deputados.

Há, por fim, um debate de fundo em torno da proposta de eleições gerais e antecipação das eleições presidenciais que poucos têm feito: mudar o governo, sem mudar o sistema político, resolve a crise atual? Ao defender a tese de que uma nova eleição seria necessária para pôr fim à crise, vários atores de esquerda reforçam involuntariamente a ideia de que deve-se mudar tudo para não mudar nada. De que adiantaria a realização de novas eleições sem uma profunda reforma política? Como esperar que o resultado seja melhor que o de 2014 com esses partidos, esse sistema eleitoral, essas regras de campanha? No ano passado Eduardo Cunha aprovou uma reforma eleitoral que buscou asfixiar os partidos de esquerda (como o PSOL) e eventuais alternativas mais ou menos fora do establishment (como a Rede Sustentabilidade). É nesse contexto que se imagina que um novo processo eleitoral pode ser benéfico para as forças progressistas e democráticas?

Como bandeira de agitação a proposta de eleições gerais ou novas eleições presidenciais é vista com bons olhos pela população, que em sua ampla maioria apoia a saída de Dilma Rousseff. De uma forma ou outra, ela representa uma variante do “Fora Dilma”. O problema é que, sem força para viabilizar um processo de refundação da democracia brasileira, essas propostas não resolverão os limites do nosso trágico sistema político. E é essa a grande luta que se abrirá no dia seguinte à votação do impeachment.

Notas:

1- Princípio constitucional segundo o qual a lei prejudicará o direito adquirido e o ato jurídico perfeito. No caso, o direito de Dilma de concluir seu mandato de acordo com as regras que definiram o pleito de 2014 e o tempo de mandato.

2- O atual processo de impeachment é ilegal porque não há crime de responsabilidade comprovado que possa sustenta-lo. E é ilegítimo porque foi instalado como uma vendeta do corrupto presidente da Câmara dos deputados, Eduardo Cunha, em sua luta contra o Palácio do Planalto.

Fonte: GGN.


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