São 40 menores que – na idade da escolaridade obrigatória, fazem do futuro o presente e entram com dinheiro, todos os dias, lá em casa ganho a vender peças de artesanato, queijo, feijão. Isso quando não estão a cuidar do gado. É a falta de perspectiva dos próprios pais – as pessoas que os puseram no mundo, mas que não conseguem garantir o que Deus mandou para que todo o ser humano possa operar o milagre da vida "Crescei e multiplicai-vos" – que as empurra para a berma das estradas, carregando peças de artesanato feitas de lava vulcânica e a esperança de vendê-las aos turistas.
Susana Veiga Afonso tem 9 anos e estuda o 3º ano do ensino básico. Todos os dias levanta-se bem cedo e vai vender aos turistas peças de artesanato à beira da estrada que vai dar a Chã das Caldeiras. Ali, enquanto aguarda um ou outro comprador, vai estudando as anotações que tem no seu caderno. Depois seguirá directamente para a escola, muitas vezes sem almoçar.
A menina faz-se acompanhar pelo irmão de 12 anos, Bruno Veiga Afonso, que está na 5ª classe e que com ela divide a tarefa de vender o artesanato feito pelo irmão mais velho, de 24 anos. É com o dinheiro da venda das peças que compram roupa, sapatos, comida e materiais escolares. Mas se há dias em que chegam a facturar dois mil escudos ou mais, outros há em que nada vendem.
Keven Djony Centeio, 12 anos, aluno da 6ª. classe, também vende artesanato. Ele e o irmão mais novo, Edmilson, saem todos os dias para vender os "funcos e casinhas" esculpidos pela mãe, que tem mais três filhos. O dinheiro da venda, garante Djony, é que sustenta a família.
Ana Neves, professora e responsável pela única escola da localidade, mostra-se bastante preocupada com a situação destas crianças. Os pais já foram alertados para o perigo que essa prática pode significar para o futuro dos seus filhos. Mas se muitos reconhecem que essa actividade laboral em tão tenra idade os obriga a chegar muitas vezes atrasados à escola, também são muitos os pais que ainda insistem na ideia de que os filhos pequenos devem também trabalhar – vendendo artesanato ou cuidando dos animais. Apesar da legislação que proíbe o trabalho infantil, nas zonas rurais da ilha do Fogo e um pouco por todo o país, sobretudo nas regiões mais pobres, ainda é comum ver crianças a trabalharem de sol a sol. Na sua grande maioria integram agregados numerosos e com parcos recursos financeiros, daí terem que trabalhar para arredondar as magras contas do seu agregado familiar.