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Miguel Urbano Rodrigues

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Camilo José Cela - A Máscara e a ambição de um Nobel imerecido

Miguel Urbano Rodrigues - Publicado: Segunda, 21 Dezembro 2015 01:54

Não são raros os casos de escritores endeusados pela crítica e que adquirem dimensão universal apesar de a sua a obra ser medíocre e eles pessoas que não merecem os louvores e prémios que lhes atribuíram. Camilo José Cela (1916/2002) é o caso típico do escritor envolvido na sua época por uma aura de grandeza que os seus livros não justificam.


Críticos literários prestigiados sustentam que existe uma fronteira que não deve ser ignorada entre a obra de um escritor e o homem que a criou. Não há argumentos que a possam apagar.

Recordo o que se escreveu sobre o cidadão Balzac e a Comédie Humaine. O criador e os seus livros são para mundos, na aparência, incompatíveis.

Mais frequentes são os casos em que o escritor é endeusado pela crítica e adquire dimensão universal apesar de a sua a obra ser medíocre e ele um homem que não merece os louvores e prémios que lhe atribuíram.

Camilo José Cela (1916/2002) tipifica bem o escritor envolvido na época por uma aura de grandeza cujos livros não justificam.

Acabei esta semana de ler a tradução portuguesa* de Vagamundo al Servicio de España, antologia de textos organizada por Ricardo Bada.

O livro é uma perambulação do autor por Espanha, desde Castela à Galiza, com passagem pela Andaluzia, Valencia, Aragão, Catalunha e Euskadi.

Cela principia por se apresentar como «o viajante», para mais adiante aparecer como «o vagabundo».

Descreve-se como «um homem jovem, alto, magro». Nas suas andanças bebe muito vinho (e algum whisky) em tabernas, dorme em estalagens escusas ou ao relento.

Qual o objetivo da sua caminhada? Que serviço prestou, afinal, a Espanha? Ele não responde em 223 páginas à pergunta.

Descrições de paisagens alternam com reflexão sobre temas históricos e religiosos, meditações existenciais, diálogos com acompanhantes ocasionais, evocação de episódios vividos pelo caminhante na sua viagem caótica.

A convicção de Cela de que escreveu uma obra importante, de qualidade, transparece. Mas não é, creio, partilhada pela esmagadora maioria dos leitores, arrastados por um discurso monótono, aborrecido, vazado num texto pesado.
Incompreensível a decisão da Academia Sueca ao atribuir o Nobel de Literatura de 1989 ao autor de livros tão maus como este.

FRANQUISTA ATÉ AO FIM!

Camilo José Cela nasceu na aldeia de Iria Flávia, província da Corunha, numa família de ascendência inglesa e italiana. Recebeu na pia batismal o nome de Camilo José Maria Manuel Juan

Ramón Francisco Javier de Jerónimo. O Cela foi opção sua tardia.

É provável que não exista outro escritor que tenha em vida sido tao premiado. Membro de muitas academias europeias e americanas, galardoado com prestigiadas condecorações do seu país e estrangeiras, Cela foi distinguido com o Príncipe das Astúrias e o Cervantes, os dois maiores prémios espanhóis. O Nobel coroou uma carreira literária fulgurante.

Muitos escritores o receberam imerecidamente; o seu terá sido o mais injusto.

Mas a glória apagou-se rapidamente. Transcorridos treze anos sobre a sua morte, Camilo José Cela é um escritor quase não lido no seu próprio país e ignorado no vasto mundo.

A obra não merece admiração; o homem não merece respeito.

Ainda adolescente, sentiu se atraído pelas ideias da extrema-direita. Via em José Antonio Primo de Rivera,o criador da Falange, um guru, um mestre do pensamento politico.

Tinha 20 anos quando eclodiu a Guerra Civil. Abandonou Madrid e atravessou as linhas republicanas para se alistar na Galiza, como soldado, nas tropas franquistas. Foi então que começou a escrever.

Finda a guerra, foi funcionário do Corpo Policial de Investigação e Vigilância do Ministério da Governação, onde desempenhou as funções de censor.

Como editor – teve múltiplas profissões - fundou a Alfaguarda o que lhe permitiu conviver com figuras literárias da época. Corrompeu alguns escritores, facilitando a edição e compra das suas obras. Ambicioso, cultivou estilos diferentes, por vezes incompatíveis (passou inclusive pelo surrealismo) sempre na busca do êxito.

O poeta falangista Dionisio Ridruejo, comentando o seu mecanismo de poder, definiu-o como «estratégia de fama, culto da personalidade e vontade imperativa».

Senador após a queda da ditadura, usou com habilidade o mandato parlamentar durante a chamada transição sem nunca abdicar da sua fidelidade ao regime franquista.
Admirador do sionismo (uma das suas muitas contradições) foi presidente da Sociedade Espanha – Israel.

Nos anos 50, quando principiou a acumular prémios e era acarinhado por Franco, desenvolveu uma ofensiva diplomática em defesa do venezuelano Perez Jimenez. Mediante acordo com o ditador comprometeu-se a escrever seis novelas integradas no projeto Historias de Venezuela. O escândalo foi tamanho que somente a primeira foi publicada.

Alvo, a partir de 1975, de críticas contundentes da intelectualidade progressista da Espanha e da América Latina, manteve pelo tempo adiante relações de intimidade com a casa real. Juan

Carlos admirava-o tanto que criou para ele o título de marquês de Iria Flávia, o nome da sua aldeia natal.

O mundo da cultura tomou com enorme surpresa conhecimento da decisão da Academia Sueca de lhe atribuir em 1989 o Nobel.

Foi uma mancha na história do mais prestigiado premio literário. Camilo José Cela não o merecia. Como homem viveu e atuou como inimigo do seu povo.

Nota:

*Camilo José Cela, Vagamundo ao serviço da Espanha, ASA Editores, Porto 1995.


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