A falta de rastreios organizados ao cancro pelas autoridades de saúde em algumas zonas do país, ou a sua manifesta insuficiência, traduz-se em assimetrias regionais que são bem visíveis no que concerne, por exemplo, à incidência da taxa de incidência do cancro do colo do útero, que é bem mais elevada na região Sul do que no resto do país e o triplo do que acontece nos Açores ou o dobro da região Centro.
Segundo a coordenadora do Registo Oncológico Nacional, o acesso generalizado aos rastreios poderia reduzir mortes por cancro no colo do útero em 80%.
“A eficácia do rastreio é comprovadamente muito grande. Se toda a gente aderisse, um rastreio organizado diminuiria a mortalidade em cerca de 80%”, referiu Ana Miranda, acrescentando que “o rastreio do colo do útero é o único que consegue detectar lesões pré-malignas”.
Ana Miranda alertou que esta falha nos rastreios também é sentido noutros tipos de cancros, como o do cólon e o reto e o da mama e que a mesma tem consequências não só na incidência da doença mas também na mortalidade que lhe está associada.
Pelo menos um milhão de mulheres não tem acesso a rastreio ao cancro da mama. Na Região de Lisboa e Vale do Tejo, os únicos rastreios disponíveis são os da Liga contra o Cancro. Um rastreio generalizado a todo o país, “pelo menos conseguia trazer [ao rastreio] mulheres com tumores em estádios mais precoces, em que o tratamento é mais eficaz”, defendeu a responsável.
Hábitos alimentares dos portugueses têm impacto no cancro
O estudo nacional revela ainda que os hábitos alimentares dos portugueses têm impacto no cancro.
A coordenadora do Registo Oncológico Nacional assinala que, por exemplo, a maior incidência do cancro do cólon está associada ao facto de, nas últimas décadas, os portugueses terem passado a comer mais hidratos de carbono, gorduras ou fast-food e terem diminuído o consumo de verduras e peixe. Os hábitos alimentares no Norte contribuem para uma maior incidência nesta região deste tipo de cancro.
As taxas de incidência do cancro do cólon e do reto são mais elevadas nas grandes cidades e periferias ou mais baixas nas regiões litorais e agrícolas.
Cancro da mama e da próstata são os mais comuns
Segundo os dados publicados, o país diagnosticou 44.605 novas neoplasias malignas, 24.220 nos homens e 20.385 nas mulheres.
Os cancros mais comuns em Portugal são o da mama, que conta com 6.027 novos doentes por ano, da próstata, com 5.433, e dos brônquios e pulmão, com 3.512. Destacam-se ainda o cancro do cólon (4.951 casos), estômago (2.942) e reto (2.481) e ainda os tumores na bexiga, glândula tiroideia e linfoma não-Hodgkin, com 1.000 a 2.000 novos casos por ano.
O cancro mais mortífero continua a ser o do pulmão. “É, de longe o tumor mais importante, porque, apesar de ter uma incidência mais baixa, continua a ser o mais letal”, afirmou Ana Miranda.
A mudança de hábitos está, no entanto, a traduzir-se no aumento dos casos de tumor no colón.
“Subiu substancialmente. Passámos de 30 por 100 mil em termos de casos incidentes para 48/49 por 100 mil. Estamos quase a par do cancro no pulmão e certamente que o vai ultrapassar”, referiu a coordenadora do Registo Oncológico Nacional.
O estudo anual, que é divulgado esta quarta-feira num encontro que reúne mais de 150 especialistas nacionais e internacionais da área do cancro, apresenta dados de 2009, os mais recentes disponíveis para traçar o retrato do cancro em Portugal.