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8343281888 8bbaa77c27 zArgentina - Diário Liberdade - [Alejandro Acosta] O que representam os resultados do primeiro turno das eleições nacionais na Argentina?


Scioli (à esquerda) e Macri (à direita) disputarão o segundo turno das eleições presidenciais. Foto: Nahuel Padrevecchi/Governo da Cidade de Buenos Aires (CC BY 2.0)

No primeiro turno das eleições argentinas, que aconteceu no dia 25 de outubro, a “grande surpresa” foi a apertada vitória (vitória de Pirro!) do candidato do governo Cristina Kirchner, Daniel Scioli, que significou a abrupta queda da votação no kirchnerismo em 11%.

O candidato da direita, o ex-prefeito da cidade de Buenos Aires, Maurício Macri, filho de um dos maiores empresários argentinos, disparou nas expectativas de votos apontadas pelas pesquisas, ficou no calcanhar de Scioli e ameaça vencer o segundo turno.

Após o candidato de Macri, Horacio Rodríguez Larreta, ter vencido as eleições municipais na cidade de Buenos Aires, agora a candidata do “macrismo”, Maria Eugenia Vidal (vice de Macri na cidade de Buenos Aires), venceu na Província de Buenos Aires após 28 anos de governos peronistas e kirchneristas. Vidal obteve 39,49% dos votos contra 35,18% de Anibal Fernández, o candidato kirchnerista de carteirinha.

O cenário atual é muito diferente de 2011 quando Cristina Kirchner venceu com 54% dos votos, favorecida pelo boom econômico em cima dos altos preços das matérias-primas (commodities) no mercado mundial.

As eleições ficaram polarizadas em certa medida. Mas a candidatura do kirchnerista dissidente Sergio Massa, ex-prefeito de El Tigre, município localizado na Grande Buenos Aires, capitalizou mais de 21% dos votos com um discurso anti kirchnerista. O abstencionismo foi baixo, apenas superou os 3%.

Macri acabou concentrando os votos da direita, revitalizando o sonho dos direitistas argentinos de colocar em pé uma espécie de MUD venezuelana. Scioli, a candidatura direitista do peronismo, apoiada por Cristina Kichner, acabou perdendo até o bastião de muitos anos, a Província de Buenos Aires.

A candidatura da Frente de Esquerda não decolou e acabou mantendo a votação das primárias, as Paso. Em grande medida esses votos foram capitalizados a partir do colapso eleitoral da “Alianza Progresistas”, encabeçada por Margarita Rosa Stolbizer, uma ex-deputada do direitista UCR (União Cívica Radical) e fundadora (2007) do social-democrata “Generación para un Encuentro Nacional”. Stolbizer obteve 2,54% dos votos, ainda menos que os 3,22% de Carrió em 2011.

Calcanhar de aquiles do "Macrismo"

O “macrismo” aparece como uma saída fraca à crise capitalista argentina, pela direita, impulsionada pelo imperialismo. Seria a saída imperialista, impulsionada pela Administração Obama, contra os governos nacionalistas na América Latina. Para o próximo período, esta ala do imperialismo deve aumentar o impulso dessa política, principalmente no Brasil, no Equador e na Venezuela, que já foi aplicada com sucesso no México e nas recentes eleições municipais na Colômbia, dois países de grande importância regional.

O calcanhar de Aquiles da política Obama, e do “macrismo”, reside em que as chances da direita "democrática” latino-americana para aplicar o plano de “ajuste” que os monopólios exigem são escassas. Por esse motivo, a continuidade do endurecimento do regime será inevitável, apesar de uma certa descompressão conjuntural. As eleições que acontecerão nos Estados Unidos, no próximo ano, e o grau do aprofundamento da crise capitalista representam dois dos principais fatores que poderão aumentar ou reduzir o fortalecimento da política abertamente golpista.

O próprio Macri, que no ano passado era repudiado como um “neoliberal”, mudou o discurso para se apresentar como um “renovador” que iria manter os aspectos positivos da política kirchnerista, como os programas sociais e as “nacionalizações” a la Kirchner.

O enfraquecimento do nacionalismo burguês

O colapso capitalista de 2008 tirou, em boa medida, a base social dessa direita latino-americana, que agora aparece como uma espécie de zumbi cuja política quase exclusiva é o aumento da entrega dos respectivos países ao imperialismo. A desagregação do regime político reflete a crise mundial. Uma evolução semelhante, e anterior, pode ser observada nos países mediterrâneos da Europa. Na Espanha, por exemplo, o bipartidarismo está dando lugar a vários partidos, integrados ao regime, onde o “Ciudadanos” tenta colocar em pé uma alternativa direitista “pragmática”, um verdadeiro vale tudo perante o fortalecimento contraditório de Podemos (o Syriza espanhol), para as eleições que acontecerão no dia 20 de dezembro.

A divisão interna da burguesia dificulta a formação de uma frente única que consiga aplicar uma nova onda de políticas neoliberais, tal como foi feito por Menem (1989-1999) na Argentina e por FHC (1995-2003) no Brasil.

Macri representa a saída “a la Obama” para a crise latino-americana. O imperialismo deve apostar em cheio em Macri para o segundo turno, da mesma maneira que o fez nas últimas eleições no México quando impuseram, de maneira ultra fraudulenta, o direitista reciclado Peña Nieto, pelo PRI (Partido Revolucionário Institucional), contra o eterno candidato fraudado, o social-democrata López Obrador do PRD.

Seja qual for o resultado do segundo turno das eleições na Argentina, é evidente que sairá fortalecida a política da direita, contra as políticas nacionalistas aplicadas pelos governos Kichner, principalmente o primeiro governo de Nestor Kichner. O governo de Cristina Kichner se encontra contra as cordas por causa do aprofundamento da crise capitalista e a incapacidade de romper com o aperto da espoliação imposta pelo imperialismo norte-americano, em primeiro lugar.

Se Macri for eleito presidente da República, a política do governo tenderá a um alinhamento maior com as políticas neoliberais que os monopólios buscam impor, principalmente em relação ao ajuste e contra o “bolivarianismo”, a China, a Rússia e o Brasil. Se o vencedor for Scioli, o bloco nacionalista anterior tenderá a ser implodido por meio do surgimento de um novo grupo hegemônico, mais à direita que o liderado por Cristina Kirchner, que ficou enfraquecido por causa da derrota de Anibal Fernández, o kirchnerista de carteirinha e candidato derrotado à província de Buenos Aires. Ao mesmo tempo, as contradições entre as várias facções deverão se acirrar conforme a crise se aprofundar.

A atomização do Congresso facilitará a ação da direita turbinada pelo dinheiro dos monopólios.

O kirchnerismo deverá continuar como uma força importante, pois ainda conta com a força de choque juvenil, a Campora, e fortes laços com a burocracia sindical e estatal, e com setores da burguesia argentina. A comparação com o estado em que o país se encontrava antes do Argentinazo, em 2001, ainda tem um certo peso na memória dos argentinos. A miséria tinha chegado aos 57% da população, o desemprego tinha alcançado quase os 30% e a economia entrou em coma profundo como produto das políticas neoliberais aplicadas durante os governo Menem.

Conforme a crise continuar se desenvolvendo, inevitavelmente surgirão novos setores nacionalistas que poderão evoluir conforme aumentar a ameaça da organização independente das massas.

A FIT (Frente de Esquerda)

O estancamento eleitoral da Frente de Esquerda, apesar da virada à direita promovida a partir do candidato morenista do PTS (Partido dos Trabalhadores Socialistas), que a encabeçou, representou um elemento marcante para a esquerda argentina e latino-americana. A queda da votação foi expressiva; menos de 800 mil votos em relação aos 1.379.991 obtidos em 2013.

A tentativa de captação eleitoral por meio de uma política eleitoreira, abertamente oportunista, não conseguiu avançar. A política da “frente de esquerda” é eleitoreira, tem como objetivo central a eleição de deputados (e outros parlamentares) a qualquer custo. A frente não saiu do chão a não ser dos objetivos eleitorais. O trabalho de massas, principalmente no movimento operário, não tem ido muito além de movimentações oportunistas aparelhistas. Esta política conduz inevitavelmente ao fortalecimento dos setores direitistas desta frente, que são encabeçados pelos morenistas.

Desde as primárias, as Pasos (Primárias Abertas Simultâneas e Obrigatórias), o morenista PTS, um dos três principais componentes da FIT, junto com o PO (Partido Obrero) e a IS (Izquierda Socialista) tem propagandeado a necessidade de “renovar” a FIT. O “bonitão” e jovem Nicolás del Caño, candidato do PTS nas primárias, contra o ancião Jorge Altamira (o dirigente histórico do PO), fez parte de clássicos métodos eleitorais, onde questões programáticas são deixadas de lado em prol de conseguir votos e eleger deputados a qualquer custo.

O PO acabou sendo engolido pela própria política eleitoralista que ficou mais evidente após a virada “anti-capitalista” e “syrizante” (apoiadora do Syriza grego) dos últimos anos. O morenismo está engolindo o PO, que representa, ou pelo menos representou, o principal partido da esquerda argentina. Jorge Altamira chegou a declarar que os votos que Macri obteve, contra Scioli, seriam “progressistas” e que não representariam uma “tendência à direita”. As consequências dessa política seriam a eventual evolução até o apoio, velado, ou até aberto, aos “setores progressistas” que votaram no direitista Mauricio Macri no segundo turno das eleições.

A entrada em cheio na política eleitoralista tem na base o longo refluxo neoliberal, quando os elementos direitistas levantaram a cabeça, como sempre acontece no refluxo. A direção do PO “virou” aceleradamente à direita após o esgotamento do movimento piqueteiro, fruto do Argentinazo de 2001, em meados na década passada, quando o “kirchnerismo” conseguiu conter a crise capitalista e o movimento de massas.

A política da “frente de esquerda” tem como objetivo juntar grupos e partidos de esquerda numa frente permanente, fundamentalmente em cima de questões eleitorais, para, futuramente, formar um núcleo de militantes, que deveria ser a base da atuação no período de ascensão. Um dos componentes dessa política, na frente de esquerda, busca “roubar” os militantes dos demais grupos. Essa política, de base morenista, é defensiva e oportunista, e conduz, na prática, ao fortalecimento dos elementos direitistas.

A política da “frente única” estruturada nos quatro primeiros congressos da III Internacional Comunista tem como objetivo agrupar os trabalhadores para facilitar a luta. A união entre grupos políticos revolucionários deve ser realizada em cima de um programa de luta. Acordos pontuais, com qualquer tipo de grupos, não podem ser transformados em permanentes contra o programa revolucionário e, particularmente, atrelá-los ao cretinismo parlamentar e à colaboração de classes.

No Brasil, essa política é impulsionada, em primeiro lugar, pelo PSTU. O objetivo é aderir à política de total integração ao regime burguês tupiniquim promovida pelo Psol.

Alejandro Acosta é cientista social, colaborador do Diário Liberdade e escreve para seu blog pessoal.


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