Publicidade
first
  
last
 
 
start
stop
1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 (0 Votos)

200913 ultimatePortugal - CLE - “Olha-me. Toca-me. Acaricia-me. Provoca-me. Seduz-me. Controla-me. Protege-me. Grita-me. Relaxa-me”.


Uma voz feminina e sensual vai pronunciando estas palavras num tom cada vez mais intenso enquanto a câmara mostra imagens de mulheres (ou de parte dos seus corpos) interpretando as acções que se vão enumerando, intercaladas com imagens do automóvel que o anúncio promove.

Abres uma revista. Uma mulher em fato de banho aparece deitada numa cama frente à câmara com as pernas abertas, ao lado dumas letras grandes que anunciam “Now open” (Agora aberto) junto ao nome de uma popular marca de moda americana. Sais à rua e mulheres jovens olham-te provocatoriamente desde os abrigos das paragens de autocarros, convidando-te a comprar o perfume que as faz tão irresistíveis.

Seja em casa vendo televisão, navegando na internet, lendo uma revista ou simplesmente caminhando pela tua cidade, os exemplos acima descritos são apenas uma pequena mostra do bombardeamento publicitário a que, queiramos ou não, estamos submetidas/os todos os dias. É apenas um pequeno exemplo do papel tão habitual e normalizado da mulher como reclame sexual para a venda de toda a espécie de produtos.

A ideia é simples: mostrar mulheres atractivas como objectos de desejo, vende. Atrai-se a atenção e provoca-se o desejo, com a intenção de que se transfira para o produto. Desta forma, para vender um produto destinado aos homens relaciona-se esse produto com a mulher-objecto criando uma associação do tipo “compra o carro e terás a miúda”, enquanto que para vender produtos destinados às mulheres a associação resume-se a “compra-o e serás como ela”. É algo que pode parecer tão tosco e insultuoso para a nossa inteligência mas que, sem dúvida, funciona.

É precisamente o facto de que, ao apelar fundamentalmente ao nosso subconsciente, faz que não costumemos prestar demasiada atenção nem dar importância ao efeito que a publicidade pode ter sobre nós, mas é certo que ninguém está isento disso. A publicidade é pura manipulação dirigida a modificar atitudes sociais e o seu efeito sobre a sociedade não se limita a que mais ou menos pessoas decidam comprar este ou aquele produto, mas sim que é um elemento importante para a manutenção e o reforço dos valores capitalistas e patriarcais dominantes e, como tal, não deve ser menosprezado.

Anúncios como os descritos acima, quer sejam mais subtis ou totalmente explícitos, vão criando uma definição de beleza irreal, baseada em imagens carregadas de retoques, efeitos e maquilhagem, que se impõe inevitavelmente como o denominador pelo qual todas as mulheres nos devemos medir e, para os homens, como modelo de mulher a conquistar.

Um estudo realizado em 2008 nos Estados Unidos (1) mostrava que três em cada quatro anúncios em que apareciam mulheres em revistas masculinas, estas eram retratadas como objectos sexuais, ou seja, a sua sexualidade era utilizada como publicidade para vender um produto. Nas revistas de moda para mulheres e nas revistas para raparigas adolescentes, o número era aproximadamente de dois em cada três anúncios. Desta forma, o corpo humano é equiparado a uma mercadoria, é apresentado como um prémio ao consumo e a mensagem, tanto para homens como para mulheres, é bem claro: o valor de uma mulher reside, em grande medida, na sua aparência física e na sua sexualidade. A mulher é um objecto de desejo alheio (nunca um sujeito activo com desejo próprio) e, como tal, a beleza (e portanto a elegância, a juventude e o cuidado pessoal na aparência) e a satisfação do desejo sexual masculino não são apenas um objectivo a alcançar, mas passam a ser requisitos inquestionáveis para uma mulher que queira ser válida.

O resultado, e não podia ser de outra maneira, traduz-se em termos económicos: todo o mercado da beleza feminina, que abarca desde a indústria da cosmética até à cada vez mais popular cirurgia estética, passando por todo o tipo de “adelgaçantes”, produtos alimentares “light”, centro de estética, moda, etc. Se este mercado está no auge é porque existe procura. As mulheres não estão satisfeitas com os seus corpos e os extremos a que recorrem para os modificar parecem não ter limites. Segundo outro estudo norte-americano (2) entre 2000 e 2009 nos Estados Unidos cresceram em 36% os aumentos de mama, em 84% as abdominoplastias, em 132% as correcções de ancas e em 65% as elevações de mamas. Se olharmos os números da incidência de transtornos da conduta alimentar (anorexia, bulimia e outros transtornos menores), vemos que em Espanha são estimados entre 11 e 16% das mulheres adolescentes, ou seja, pelo menos uma em cada dez.

Outra questão a analisar seria a representação das mulheres como vítimas enquanto objectos sexuais. Imagens de mulheres em situações, posições ou com expressões de vulnerabilidade, de angústia, desde o mais subtil (maquilhagens cadavéricas e olhares ausentes ou temerosos) até cenas explícitas que apresentam agressões ou situações de dominação sexual da mulher. Esta tendência foi também analisada no estudo de Stankiewicz e Rosseli, citado mais acima, concluindo que isto sucedeu em cerca de 9% dos anúncios de revistas em que apareciam mulheres. Enquanto vamos aos arames contra a violência de género, vemos, sem nos ruborizarmos, mensagens publicitárias que vinculam a sexualidade ao sofrimento e à submissão da mulher, que apresentam a dominação sexual da mulher co o algo sexy e desejável, justificando e normalizando, ao fim e ao cabo, a violência sexual.

Face a estas observações e como tristemente costuma acontecer em quase todas as questões de género, não faltará que tudo isto não pode ser considerado machismo já que na publicidade também aparecem homens coisificados e cuja sexualidade é utilizada para vender. Isto é verdade e cada vez mais e não é senão uma extensão da própria lógica publicitária capitalista: o passo lógico era estender estes novos mercados de beleza a um público maior, ou seja, aos homens, e assim se têm ido propagando mediaticamente os ideais de beleza masculinos e a importância dos cuidados pessoais nos homens. No entanto esta coisificação do homem não se dá de modo algum ao mesmo nível (nem quantitativo nem qualitativo), nem da mesma perspectiva. Em nenhum momento deixam de estar presentes os papéis de género, as representações do masculino continuam a ser as do sexo dominante e forte e os produtos, situações, posições, atitudes, etc. (em definitivo, os papéis) que se atribuem a cada género na publicidade continuam a ser manifestamente sexistas. Um último dado: 91% das operações de cirúrgia estética nos Estados Unidos são realizadas por mulheres e relativamente aos números de anorexia e de bulimia em Espanha apenas entre 5 e 10% dos/as afectados/as são homens.

Sabemos que deixamos no tinteiro muitas questões, entre elas as outras representações da mulher na publicidade que nos recordam outros deveres femininos (cuidar do lar, dos/as filhos/as, do marido…) e sabemos também que a publicidade é só uma das mil formas através das quais se reproduzem os papéis de género na nossa sociedade. Por isso, não queríamos terminar estas linhas sem assinalar a importância de torna-las todas visíveis e de combater a sua normalização e intromissão no nosso quotidiano e em todos os âmbitos das nossas vidas.

___________________________

(1) Stankiewicz, J.M. y Rosselli, F. 2008. Women as Sex Objects and Victims in Print Advertisements. Sex Roles, 58.

(2) Berberick, S.N. 2010. The Objectification of Women in Mass Media: Female Self-Image in Misogynist Culture. The New York Sociologist, Vol. 5.

Ambos os artigos (em inglés) podem ser descarregados em pdf emhttp://www.regeneracionlibertaria.org/publicidad-y-roles-de-genero

aqui: http://www.todoporhacer.org/compra-el-coche-llevate-a-la-chica-la-cosificacion-de-la-mujer-en-la-publicidad


Diário Liberdade é um projeto sem fins lucrativos, mas cuja atividade gera uns gastos fixos importantes em hosting, domínios, manutençom e programaçom. Com a tua ajuda, poderemos manter o projeto livre e fazê-lo crescer em conteúdos e funcionalidades.

Microdoaçom de 3 euro:

Doaçom de valor livre:

Última hora

Publicidade
first
  
last
 
 
start
stop

Quem somos | Info legal | Publicidade | Copyleft © 2010 Diário Liberdade.

Contacto: info [arroba] diarioliberdade.org | Telf: (+34) 717714759

Desenhado por Eledian Technology

Aviso

Bem-vind@ ao Diário Liberdade!

Para poder votar os comentários, é necessário ter registro próprio no Diário Liberdade ou logar-se.

Clique em uma das opções abaixo.