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Portugal - Revista Rubra -  


 

Entrevista publicada originalmente no nº 17 e 18 da revista Rubra, entendemos a necessidade de a recordar quando, diariamente, são penhoradas pelo fisco, em média, 189 casas e 80 famílias deixam de ter condições para pagar as despesas com a compra de casa.

Revista Rubra (RR) – Numa apresentação na Associação 25 de Abril disse que, contrariamente ao que defende o governo, a nova lei do arrendamento não serve para dinamizar o mercado, mas precisamente o contrário. Pode explicar-nos essa ideia?

Pedro Bingre (PB) – Existem pelo menos duas maneiras de liquidar o mercado de arrendamento: uma é conceder demasiado poder ao inquilino, de modo que ninguém queira tornar-se senhorio; a outra é dar demasiado poder ao senhorio, afastando do inquilinato todos excepto os cidadãos mais desfavorecidos. Em Espanha, por exemplo, foi promulgada nos anos 80 a chamada lei Boyer, tão desfavorável aos inquilinos que a maioria da classe média foi praticamente obrigada a comprar casa —  um processo que favoreceu o negócio do crédito hipotecário e coadjuvou a formação da bolha imobiliária espanhola que veio a rebentar vinte anos depois.

Diga-se de passagem que a não-aposta no sistema de arrendamento tem muito de ideológico. Embora seja tentador pensar que a concessão de crédito hipotecário a todas as classes sociais, inclusivamente as mais modestas, de modo a torná-las proprietárias da sua própria casa ou do solo, é uma ideia com certos laivos de socialismo, mas na verdade tem sido historicamente usada por partidos conservadores para fomentar o “capitalismo popular” e atrair eleitores para o voto à direita. Seja nos EUA com o Eisenhower e novamente com George W. Bush, seja em Espanha com Francisco Franco, seja em Inglaterra com a Margaret Thatcher, seja em Portugal, de uma forma mais difusa, quem iniciou o incentivo à compra de imóveis foram governos de direita. As hipotecas, mesmo quando demoram décadas a amortizar, criam nos mutuários a ilusão de se ser proprietário, de se ter enriquecido de súbito, de ter subido degraus na escala social; são uma forma de paliar, pelo menos durante os períodos de bonança, as realidades da desigualdade económica.

RR – E acha que há aí uma intenção política consciente?

PB – Sim, claramente. Não foi por acaso que Margaret Thatcher alterou as políticas de habitação social do Reino Unido, vendendo aos inquilinos, mediante hipotecas bonificadas, os alojamentos públicos que até então arrendavam. Também não foi por acaso que George W. Bush quis fazer dos EUA “um país de proprietários” graças a hipotecas subprime. Em ambos os casos conseguiram com estas iniciativas conquistar para si no curto prazo muito eleitorado tradicionalmente de Esquerda; e conseguiram também criar, no médio prazo, bolhas imobiliárias que obrigaram ao despejo de dezenas de milhar de famílias…

A propriedade da casa onde se habita tem um fortíssimo significado em países como Portugal, Espanha e Inglaterra, onde ainda subsistem aristocracias muito fortes, herdeiras de largos troços do território desde há séculos. Não são muito conspícuas, mas existem. Por exemplo, uma das famílias ducais portuguesas é proprietária de cerca de 150 mil hectares de solo nacional, ou seja, 1500 quilómetros quadrados. Trata-se de uma riqueza extraordinária, que praticamente se encontra isenta de impostos sobre imobiliário (a taxação do solo rústico é insignificante) mas não obstante recebe avultados subsídios agrícolas da União Europeia. Compreensivelmente, tais aristocratas votam conservadoramente.

Ora, a vasta maioria das famílias portuguesas praticamente não possui terras e de modo algum se identificaria com os interesses políticos daquelas aristocracias fundiárias. No entanto, muitas das pessoas que compram um apartamento de 80 m2 graças uma hipoteca a 40 anos, por algum delírio da imaginação passam a julgar-se parte das elites proprietárias, e mudam as intenções de voto. Este processo foi reforçado, no seio do chamado capitalismo popular, quando a partir de finais dos anos 1980 a classe média foi convidada a investir na Bolsa de Valores com acções compradas a crédito: muitos assalariados de posses modestas começaram a sentir-se capitalistas assim que investiram uns poucos milhares de euros do seu aforro numa minúscula “carteira de acções”…

RR – Mesmo trabalhadores?

PB – Mesmo trabalhadores… e muitas vezes com dinheiro emprestado. A novidade eleitoral surgiu quando essas pessoas começaram a pensar… “meu Deus, eu tenho um apartamento de 80 m2 (está hipotecado, mas o melhor é nem falar nisso), e tenho 2 mil euros (emprestados pelo BCP) investidos numa carteira de acções do BCP. Caramba! Eu já sou um capitalista! Uma vez que já tenho esse estatuto, já não voto à esquerda!”

Na verdade, a hipoteca, em muitos casos, nunca vai ser resolvida, porque as pessoas vão para o desemprego antes de a conseguirem pagar, ou então vai sair caríssima, porque há oscilações da taxa de juro, ou então os pequenos aforradores dessas empresas são esmagados pelos grandes accionistas… Os grandes accionistas controlam as decisões cruciais, controlam a política de dividendos, já para não falar dos grandes gestores que conseguem manipular as assembleias de accionistas de tal forma que levam bónus de milhões para si e deixam só as migalhas para os accionistas.

RR – O governo acusava as rendas congeladas pela pouca dinâmica do mercado de arrendamento. Isso é verdade?

PB  Em Portugal, ao longo do séc. XX, as rendas foram controladas quando houve grandes perturbações da política monetária ou da situação social. Por exemplo, logo a seguir ao 25 de Abril, uma das razões para o congelamento das rendas, foi porque senão os retornados ricos que vinham das colónias iam expulsar milhares de famílias de Lisboa e isso teria provocado conflitos de uma violência inaudita. Congelaram-se as rendas para manter alguma estabilidade. Também houve noutros países congelamentos de rendas sempre que as mesmas estavam ajustadas à inflação e esta se tornou galopante: foi sempre para evitar despejo massivo que os governos condicionaram o aumento das rendas.

Em tais cenários, mesmo que os aumentos súbitos das rendas pudessem convir, num primeiro instante, aos senhorios, a agitação social que isso traria poderia tornar-se perigosíssima para todos! Por isso, repito, o congelamento de rendas deu-se em muitos países da Europa, em diversas ocasiões de crise inflacionista. E, curiosamente, também nos outros países houve muita demora no descongelamento. Ainda assim, em Portugal, os imóveis arrendados que foram alvo das rendas congeladas são poucos. Estamos a falar de apenas cerca de 3% a 4% do parque habitacional do país[1].

RR – A nova lei facilita os despejos. Acha que isso vai dinamizar o mercado do arrendamento?

PB – Em Portugal o problema da falta no mercado de arrendamento não deriva dos senhorios sentirem insegurança jurídica. Se há insegurança jurídica ela está mais relacionada com dificuldades na execução dos despejos, por causa dos tribunais não funcionarem, do que propriamente com a lei. Podia-se também dizer que se concediam muitas regalias ao inquilino: este podia avisar com poucas semanas de antecedência que ia resolver o contrato, enquanto o senhorio tinha de avisar com muitos meses de antecedência, tinha de dar uma indeminização ao inquilino e tinha de provar que necessitava daquele imóvel: podemos dizer que isso era excessivo. Mas comparando-se a nossa legislação de arrendamento com a de outros países constatamos que Portugal não favorecia demasiado o inquilinato em detrimento do senhorio. Na Holanda, por exemplo, as leis de arrendamento são ultra-protectoras do inquilino: uma vez o contrato firmado, o contrato acaba somente quando o inquilino quiser; os preços das habitações mais pequenas estão tabelados pela administração pública; a actualização das rendas é feita segundo índices publicados anualmente pelo governo; as próprias autarquias gerem um parque habitacional numeroso (chegando a ultrapassar os 20% do total) para assegurar que há habitação a preços acessíveis em todos os segmentos da procura.

RR – O que pensa dos subsídios como forma de proporcionar rendas a baixo custo?

PB – O mercado imobiliário é um mercado onde a formação do preço se faz do lado da procura. Reparem, em teoria a chamada “magia dos mercados” (um suposto equilíbrio virtuoso entre oferta e procura) somente pode ocorrer nos mercados verdadeiramente concorrenciais, onde todos os actores estão perfeitamente informados e nem vendedores isolados nem compradores isolados têm o poder de impor o preço das transacções. Na prática, porém, constata-se que pouquíssimos mercados são deveras concorrenciais. O mercado de arrendamento, em especial, continua a ser na prática um oligopólio: na ausência da políticas em contrário, quem determina o preço do bem são os senhorios; o inquilinos tem se de conformar com os preços. Não há verdadeira concorrência entre senhorios. Se os senhorios tiverem muito capital próprio e puderem suportar longas temporadas sem ingressos de rendas, não se importarão de manter os imóveis desocupados até que chegue alguém que se submeta àqueles preços. Agora repare-se: quanto é que o senhorio vai pedir por cada casa? Será necessariamente o máximo que as pessoas que procurem trabalho naquela zona, possam pagar por aquela casa. As rendas são determinadas não tanto pela qualidade do imóvel, como pelos níveis salariais da localidade. Se os salários subirem naquele bairro, o senhorio pode subir o preço da renda sem que ofereça em troca qualquer melhoria no imóvel. Do mesmo modo, aumentando-se o montante disponível para as rendas por via de subsídio, aumenta-se o preço da renda. Por exemplo, se numa cidade se anunciar a criação de um subsídio mensal de 500 € a cada jovem em busca de casa para arrendar, as rendas aumentarão 500 € logo após a publicação do anúncio. Nada se resolve subsidiando a procura; apenas taxando a oferta.

Algo semelhante ocorre com o crédito bonificado. É na verdade uma ajuda aos vendedores. Em nada ajuda os compradores. O que é preciso no mercado de arrendamento não é actuar do lado da procura, mas sim do lado da oferta, aumentando a oferta de imóveis para arrendar de modo reduzir as rendas de oligopólio. E isso é possível em Portugal porque aqui temos um enorme excedente de parque habitacional.

RR – Então, como se determina os preços da renda? E o que significa na prática “actuar do lado da oferta”?

PB – Temos que perceber que o preço da renda não tem nada a ver com o custo de manutenção da casa, nem sequer com o custo de construção daquela casa: o preço da renda é determinado pelo máximo que se pode pagar. Funciona exactamente como funcionava na idade média, em que a nobreza representava 2% da população e era proprietária de mais de 2/3 das terras. A nobreza não cultivava as terras, arrendava-as aos agricultores. E qual era preço que ia cobrar aos agricultores, neste mercado de oligopólio? O máximo que pudesse cobrar, sem que eles morressem de inanição! Porque os agricultores não tinham outra escolha que não submeterem-se a esse preço! E isso porque a minoria que controlava os solos é que estipulava os preços, ao lado cobrava-se exactamente o mesmo preço… No imobiliário existe esta armadilha em que quanto maior é o rendimento das pessoas numa determinda localização, maior é o preço da renda… a renda está relacionada com os salários locais. Já o preço do imobiliário é dado pelo quociente entre a renda anual líquida e a taxa de juro praticada no mercado financeiro: quando os juros tendem para zero, o preço do imobiliário tende para infinito.

Temos o segundo maior número de casas vazias da Europa, depois de Espanha (sem contar com Malta que é um caso à parte). Temos um parque habitacional de 5,5 milhões de casas, das quais 1,5 milhões estão à venda, apenas sazonalmente ocupadas ou vazias de todo. Este excedente de parque habitacional ainda se vai agravar nos próximos anos.

Se considerarmos 2,6 pessoas por casa que é normalmente um agregado familiar, este 1,5 milhões de casas vazias daria, actualmente, para albergar quase 4 milhões de habitantes.

Parte dessas casas podem estar a sair no mercado de arrendamento, porque há um mercado de arrendamento sem contrato que floresce à margem da economia oficial. Em Coimbra, por exemplo, haverá cerca 20 mil quartos por ano a serem arrendados a estudantes, cujas rendas agregadas somarão plausivelmente uns 50 milhões de euros. A maioria dos quartos são arrendados sem contratos, facturas ou recibos. Ora, em Coimbra existem 78 mil casas, das quais 20 mil estão vazias. Se essas casas desocupadas fossem obrigadas a entrar no mercado, já dava para reduzir o custo de arrendamento para metade. Em Viena de Áustria, onde os salários médios andam pelos 1500 euros, arrenda-se uma moradia por 400 euros. Já em Coimbra, os salários médios andam pelos 900 euros e um apartamento básico arrenda-se por 600. Com este excedente de habitação?! Estão a ver o absurdo?! O que é que é preciso fazer para actuar sobre o mercado de arrendamento? Simples: actua-se do lado da oferta forçando os imóveis vazios a entrar no mercado.

Isso faz-se por via fiscal, por via da tributação. E aí temos de ter em atenção as funções extra fiscais da fiscalidade imobiliária. Isto é, normalmente, uma pessoa parte do princípio que a função da tributação é recolher dinheiro para que o Estado possa exercer as suas funções. Isto é, o Estado cobra impostos a todos, impostos universais, para financiar os serviços universais que o Estado presta. Essas são as funções propriamente fiscais da fiscalidade, valha o pleonasmo. Mas há funções extrafiscais. Ninguém duvida que há uma função de estímulo à actividade económica na tributação aduaneira. Consoante se quer proteger um determinado sector da actividade económica, aumenta-se as barreiras alfandegárias. Essa, por exemplo, é uma função claramente extra-fiscal. Também há uma função de justiça na tributação. Por exemplo, o Estado proíbe as pessoas de poluírem. Se uma empresa quer poluir, tem de pagar uma taxa, porque lhe está a ser concedido um privilégio. Uma taxa é uma compensação por um privilégio – neste sentido o imposto sobre o imobiliário não devia ser um imposto, devia ser uma taxa.[2]

Da mesma forma, no imobiliário residencial a fiscalidade tem de cumprir uma função extrafiscal que é a de servir de desincentivo à manutenção de casas vazias.

RR – E faz exactamente o contrário que é favorecer a acumulação de casas vazias.

PB – Exactamente: faz o contrário! Aliás: cá chegámos ao absurdo dos fundos de investimento imobiliário estarem isentos de IMI, o que numa fase de bolha imobiliária, em que os preços estão a subir, é um convite claro à especulação. Nós tínhamos um IMI que não só era baixo por si mesmo, como ainda por cima era majorado ou minorado por coeficientes…, como por exemplo o coeficiente de vetustez em que quanto mais degradado um imóvel estivesse, menos pagava e então as pessoas deixavam o imóvel degradar-se ostensivamente para pagar menos IMI. Lembremos que do valor do imóvel aquilo que menos interessa é a parte construída. O que tem mais valor é o solo e esse não se degrada.

Se quisermos resolver o mercado de arrendamento, não podemos dar mais poder aos senhorios: o que temos é de aumentar o IMI e de acabar com as isenções, como por exemplo a do coeficiente de vetustez. Só assim obrigamos o parque habitacional que está vazio a dar entrada no mercado e os preços caiem. Se nós mantivermos as prerrogativas que os proprietários têm, os preços não descem e há toda uma geração que não acede a casa, não consegue ter filhos, não consegue ter nada. O mercado imobiliário e os recibos verdes estão a castrar toda uma geração. É curioso ver como a natalidade começou a descer a pique desde 1993, quando os recibos verdes foram regulamentados.

RR – A ideia é excelente, mas o que aconteceria se hovesse um aumento de IMI para os senhorios? Há uma boa quantidade de famílias que vivem à custa desses arrendamentos.

PB – Ah! Sim, sim! Há famílias em Coimbra, por exemplo, que têm mais de uma centena apartamentos arrendados. A sua única actividade económica é o arrendamento, e num sistema político que reconheça o direito à propriedade privada tal ocupação é válida e necessária. No entanto, o que está em causa são as componentes imerecidas dos rendimentos exorbitantes que auferem. Não é aceitável que a riqueza de uns resulte da manutenção de um imenso parque habitacional subaproveitado, que a todos onera.

A minha proposta para corrigir estas disfunções é aumentar o imposto sobre o património imobiliário, reduzindo-se simultaneamente os impostos sobre o consumo e sobre o rendimento. Porquê? Porque se nós aumentarmos os impostos sobre o consumo, deprime-se o consumo, se aumentarmos o imposto sobre os rendimentos, deprimimos a iniciativa. Se aumentarmos o imposto sobre os Imóveis? O que é que acontece? Não acontece nada: a carga fiscal é passada para os senhorios, os imóveis devolutos dão entrada no mercado de venda ou de arrendamento, e os custos do imobiliário baixam. Há este paradoxo! Mas então o problema está (e agora voltamos àquele problema sociológico) em que a maior parte das pessoas julgam que têm uma casa, mesmo hipotecada: e por isso já nem querem ouvir falar de imposto sobre o património. Julgam que é uma desvalorização.

RR – Mas é uma desvalorização! Na prática é uma desvalorização do património.

PB – Sim é. De certa forma, é uma expropriação virtual se o imposto for excessivo. De facto têm sido propostas duas soluções para o problema das rendas excessivas: ou existe expropriação pelo Estado, a nacionalização das terras e do imobiliário e aí então deixa de haver propriedade privada da terra — a solução marxista; ou então não se expropria a terra, mas o Estado por via de impostos vai buscar as rendas, porque as rendas são, por definição, um rendimento parasitário — a solução proposta por David Ricardo e Henry George. É que, repare-se, quando se paga uma renda pelo apartamento onde se vive, só uma parte relativamente pequena dessa renda é que é para a manutenção do imóvel, tudo o resto está-se pagar a pura localização e, para essa localização existir, o senhorio não fazia falta. Essa localização é valiosa pelo comércio que há na rua, pelas pessoas que aí trabalham, não é pelo senhorio. Este faz parte daquilo que os antigos fisiocratas chamavam, sem intuito de ofender, as classes estéreis. O factor terra é o factor parasitário e só há duas vias para resolver esse parasistismo: pela taxação do imobiliário ou pela expropriação. O problema é que a partir do momento em que as classes médias e baixas acedem ao imobiliário por hipoteca, deixam de ser a favor da nacionalização ou da taxação e quem se regozija com isso são os grandes proprietários.

Em Portugal já no tempo da 1.ª República e no tempo do Estado Novo se quis obrigar o território agrícola a pagar impostos, entre outros motivos, justamente por este: para fazer com que as terras incultas passassem a ser cultivadas. É interessante ler as cartas das sucessivos ministros da agricultura da 1.ª Republica e do Estado novo que eram frequentemente grandes latifundiários do Alentejo, a dizerem que não se podia aumentar a taxação do património imobiliário porque nesse caso os coitadinhos dos minifundiários do centro e norte de Portugal não conseguiriam sobreviver.

RR – Sobre a lei do arrendamento há uma última questão, quando o governo apresentou a nova lei, foi imediatamente alvo de crítica pela apresentação daquela figura clássica do idoso que sempre morou naquela casa, que não tem rendimento para pagar e que seria alvo cedo ou tarde de uma acção de despejo. Falou-se da possibilidade de subsídio. Não será essa uma forma de financiar esses proprietários por via orçamento público?

PB – Exactamente! E é absurdo porque o Estado congelou as rendas para evitar despejos… Lembremos que nos anos 70 havia uma enorme carência de habitação em Portugal e que agora há um enorme excedente. Não se pode despejar essas pessoas sem primeiro assegurar que o excedente de habitação é posto no mercado a preços razoáveis. Caso contrário, vamos estar a financiar mais especulação.

Outra questão é a agilização dos despejos na nova lei. Se nós considerarmos que a maior parte da população com menos de 40 anos trabalha a recibos verdes, que os atrasos no pagamento de salários nessa situação são frequentíssimos e que se caminha para uma precarização cada vez maior, já começamos a ver no que é que isto pode dar. Não nos esqueçamos que em muitas vilas o principal empregador privado, normalmente um industrial, é também o maior senhorio da localidade. Com um sistema assim, com esta lei laboral e esta lei do arrendamento, o que é que pode vir a acontecer? Um indivíduo assim pode, por hipótese, pagar em atraso aos seus funcionários (a recibos verdes) e, se os seus funcionários forem arrendatários numa das suas casas, pode, ao fim de pouco tempo, pô-los na rua. Imagina-se a vida de precaridade e de sofrimento psicológico a que se condenam as pessoas com uma lei das rendas que protege os senhorios e uma lei laboral que favorece a precarização. Não é inocente isto de eu dizer que quem tem muitos imóveis, também tem muitos funcionários: normalmente, essas famílias que têm centenas de casas para alugar, têm também muitos empregados. E então, querem uma flexibilização cada vez maior nos contratos de trabalho, mas como senhorios têm todos os direitos na altura de exigirem as rendas? Pois bem: há aqui, claramente, dois pesos e duas medidas.

RR – Defende que em Portugal houve uma bolha imobiliária e as casas foram excessivamente valorizadas. Pagámos mais pelas casas do que aquilo que elas valem?

PB – Sim, Portugal tem uma enorme dívida imobiliária que deve andar à volta dos 170 mil milhões de euros. Essa dívida imobiliária foi financiada essencialmente com capital estrangeiro. A banca centro-europeia emprestou o dinheiro que se investiu no imobiliário português e aceitou os prédios como garantia, mas com cláusulas de salvaguarda a estipular que, caso o imobiliário desvalorizasse, os bancos portugueses teriam de cobrir essa desvalorização. Foi precisamente isso que aconteceu: a partir de 2007 iniciou-se a contracção dos preços imobiliários. Uma casa que valesse 150.000€ em 2005, hoje vale 100.000 €, na melhor das hipóteses. Quem comprou casa nessas condições, ainda só amortizou os juros e ainda deve a totalidade desses 150.000€, mas a casa já só vale 100.000€. Ora, se a casa era a garantia do empréstimo, se ela já só vale 100.000€ e a dívida ao banco continua a ser 150.000€, tal significa que na eventualidade de os proprietários da hipoteca ficarem desempregados, o banco não irá conseguir reaver o dinheiro, vendendo a casa — e, por consequência, não conseguirá honrar a sua própria dívida junto da banca estrangeira, pois faltam-lhe 50 000 € em “imparidades”. A nível agregado, isto causa um problema que poucos querem reconhecer: o país inteiro está em situação de negative equity; a dívida hipotecária agregada tornou-se seguramente maior que o valor das suas cauções agregadas. Isso é estar em negative equity: a garantia do empréstimo é insuficiente. Ora, para evitar que as cláusulas de salvaguarda sejam invocadas, o sector financeiro português prefere obnubilar a existência da bolha imobiliária e fazer tudo para manter estes preços e dissimular as imparidades nas suas carteiras de activos imobiliários e hipotecários.

Porém, quando o vastíssimo número de casas vazias começarem a ser arrendadas, a descida do valor das rendas vai tornar impossível ocultar a realidade da bolha imobiliária.

RR – Ficamos com a ideia que é uma espécie de faz-de-conta: a Banca internacional tem mais do que condições de saber qual o real valor dessas propriedades, quanto mais não seja porque assiste à devolução das casas e à Banca nacional a dizer precisamente “que as casas não valem aquilo que era suposto valerem.”

PB – Sim, mas enquanto o Estado português estiver disposto a injectar dinheiro na Banca para a salvar, ela não tem de ser alvo de uma intervenção directa do Estado, os directores dos bancos continuam com a pele a salvo, e o negócio continua, como habitualmente. A Banca portuguesa só vai reconhecer que o imobiliário desvalorizou quando o Estado deixar de injectar lá dinheiro para compensar essas imparidades.

RR – Para se perceber por que é que pagámos excessivamente pelas casas em que vivemos, é essencial que se perceba que a especulação sobre os preços do imobiliário depende do valor do solo e não das construções. Pode explicar melhor esta matéria?

PB – Precisamos de distinguir entre o mercado imobiliário, que não é concorrencial, e o mercado da construção, que o é. A construção num sentido estrito, ou seja, isolada dos preços do solo, opera em mercado concorrencial: se nós tivermos um terreno e quiseremos construir, podemos escolher entre os muitos construtores que oferecem os seus préstimos, concorrendo entre si pela melhor relação de qualidade/preço. Quando aumenta a procura de construção, aumenta o número de construtores.

Já o valor do solo não resulta de um mercado concorrencial. A oferta é inelástica: por mais que aumente a procura, a quantidade de solo disponível mantém-se constante — o solo não se produz. O solo não tem, portanto, custos de produção, apenas um preço de venda. Este preço tente para igualar o valor obtido pelo coeficiente entre a renda anual do terreno em apreço, e a taxa de juro que está a ser cobrada a cada instante. Ou seja, o valor do solo é igual à renda anual a dividir pela taxa de juro. Daqui se segue, logicamente, que quando a taxa de juro tende para zero, o valor do solo tende para o infinito.

A título de exemplo, imaginemos um solo agrícola que é arrendado a 500€ ao ano, o que é plausível para um hectare de bom solo agrícola. Se a taxa de juro estiver a 5%, ou seja, 0.05, o valor do solo é dez mil euros; se a taxa baixar para 2,5%, valor do solo sobre para vinte mil euros; e, se a taxa de juro estiver 0,5%, o valor do solo alcança os cem mil euros.

Se o solo se mantiver sempre agrícola, ou sempre urbano, o valor do solo aumenta simplesmente quando descem as taxas de juro. Quanto mais baixa estiver a taxa de juro, maior será o valor do solo. Por isso é que o momento bom para comprar imobiliário é quando as taxas de juro estão em alta e não quando estão em baixo, embora as pessoas tenham tendência a achar precisamente o contrário.

O valor do solo também pode variar em função de uma alteração na renda anual. Se for solo agrícola, pode-se melhorar a adubação do solo, a sua acidez, podem ser instalados sistemas de rega e tudo mais; nesse caso, a renda anual pode aumentar, mas sempre ligeiramente, pois continua a ser uma renda agrícola. Mas se a renda deixar de ser agrícola e passar a ser urbana habitacional, torna-se muito mais rentável. Basta imaginar que conseguimos instalar 20 famílias num hectare, em 20 moradias. Supondo, para fins teóricos, que o custo da construção das moradias é zero, torna-se bastante visível o aumento do valor do solo pela mera passagem de solo agrícola para solo urbanizável. É possível multiplicar dezenas de vezes o valor da renda anual, apenas pela alteração do uso do solo.

RR – Qual é o processo de alteração?

PB – Aqui chegamos ao ponto central da especulação sobre o solo. Um solo muda de renda agrícola para urbanizável através da concessão de um alvará de loteamento. Na prática, é o alvará de loteamento que permite colher benefícios sobre uma alteração permitida ao uso do solo… E tal como o senhorio é supérfluo para a formação do valor fundiário da casa que arrenda (na medida em que a maioria desse valor depende da localização e não da construção), também o proprietário é perfeitamente irrelevante para formação do valor do solo por via do alvará. Se um solo está à beira de uma cidade que se está a expandir, se o valor do solo está a aumentar, é porque há pessoas que estão a precisar de o habitar em vez de cultivar, é porque a economia da cidade, no seu todo, está a aumentar os rendimentos das pessoas, nesse local. Não é mérito do proprietário, é um acaso! Este factor exógeno ao proprietário, que faz com que numa determinada cidade o valor dos solos possa aumentar, é resultado do investimento do colectivo.

RR – No Documento Técnico de Preparação para a Lei dos Solos de 2011, diz que “todo o incremento do valor do solo causado pela actuação administração pública revertiria a favor dos particulares”. Pode nos exemplificar quais os mecanismos através dos quais isso acontece?

PB – Essa é formulação passou a vigorar a partir de alterações legislativas promulgadas em 1965, as quais se pretendem corrigir com a nova Lei de Solos.

Quando decorre uma bolha imobiliária, normalmente começa a haver pressão para converter terrenos agrícolas na periferia da cidade em terrenos urbanizáveis. Esta pressão também pode ser causada, ou exacerbada, pela especulação sobre os imóveis que estão no centro da cidade – que passa pela manutenção de casas vazias nos centros das cidades. No caso português muitos desses imóveis foram detidos por Fundos Imobiliários, que não pagavam IMI e por isso se poderiam dar ao luxo de manter as casas desocupadas para fins especulativos, estando livres de tributação.

Essa escassez artificial de casas nos centros aumenta a procura na periferia. Quando isso acontece, os terrenos da periferia valorizam, mas a captura dessa valorização do terreno só tem lugar quando há um alvará de loteamento. Isto é, quando há uma licença da parte da administração pública para urbanizar esses terrenos e é este acto, este acto da administração pública de alterar a designação dos terrenos, o que valoriza efectivamente os terrenos: não são as benfeitorias, ou seja, construção propriamente dita. As benfeitorias podem valorizar um terreno, mas essas diferenças de valor decorrentes de investimento são irrelevantes para a especulação de que estamos a falar.

Um loteador compra um terreno a um agricultor por 5.000€, obtém um alvará de loteamento, vende o terreno por 5.000.000€ao construtor civil, este gasta um milhão de euros a construir e vende as casas por 6.500.000€, retendo uma margem de lucro de 500.000€. Ou seja, não é a figura do construtor propriamente dito quem beneficia da renda diferencial, ou daquilo a que a literatura portuguesa do Estado Novo chamava as fortunas trazidas pelo vento… as fortunas trazidas pelo vento são usufruídas pelo loteador! O que pode acontecer é o proprietário do terreno tornar-se loteador e construtor, mas é no papel de loteador que está o ganho.

RR – Mas até ao momento em que o loteador recebe esse alvará, essa fortuna trazida pelo vento manifesta-se apenas e só enquanto garantia. Quando é que o loteador ganha tal fortuna e quem é que fica prejudicado com isso?

PB – Esse alvará de loteamento irá permitir ao loteador maximizar o valor do terreno e isso irá reflectir-se no preço final das casas. Imaginem um terreno em que um hectare vale cerca de 2000€; o alvará concedia-vos autorização para contruir 3 blocos de apartamentos; eram construídos 4 apartamentos por piso e 12 pisos por bloco. O custo de construção saía à volta de 600 € por m2. Imaginem que o preço de revenda seria 1400 € por m2, e que cada apartamento tinha 80 m2, então, a mais-valia urbanística (MVU) por m2 , concedida pelo alvará, seria 800 €.

Vocês vejam que, nesses 600€, já está incluído o lucro do construtor! Então, quanto é que ganhou o loteador? Pelos 80m2 por apartamento, ele ganhou 64.000€; se há 4 apartamentos por piso, ganhou 254.000€, e multiplicando isto por 12 pisos, dá 3.048.000€. Não se esqueçam que tinham sido construídos 3 blocos! Estamos a falar de um encaixe em MUV de 9.150.000€! E esta é a mais-valia urbanística que foi concedida pelo alvará… (Tendo em mente estes valores, recordemo-nos que triunfar numas eleições autárquicas de uma cidade de média dimensão implica gastar uns meros 300.000 € em propaganda eleitoral e acções de campanha…)

RR – Mas quem é que ganhou dinheiro com isto? Quem são esses loteadores?

PB – Sobre a identidade dos loteadores encontra-se em muitos casos um véu opaco: inúmeros pedidos são feitos em nome de sociedades-veículo, empresas constituídas “na hora”, entidades sediadas em refúdios fiscais… Isto quando aos pedidos de alvará. As alterações dos usos permitidos no solo, que permitem a emissão de alvarás e são definidas Plano Director Municipal, baseiam-se em cartografias de ordenamento do território que, facto curioso, omitem por completo a malha cadastral e a identidade dos proprietários beneficiários dos direitos implicitamente criados por esses instrumentos de gestão territorial. É curioso e é triste que assim seja. Por comparação, na Alemanha não é aprovado nenhum loteamento sem que venha discriminado exactamente qual vai ser a valorização do solo, quanto dinheiro é que está a ser ganho e quanto dinheiro é que vai ficar na administração pública. Cá, os PDM e os alvarás de loteamento são completamente omissos em relação àquilo que estão a produzir no mercado imobiliário. Mas há casos que foram tornados públicos, por exemplo, o caso do Avelino Ferreira Torres que, segundo a comunicação social, aledagadamente comprou e loteou 14 quintas.

RR – E, em Portugal, quem detém o grande capital viu essa gente a ter lucros astronómicos e não entrou na “festa”?

PB – Esses também começaram a fazer o mesmo… recordo, por exemplo, o famoso caso Portucale, em que o grupo Espírito Santo comprou terrenos florestais do Estado (mais propriamente da Companhia das Lezíreias) em Benavente a cerca 4000€ por hectare, e depois obtiveram para essa mesma localização um alvará de loteamento… de modo a encaixar mais-valias urbanísticas. Esta operação foi muito discutida na imprensa e deu azo a uma série de processos judiciais.

Em Portugal foram urbanizados, no sentido físico do termo, mais de 100.000 hectares entre 1985 e 2005, de acordo com a análise de fotografias aéreas. Se partirmos do princípio que devido à especulação foram feitos mais loteamentos (mera operação jurídico-administrativa, anterior à urbanização propriamente dita) do que urbanizações, podemos assumir que terá havido pelo menos 100.000 hectares loteados. Se cada loteamento tiver uma média de dez hectares, então estamos a falar de cerca de 10.000 loteadores. Se o ganho por cada hectare loteado tiver sido 2 milhões, então estamos a falar de 200 mil milhões de mais-valias urbanísticas que foram repartidas por 0,1% da população portuguesa.

RR – Quem paga isso são as pessoas ao adquirirem as casas?

PB – As pessoas que adquiriram as casas, mas também as pessoas que não as adquiriram mas foram obrigadas a pagar por via tributária o resgate da banca afectada pelas imparidades que tudo isto causou.

RR – Se as casas valem muito menos do que o valor que as pessoas pagaram por elas, como é que se dá uma notícia dessas? O que é que isso implica?

PB – A desvalorização é completamente inevitável, a não ser nas zonas mais centrais… e quanto a isso, nada a fazer.

O que eu acho é se devia muito rapidamente rever o IMI; não permitir as isenções dos Fundos Imobiliários; fazer com que se baixasse o IRS e o IVA e aumentar o IMI, imediatamente. Isso ia forçar à venda das casas vazias e ao seu arrendamento: ia forçar o ajuste dos preços do imobiliário. Por outro lado, era preciso fazer com que a Banca reconhecesse, de uma forma absolutamente inequívoca, as perdas na carteira de activos imobiliários. Enquanto não se reconhecer isso, continua-se a propagar a mentira que a responsabilidade da crise é haver imparidades causadas pelo investimento na educação pública e na investigação, na saúde pública, etc., etc… Mas a dívida não vem daí! Vem das aventuras imobiliárias de uns quantos! Mas apesar destas evidências não só se conseguiu ocultar a bolha imobiliária, como se conseguiu pôr o Estado a pagar a factura da bolha imobiliária e, agora, ainda por cima, como bónus para os grandes grupos económicos privados, está-se a desmantelar o Estado Social!

RR – E o Estado, ganhou alguma coisa com essa mais-valia decorrente do alvará que torna o terreno urbanizável?

PB – Tenho motivos para crer que o Estado português não ganhou muito com a bolha imobiliária. O IMI foi revisto demasiado tarde e havia uma evasão fiscal termenda do capital imobiliário, portanto, pela via da tributação do capital imobiliário, o Estado não ganhou com a bolha imobiliária. Pode ter ganho alguma coisa na forma de IRC sobre a construção e IRS sobre os trabalhadores da construção civil, mas o a Administração Pública nada ganhou com os alvarás de loteamento e com as respectivas taxas de urbanização: estas últimas não cobriam nem 30% dos encargos que as Câmaras tiveram de fazer com o saneamento e as acessibilidades dos novos loteamentos!

RR – Podemos afirmar com alguma certeza que uma parcela significativa da dívida pública que andamos a pagar hoje, poderia ter sido evitada se o Estado tivesse sido capaz de apropriar-se de parte dessas mais-valias urbanas?

PB – Ah, sim, sem a mais pequena dúvida! Basta que se diga que, nos últimos 20 anos, o Estado ofereceu aos particulares 200 mil milhões em mais-valias urbanísticas… e isso são duas vezes e meia o resgate da troika!

Se nós seguíssemos a doutrina jurídica do centro da Europa, esse dinheiro teria revertido praticamente na sua maior parte para o Estado! E, neste momento, não só não tínhamos resgate, como se calhar até tínhamos superavit… Foi por esse meio que Espanha teve pela primeira vez um superavit orçamental, boa parte graças aos impostos sobre a construção e sobre o imobiliário; infelizmente, no caso espanhol não houve contudo políticas que além de reter MVU também refreassem a bolha imobiliária que se estava a formar. Em Portugal o Estado nem reteve as MVU, nem conteve a bolha imobiliária.

RR – Quando diz que é urgente que a Banca reconheça os valores reais dos imóveis, isso na prática não significa também preparar para um calote generalizado…

PB – O problema é saber quem é que vai fazer o calote, se é a banca privada, e neste caso quem paga são os seus accionistas, ou se é o Estado e nesse caso pagamos todos! Neste momento, a escolha é entre a Banca ou o Estado… os dois não conseguem sobreviver com as receitas tributárias que há!

RR – Se isso acontecesse, a Banca tinha alguma hipótese de sobreviver?

PB – Claro que sim, então, a Banca está a apropriar-se dos monopólios da energia, dos transportes, das telecomunicações, das águas, da saúde. O capitalismo tende para o rentismo. Se o degrau mais baixo da escada para subir ao céu da fortuna é supostamente ser-se trabalhador e viver do salário, subindo um degrau mais é tornar-se empreendedor e viver do lucro; se os lucros forem grandes, sobe-se outro degrau tornando-se capitalista que vive de juros sobre o capital; mas quando o capital se torna imenso, o degrau seguinte é adquirir monopólios sobre a terra, sobre a energia, a àgua, as comunicações e transportes, e passar a viver-se de rendas. O capitalista sonha tornar-se um rentista, porque os investimentos do capital implicam sempre algum risco. Mas o rentista vive à margem do risco; se monopolizar as águas de Portugal, enquanto as pessoas precisarem de beber água, os negócios estão garantidos; enquanto as pessoas precisarem de energia electrica, o negócio está garantido; enquanto as pessoas precisarem de circular, de transportes e de estradas, o negócio está garantido. A sociedade feudal, tão socialmente desigual, tão inimiga do progresso, tão defendida por tiranias, era baseada no rentismo económico e no nepotismo político. É para uma organização social dessas que estamos a regredir.


[1] Números do plano estratégico de habitação de 2008.

[2] Henry George e Mason Gaffney.

 


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